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terça-feira, 29 de março de 2005

Quatrocentos e cinqüenta e poucos

- Hoje ela faz anos.
- Como assim, vovó? Cidade faz aniversário?
- Faz sim.
- Ah, então cidade fica velha e depois morre?
- Nada disso. Cidade é diferente de gente. Quanto mais velha mais famosa e mais vistosa.
- Como assim, ' vistosa ' ?
- Vistosa é isso. - e abriu a janela do pequeno apartamento no Largo Dois de Julho, dando de presente ao menino a vista mais linda da Baía de Todos os Santos - Essa vista é a mesma desde que nem contavam os aniversários da nossa cidade. Só mudou uma coisinha aqui, outra ali. Pelo menos de longe.
- Uau, vovó. Quer dizer então que o mundo é velho pra caramba, né?
- É, filhote, é. E Salvador, apesar dos quatrocentos e cinqüenta e poucos anos contados de vida, já existe há muito mais tempo do que a gente imagina. Um dia um Tomé chegou, se achou dono, pôs umas cruzes ali e aqui para marcar lugar e ai foi gente chegando, chegando. Deu nisso aí.
E o menino ficou olhando a vista, o sol deslumbrante, o Forte de São Marcelo ao longe, os barquinhos. Era terça-feira, 29 de março de 2005. Eu poderia ser esse menino, se enamorando pela terra que lhe deu chão, luz do sol, mar salgado, vento de sobra. Mas não sou. Descobri Salvador quando eu já era velho, passava dos 16 anos. Morava aqui, sempre morei, mas nunca me dera conta disso. Naquele tempo, no meu coração, Salvador era uma cidade qualquer. Vim aprender o seu valor quando comecei a viajar e ver o mundo e sentir a inveja das pessoas quando eu dizia, ainda tímido, 'Sou de Salvador'. Com o tempo a timidez deu lugar a um orgulho que beira o bairrismo. Digo que beira o barrismo porque me considero um cidadão do mundo, já fui a muitos lugares, graças a Deus, já morei em cidades adoráveis, mas meu lugar é aqui, não há como fugir dessa verdade. É aqui que meu coração bate mais forte entre tantos fortes, é aqui que me sinto em casa, é nesse cheiro que me encontro.
Salvador me acolheu desde pequeno, quando minha mãe me deu à luz no Hospital Espanhol, de frente para o mar azul e transparente da Barra em uma noite de quinta-feira, 20 de junho de 1974. Já saí do Hospital pela Av. Oceânica e rumei para a Cidade Baixa. Voltaria, anos depois, à Cidade Alta, já adolescente, para completar meu segundo grau - como se chamava na época. Minha educação foi rica, pois tinha um acesso profundo a duas partes da Cidade da Bahia: a Baixa, com cheiro de interior, de gente simples, de pés no chão, de empinar arraia, de mar lindo e poluído - aliás nunca entendia como aquela água tão linda e cristalina podia ser suja -, e a Alta, de classe média, de colégio caro, de gente boa, de gente esnobe, de baianos nobres, de ruas limpas - mas nem tanto - e de prédios luxuosos. Aprendi a falar duas línguas, a viver em duas cidades, a dizer 'Vou subir' me referindo à ida à Cidade Alta e 'Vou descer' para indicar o movimento contrário.
Cresci no ônibus que sobe a Ladeira da Montanha vendo as velhas putas ficarem mais velhas ainda e morrerem. Cresci vendo o acarajé ferver no dendê, cresci ouvindo uma fala mansa, que inevitavelmente aprendi e hoje não desgruda mais de mim, nem quero que nunca desgrude. Cresci indo tomar sorvete na Ribeira, passeando na Avenida Sete, vendo filme no Cine Roma, no Cine Art, no Glauber Rocha e no Tamoio. Vi a inauguração do Shopping Barra e lembro que no cinema passava 'O Nome da Rosa'.

Cresci e um dia conheci o Carnaval, muito tarde, admito e me arrependo. Cresci na multidão da Avenida Sete sempre lotada aos sábados, cresci vendo as baianas passarem quase na minha porta a caminho da lavagem das escadarias do Bomfim, cresci vendendo, na porta de casa, geladinho no dia da festa do Padroeiro da Bahia, cresci na fila do ferry, sacolejei nos buracos que se espalham pela cidade depois de qualquer chuvinha boba, vi muito lixo pelas ruas, vi o Pelourinho renascer com cores lindas, me tornei um adulto assistindo políticos safados - de cabeças já completamente brancas na época - falando em um baianês hipócrita que amam a cidade.

Vi de tudo por aqui, e essa minha sede de respirar esse ar, esse olhar meu que muitas vezes vê no óbvio uma poesia, que se encanta com o que acham feio, que acha uma inexplicável beleza no caos, que pula dois metros atrás de um trio, essa sede, meus amigos, se explica: esse sou eu tentando recuperar os anos perdidos, esse sou eu me recriando a cada dia dentro desse mundo de cores variadas, esse sou eu, baiano, soteropolitano, apaixonado, no presente, no passado e no futuro erguendo a mão para o alto e cantando o parabéns para minha cidade linda.