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quarta-feira, 30 de novembro de 2005

[ti:pronome oblíquo eu]

Vi tuas nuvens, teus céus
Teus cais,

teus navios de passagem
Vi o céu até da tua boca
O navio que paraste no porto
Do teu sonho antigo.

Vi de onde vinha
Vi para onde foste
Mas perdi-me
Inteiro
Nas minhas próprias direções.

Hoje aporto nesse mar
(no meio)
Desse imenso mar
Que me descobre
E me afoga
E me desdobra em manobras
Que me levam, de novo,
A aportar-me em ti.

terça-feira, 29 de novembro de 2005

[Do lat. victoria.]

Se é pra vencer que seja a mim mesmo. Não suporto mais a vida se ela não for feita de vitórias mínimas, se não for de passos grandes ou pequenos que dou para a frente e para trás. Porque não quero mais o estático, nego de uma vez por todas o hirto. Quero o que anda, e junto com esses passos eu mesmo vou, meio pela metade, todo por ser inteiro, por vezes um quarto, um oitavo, um não-sei-quantos avos do que resta em mim, mas vou sempre, se não eu todo, anda para frente pelo menos uma parte de mim. Vai para ficar, depois nos encontramos novamente, lá adiante, quando essa parte que ficou tiver a mesma coragem que tem essa chuva de cair inteira, e partir-se no ar, banhando o mundo em pedaços gelados que acalantem a alma. Permitam-me ser essa chuva, permitam-me cair em turbulências e ventos e depois subir com o calor de volta aos céus mais purificado, permitam-me dizer que hoje fiz de mim mais um vencedor das coisas bobas, mas que merecem meu apreço, porque todo pequeno passo que dou, me leva a um destino que me faz lembrar passos outros, maiores, vitórias grandes e saborosas. Sim, ainda estou na luta, em segredo, e cada vitória minha é um brinde que faço a mim mesmo.

[Do lat. veritate.]

Se é pela verdade que vieste, esse sou eu mesmo, estou aqui. Se é por mim e pelo que disse que vieste, essa é a mesma boca, a minha boca, a que sempre disse e vai dizer essa mesma verdade que me pede agora, com este olhar distante, que eu repita aos teus ouvidos que me negam tanto. Pois então repito a verdade e te fazes de surdo e ignorante. Tanta inteligência por nada. Deus ainda há de te castigar por essa cegueira deliberada, por esses gestos disfarçados, por essa vontade de sempre se negar mesmo quando o mundo inteiro desaba por ti. Não sei de onde vem essa tua coragem de cegar-se assim, por inteiro. Não sei de onde vem tanto disfarce, tanto medo, tanta dor abafada se o que há para ti é a misericórdia do tempo, a bondade que há em nós homens, nós todos, que deixaste de crer há tanto. Há a minha verdade, se quiser terás ela toda para ti mesmo. Poderá guardá-la num cofre, misturá-la com as tuas mentiras inventadas. A minha verdade e as tuas falsas mentiras serão o par perfeito na busca desse nosso segredo que anda tão escondido, tão amassado e possivelmente condenado pelo tempo que passa, pela mentira que seca, pela verdade que não é dita. Essa frase reveledora, essa nossa verdade feita de papéis que juntamos, acaba virando apenas um velho sonho esquisito, que não se sabe de onde veio , para onde segue, nem porque aqui assim se encontra. Essa verdade é daquelas que por fim se esquecem para sempre, daquelas que levam consigo para o fundo do oceano o nome do seu primeiro sonhador.

[cito dois]

"Tudo o que é essencial é interior, o que é exterior só se torna essencial
a título de receptáculo do conteúdo interior, de meio de expressão do espírito."
(Bakhtin)
E nesses dias em que leio tanto, tanto, não me resta mais nada do que citar os clássicos que nunca vão deixar de me impressionar pela capacidade que tiveram de antecipar tantas idéias, tantas verdades, tanto conhecimento há tanto tempo atrás.
Cada vez mais fica claro o que é ser um 'clássico', e cada vez mais sinto vontade de tê-los assim, tão perto, para serem degustados e para me ajudarem a degustar-me a mim mesmo em pedaços carnudos e saborosos.

