[insone]
Acabei de fazer uma longa viagem de ônibus. Ao meu lado, um senhor que se debatia a noite inteira. Ele não sabia ao certo se mantinha a poltrona em noventa, em cem, ou em cento e dez graus. Ele tinha apenas uma certeza inabalável: o fato de que a pessoa ao lado dele, que daria aula no próximo dia (hoje, no caso), o dia inteiro, teria logo adiante pelo menos doze horas de zumbi. Resignava-me a todo instante, pois não achei que ele estava fazendo aquilo tudo de propósito. Afinal, ninguém se debate a madrugada toda dentro de um ônibus escuro e em movimento somente para ir de encontro ao mísero ser humano que tenta dormir ao lado. Não senti raiva do senhor, não senti raiva de nada, nem de ninguém. A raiva afastaria o restinho de sono e de concentração para dormir, apesar dos fatos. Aí, me acomodei, me afastei do velho o máximo que pude e agora troco letras nesse teclado. Insone, olhos com bordas cinzas. Mas feliz, tão feliz e sereno, que vocês nem imaginam.