Saltos
Sentei sob a sombra de uma bela amendoeira que chorava lágrimas verdes que se escorriam no mar, olhei para os lados e via casinhas pobres, antigas, maltratadas pelo tempo e pela vida corrida e insensível de todos nós que com a pressa não lhes admiramos a beleza. Passei acariciando as suas paredes com a minha lente, elas se abriram em flor, ainda timidamente, sem entender muito por que aquelas lentes a enamoravam tanto.
Andei pela praia de areia fina, descobri que por aquelas bandas atracam búzios belíssimos, que crianças gritam de alegria quando estranhos se aproximam e que barquinhos são retirados pelos seus donos, com carinho, do mar - talvez para não cederem a uma tempestade ou às correntes marinhas, talvez por excesso de amor do barqueiro; não saberia dizer. Ao longe, um armazém inútil. Útil apenas aos que se enamoram e não podem pagar por um ninho de amor e destilam ali os seus desejos sem dúvidas mais aguçados pela brisa que emana do mar da Península.
Percorri a ponte que leva ao centro do mar e crianças pintoras jogavam-se em pulos extravagantes na água, numa familiaridade tão grande com tudo aquilo, que me assustava a cada salto gigantesco e a cada mergulho de horas. Uma delas quis me provar que conseguia ir até o fundo e trazer areia. Volta, depois que eu já a considerava morta, com um punhado de areia na mão. Estava provado, ela era dali, provavelmente crescera ali. Não se sentiam envergonhadas com a câmera. Como bons artistas e baianos que são, aumentavam a altura dos saltos, gracejavam sorrisos para a minha lente.
No céu um Boeing sobrevoava aquele mundo da Ribeira, chamando a lente para registrar o paradoxo. Do alto, sentado na poltrona daquele jato, um passageiro comum não poderia imaginar que aquelas formiguinhas quase invisíveis, lá embaixo, naquele triângulo irregular que é a Península, olharam para o alto naquele instante e, num salto de ingenuidade gritante, tentaram tocar o grande pássaro de aço que lhes sobrevoava a cabeça. Ergueram-se ávidos, emoldurados pelo céu de um azul distante, mas tudo que conseguiram foi ver o mar lá embaixo ainda mais longe e um arrepio de salto mortal inédito. Salto que busca o céu, mas que só revela o mar e, junto com ele, a humanidade de todos nós.
Percorri a ponte que leva ao centro do mar e crianças pintoras jogavam-se em pulos extravagantes na água, numa familiaridade tão grande com tudo aquilo, que me assustava a cada salto gigantesco e a cada mergulho de horas. Uma delas quis me provar que conseguia ir até o fundo e trazer areia. Volta, depois que eu já a considerava morta, com um punhado de areia na mão. Estava provado, ela era dali, provavelmente crescera ali. Não se sentiam envergonhadas com a câmera. Como bons artistas e baianos que são, aumentavam a altura dos saltos, gracejavam sorrisos para a minha lente.
No céu um Boeing sobrevoava aquele mundo da Ribeira, chamando a lente para registrar o paradoxo. Do alto, sentado na poltrona daquele jato, um passageiro comum não poderia imaginar que aquelas formiguinhas quase invisíveis, lá embaixo, naquele triângulo irregular que é a Península, olharam para o alto naquele instante e, num salto de ingenuidade gritante, tentaram tocar o grande pássaro de aço que lhes sobrevoava a cabeça. Ergueram-se ávidos, emoldurados pelo céu de um azul distante, mas tudo que conseguiram foi ver o mar lá embaixo ainda mais longe e um arrepio de salto mortal inédito. Salto que busca o céu, mas que só revela o mar e, junto com ele, a humanidade de todos nós.