Trailer do Apocalipse
O século agoniza. O rapaz na cama agoniza. Para muitos, aqueles poderiam ser os últimos anos do planeta igualmente agonizante - um paciente em estado terminal.
Melancolia. Dor. Desesperança. Aquelas vidas estão impregnadas de um vírus estúpido, de descrença e de desorientação. O angelical aparece em um momento como contraponto necessário àquela dor. O onírico se mistura com o real, a dor com a possibilidade da salvação. O anjo primeiro de asas brancas e depois, furioso, com as asas negras, parte em busca do profeta - até os anjos, conclui-se, precisam ser salvos.
Nenhum daqueles passa incólume ao grande julgamento final - afinal, estamos nos últimos dias do homem na Terra, e o momento é de julgar, de penar. O momento é de sacrifícios, é a hora de se olhar no espelho e assistir ao autodesmoronamento. Olhar no espelho e se ver negando a si mesmo. Olhar no espelho, tomar uma pílula mágica e partir rumo a uma alucinação. O momento é de alucinações, de diálogos surreias dentro de sonhos, é hora de visitar o seu sonho, é hora de te receber nos meus sonhos, servir um chá e falar sobre o fim de tudo - ou o reinício tímido de algo novo.
Nenhum deles é santo. Nem o anjo, nem a mãe, nem a esposa, nem o mórmon enrustido, nem o advogado, nem o enfermeiro, nem o que definha, nem o que abandonou o que definha, nem o anjo do Central Park. Ninguém, ninguém escapa ao Julgamento Final, ao trailer do Apocalipse. Nem eu, nem você.
Não escapamos mesmo. Nem se fecharmos os olhos e ignorarmos o espetáculo que dura seis horas e termina deixando pedaços de penas negras e brancas espalhadas por onde quer que se olhe ao redor da vida.
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