<body><script type="text/javascript"> function setAttributeOnload(object, attribute, val) { if(window.addEventListener) { window.addEventListener('load', function(){ object[attribute] = val; }, false); } else { window.attachEvent('onload', function(){ object[attribute] = val; }); } } </script> <div id="navbar-iframe-container"></div> <script type="text/javascript" src="https://apis.google.com/js/platform.js"></script> <script type="text/javascript"> gapi.load("gapi.iframes:gapi.iframes.style.bubble", function() { if (gapi.iframes && gapi.iframes.getContext) { gapi.iframes.getContext().openChild({ url: 'https://www.blogger.com/navbar.g?targetBlogID\x3d8639429\x26blogName\x3dDi%C3%A1rio+Evolutivo\x26publishMode\x3dPUBLISH_MODE_BLOGSPOT\x26navbarType\x3dTAN\x26layoutType\x3dCLASSIC\x26searchRoot\x3dhttps://evoluirefluir.blogspot.com/search\x26blogLocale\x3dpt_BR\x26v\x3d2\x26homepageUrl\x3dhttp://evoluirefluir.blogspot.com/\x26vt\x3d-7690663095198134269', where: document.getElementById("navbar-iframe-container"), id: "navbar-iframe" }); } }); </script>







segunda-feira, 28 de março de 2005

Pegando o bonde (da vida)

Já passavam das dez da noite. Eu estava cansado, faminto, com muito frio, carregando, nas costas, uma mochila de mais de um metro de altura, pesada - muito pesada - e nas mãos um leve papel com um nome de mais de 15 letras. Chovia.

O lugar era a Suiça, mais especificamente Zurique. Idos de 1994. Pela primeira vez eu chegava àquela cidade, e ali, nas minhas mãos, com 15 letras, um único nome identificava a rua onde o bonde que eu pegaria dali a minutos - assim eu esperava - deveria parar. Cheguei ao ponto de ônibus e rapidamente identifiquei, pelo número, o bonde que me levaria ao albergue mais próximo.

Eu tinha dezenove anos na época, já estava na Europa há dois meses, na companhia de amigos nativos de lá. Até aquele dia havia feito muita coisa, mas sempre com o back up deles - o que eu tinha vivido, até ali, era apenas um ensaio do que me esperava.

Zurique era o ponto de partida para a minha aventura que ainda teria mais 3 meses pela frente. E, logo de cara, a impressão que eu tinha era de que tudo tinha dado errado. Cheguei na cidade à noite: erro primário. Perdi o trem na baldeação: circunstancial, acontece. Descobri que eu não falava alemão: meus dois semestres de ICBA me deram a pretensão de achar que saberia entender alguma coisa da língua de Goethe. Ledo e nagle engano (adorei, Johnny). Juntando vários errinhos: o desespero.

Respirei fundo. Não tinha como dar errado. "O máximo que pode acontecer, Leandro, é você voltar para Bruxelas e pegar o próximo vôo para o Brasil". (Para me acalmar eu sempre pensava no pior que poderia acontecer. E isso me tranqüilizava. Pelo menos um pouco.). Entrei no bonde com a mesma dificuldade que aquelas senhoras têm de entrar no ônibus que passa na Feira de São Joaquim com um balaio na cabeça. Dentro, avistei mais cinco pessoas. "Pelo menos não está cheio". Mostrei o papel ao motorista que me disse algo indecifrável. Desesperador. Resolvi sentar ali - se é que isso é possível com uma mochila daquele tamanho nas costas - e me revirar tentando, eu mesmo, identificar o nome das ruas pelas quais o bonde passava, se é que isso é possível em um país de língua alemã os nomes de ruas são mais ou menos assim: Nieulongstadsfreiburgstrasse. Se o bonde estava em movimento, as janelas embaçadas, é óbvio que assim que eu via o nome da rua adiante eu não tinha tempo nem de conferir se a primeira letra coincidia. Arrepios já me tomavam o corpo.

E é nesse momento que aparece a razão desse post.

Olho para o fundo do bonde e vejo uma velhinha, bem velhinha mesmo, se aproximando de mim.

- Are you trying to get to the youth hostel ? - meus ouvidos não acreditaram, além de falar inglês ela ainda sabia exatamente aonde eu queria ir.
- That's it. Can you help me?
- Sure, dear - o olhar era o de Jessica Tandy - I'll show you the place.
- That would be perfect. Thanks a lot. - o alívio era tão grande que eu nem sentia mais o peso da mochila.

Ela trocou com o motorista algumas palavras e desceu comigo.

- Aquela é a rua, querido.
- Muito obrigado.
- Não, levo você lá.

Meu anjo não se contentou apenas em mostrar a rua. A minha Jessica Tandy fez mais: abriu o guarda-chuva e me chamou para baixo dele, me acolheu com seus braços - que me abraçaram em uma região um pouco acima da cintura - e andamos juntos uns duzentos metros, eu com lágrimas nos olhos, sem acreditar. Ela não dizia nada - anjos nunca dizem nada - apenas me acolhia embaixo do seu guarda-chuva. Chegamos à rua e ela virou a esquina comigo, me acompanhando, com cuidado de mãe, até a porta do albergue. Tudo isso em um silêncio que me comovia.

- Aqui está, querido, tenha uma boa estada em Zurique.
- Com certeza terei, muito obrigado mesmo.

Entrei ainda absorto no albergue. Eu tinha encontrado um anjo. A minha velhinha surgiu do nada e desapareceu do nada - mais um indício da sua natureza angelical. Hoje, nas minhas horas de medo, eu tenho a certeza de que nunca estamos sozinhos, que há sempre uma ajuda, que há sempre uma luz, tudo por causa daquela noite em Zurique: aquela velhinha saiu do fundo do bonde para me dizer que eu tivesse coragem, que em toda aventura na minha vida ela estaria ali, presente. Não só me mostrando caminhos mas, se necessário, me acolhendo na chuva.

E até hoje eu conto e reconto essa história aos meus amigos que relutam em pegar o bonde da vida. É como se aquele anjo enrugado e de olhos verdes sussurrasse aos meus ouvidos, me cobrando o mínimo que posso fazer em agradecimento àquele ato: anunciar a quem quiser ouvir e acreditar que nunca estamos sós e que a coragem, por si mesma, como disse um dia Goethe - que aqui cito de memória - contem em si mesma o poder, o gênio e a magia.