[cito um]




"O novo não está no que se diz,
mas no que acontece no seu retorno."
(Foucault)

segunda-feira, 28 de novembro de 2005

[só a bailarina que não tem]

A bailarina chegou para ver as amigas no palco e decidiu, dez minutos antes de começar o espetáculo, que queria dançar junto com elas. Sem ensaiar mesmo, com uma roupa que lhe arranjaram de última hora, e como tudo que já tinha aprendido sobre os movimentos do corpo. E subiu no palco, junto com as outras meninas que sabiam de cor cada traçado, cada gesto, cada pulo, cada queda, cada salto.
Ela se arriscou a imitar os gestos, as quedas, os saltos. Não fez feio, mas foi estratégica: entrava em cena apenas nos momentos em que eram curtos os movimentos. Aprendia os passos nas cochia, com as amigas, segundos antes de entrar. A música ia tocando e ela acompanhava as evoluções. Entrava e saia de cena, às vezes arriscava uma corrida bem performática de um lado a outro do palco, um solo, como tantas vezes somos obrigados a fazer quando não ensaiamos o espetáculo do nosso cotidiano. 'Quantas vezes subimos no palco sem as vestes iguais às dos outros, sem os gestos memorizados, sem saber o que veio antes, sem saber o que vem depois, sem saber sequer o que é, agora mesmo, tudo isso...' pensei, lá no escuro do meu assento, protegido, sem luzes nem holofotes, enquanto via a bailarina arriscar-se em vôos rasantes por entre as outras perfeitas e ensaiadas bailarinas. 'Eu mesmo,' meu pensamento vagava, 'quantas vezes já subi no palco dez minutos antes do espetáculo e saí aplaudido, quantas vezes também só me restaram lágrimas no ar, porque os aplausos não vieram. Quantas vezes eu tive uma platéia muda, ausente...'.
Mas confesso que o ato da bailarina me estremeceu. Se não sou amigo do diretor, jamais teria notado que aquela loira de vestido preto, camaleoa perfeita, a menina-que-nada-ensaiou, era uma bailarina que não dançava há um ano e que teve o estalo da coragem e subiu no palco, confiou em nada-e-ninguém e pôs-se a dançar, a mexer-se em sincronia quando era possível, e sozinha, quando a dança que não ensaiara era o que movia as outras. 'É preciso leveza', deve ter pensado a bailarina. Leveza para seguir sem ensaiar, leveza para não se perder porque às outras já são conhecidos todos os gestos, leveza para dançar seguindo os passos ensaiados há séculos pelas nossas almas bailantes.
Coragem, leveza e fé na alma e em sua sabedoria, quando não resta mais nada além dessa memória tênue que temos da perfeição da nossa dança original.
(sortudo que sou, tenho amigos que são artistas no sentido maior da palavra. Ritoca, já te disse que seu Palavreado é a coreografia final das bocas em sincronia, você sabe o que quero dizer. Valter, esses porquês que nos artomentam ficaram lindos na interrogação enorme que você desenhou no palco e fez ficar mais tênues e leves os questionamentos eternos em nossos corações de criança. O que vocês fazem deveria ser repetido, repetido, repeitido, ad infinitum.)

sábado, 26 de novembro de 2005

[desocupa meu neurônio]

Vai e leva tudo contigo e inclusive leva aquele neurônio que alugaste no meu cérebro durante meses a fio. Vai que já não te quero mais, nem em sonho, nem em realidade, nem numa voz fina ao telefone, nem em pensamentos, vai e não deixe rastro algum, não deixe nenhum sentido do que houve, não deixe sequer a sombra de ontem, vai que já passou da hora, o sino já tocou três vezes anunciando a morte do antigo, o sol já se pôs sete vezes e a amanhã não iluminará mais um caminho partilhado entre nós. A noite já anunciou o fim do dia, portanto, vai, vai e vai em paz, que te quero o mais longe possível, como nunca te quis, ou como sempre deveria ter querido, porque a tua distância poderia ser a salvação, como é agora. Vai porque já não tenho mãos, nem pés, nem cabeça, nem tronco, já não tenho mais nada aos teus olhos, já não vês mais o que vias antes, só me restam agora os mesmos olhos, pés, cabeças, mãos e troncos ressignificados, vistos pelo meu amor-próprio e sob uma luz tão intensa que me refaz pela sua própria luminosidade. Vai e não deixe nenhum sinal que estiveste aqui, que pisaste neste chão branco e brilhante, que pulsou, aqui neste peito, um coração por ti. Vai, exorcizo-te e liberto-te. Não haverá mais pensamentos, nem poesias, nem lágrimas que não viste. Não haverá mais pesadelos, medo do travesseiro verde, medo de entrar no cenário. Voltei ao escuro da barriga de minha mãe e renasço, novo, sem ti. Mas, para isso, é preciso que, por agora, te vás.

Sabes, porque já te disse, que esse ir não é eterno, mas preciso que te vás para que eu possa ser gestado na escuridão, para que eu possa reencontrar-me em mim mesmo, para que possa nutrir-me com força por esses meses em que estarei aqui, no útero escuro e cheio de água. Eu, respirando dentro d’água, anfíbio e depois réptil, humano, ereto, vivo, forte.

Eu, humano, de frente pra ti e livre daquele neurônio onde estiveste hospedado durante esses dias em que fui tão temporariamente feliz.
(Nem sempre um blog permite a presença do presente. Às vezes é preciso que o presente vire passado e transforme um desabafo num poema. Esse texto é bem assim. Faz sentido apenas pelas palavras, que um dia disseram muito, e por isso foram relegadas a uma pasta hoje velha e mofada, e que hoje, por não dizerem mais nada para mim, viraram apenas um emaranhado de palavras que podem até ser boas de degustar.)

sexta-feira, 25 de novembro de 2005

[abram-se em cortinas]

Lentamente vou ascendendo rumo a um céu que via, mas minhas mãos não o conseguiam tocar. É lentamente que desenho cada passo, vou retornando velhos discursos, velhas fotos já se emolduram atrás de mim, naquela mesa que um dia foi cenário. O meu cenário está de pé. Diretor, atores, palco, luz, tudo. Tudo como era antes, racionalmente penso, mas algo com certeza mudou, é como se o cheiro já não fizesse mais sentido, como se a face já não soasse mais tão familiar, como se eu mesmo, esse aqui mesmo, que eu nem acredito que sou eu, já não fosse mais o mesmo ator, o mesmo diretor, o mesmo cara que aperta o botão e dá início ao espetáculo. Senhoras e senhores, abram-se em cortinas, desliguem-se nos seus celulares, façam em silêncio, que o espetáculo já vai começá-los. E o espetáculo invade cada um, iniciando-lhes como faz a vida, cada um no seu tempo, cada qual com a sua deixa e o novelo vai se desfiando inteiro. O público, nós mesmos, em terapias, em bate-papos, em filmes, em blogs, tentando-nos entender como seres inteiros ou como seres de caras-metades. Depois muda o cenário e sentamos na platéia, como estou agora: absorto, inerte, surpreendido. Eu mesmo fiz o espetáculo, eu mesmo, ator, chorei em cada cena. Agora sou um rio que passa, rio de mim mesmo, e encharco de saliva o meu assento cativo, de onde já vi tanto, de onde já se fez tanto de mim.

quinta-feira, 24 de novembro de 2005

[íssimos]

Para Elzinha e suas inspirações belíssimas.
Ser belíssimo é ser além disso que está à sua frente, ser belíssimo é surpreender a si mesmo e aos outros de tanta beleza que vem de dentro. Pode-se parecer um monstro por fora, mas ser belíssimo pelo ângulo interno, pode-se ser calado, sem palavras de brilho, sem gestos surpreendentes e mesmo assim ser belíssimo. Não precisa de roupa, de falas, de cores, de status, precisa apenas dar mais do que tem e cada vez ter mais para dar, precisa suar a camisa e lutar, mesmo em dias de intempéries onde não rola nem uma brisa mais calma. Ser belíssimo é entender que não há necessidades maiores para si mesmo, e que nem sempre é possível agir com precisão, mas é sempre uma esperança a retidão, o entusiasmo, a perseverança, a verdade. Belíssimos são os que nem se olham no espelho, os que se escondem das câmeras, do foco, do palco. É belíssimo quem faz e nem nota mais que fez, quem cria e não se sente maior por isso, quem age e nem mais lembra que foi ele quem plantou a árvore da sombra, o a flor do perfume, o livro da poesia.

Ser belíssimo é ser um monte de coisa. Convoco você a dizer o que acha aqui, ou no seu blog.

quarta-feira, 23 de novembro de 2005

[os fantasmas na minha cama ou use a imaginação para me ler]

E ontem à noite eu sabia da tua presença pelo ranger da cadeira de balanço, pelos toques teus na velha máquina de datilografia, onde tentavas em vão salvar teus documentos tão atuais. Eu via você pela parede que separaria nós dois até as 2:27, a hora exata em que sentiria pés afundando na cama para realizar o meu pedido de menos frio e mais calor, eram teus pés que chegavam enquanto eu dormia, era teu cheiro que me invadia na hora exata em que eu pedia, era a tua mão quente que se recolheria por baixo do meu peito, como um travesseiro de peles mornas e bem-vindas. Mas eu sabia que seria assim: sabia de tudo, como quem viu o filme, e nele, naquela mesma hora eu abriria meus olhos como se tivesse estado na vigília enquanto tudo acontecia desse lado de cá, naquela mesma hora eu veria e viria até teus olhos flamejando de sono, eu te sentiria dizendo que era tarde, sim, mas valeu a pena, mandei tudo pra lixeira e me arrependi depois, me salva inteiro em disquete amanhã, era o que eu queria e o que ouvia. Amanhã é dia de branco, dia de mais um santo, dia de sentar ali, refresco e pizza, pé na mão, colo quente. Amanhã é que é dia.


(Ainda vejo em mim aquele velho espectro do passado, digo espectro porque é como se pairasse sobre mim um velho fantasma que nunca reconheci como sendo uma negação do que quero para mim, por nunca ter feito as perguntas certas que o afastariam com o tempo. Agora, com estas perguntas, reconheço-me em dissociação com ele. Eu aqui e ele ali, ainda às vezes interagindo, mas dessa vez eu vejo a interação e peço o jogo de nenhum par. Não quero mal ao fantasma, vejo-o com amor e nenhum ódio, apenas peço que se retire, que me deixe tirar a camisa e mostrar o peito, que me deixe sorrir largo com as crianças, que me deixe conhecer meus antigos vizinhos, que ainda há tempo para tudo isso. Vai lá, construção das minhas tenras idades, descobri que você não é real porque ontem vi que a sua idade é a mesma de sempre, descobri que não cresceu sequer um centímetro e que a sua força é ainda presente porque era na escuridão que se (me) escondia.)

terça-feira, 22 de novembro de 2005

[mangalô três vezes]

Em primeiro lugar é fim de ano e está todo mundo assim mesmo, de cabelos em pé, de moral meio baixa, sem muito dinheiro no bolso e uma vontade imensa de comprar tudo. Hoje caí na armadilha de ir ao shopping à procura de um livro que preciso desesperadamente para o mestrado. Armadilha, porque me deixou cansado para o resto do dia, anda pra lá, anda pra cá, e com certeza não há nada que consuma mais energias do que andar em shopping, mesmo vazio, porque o Barra as 11 da manhã é vazio, mesmo sem muita gente, mesmo com o ar ligado no máximo quando lá fora faz mais de 50 graus. Ande o mesmo percurso na Orla e você vai entender o que digo, ande 10 km no shopping e 10 km na praia e você vai ver que no último a gente sai é revitalizado. Deve ser a energia dos vendedores querendo fazer o caixinha, a energia nossa mesmo querendo encher as mãos de sacolas, e até quem, como eu, só queria um mero livro, se contamina.
Entrar em shopping é igual a entrar em cemitério. Dobre a manga da camisa, pule três vezes, chame seu anjo da guarda. Eu, heim!
(Agora preciso de uma bela massagem nos pés, de um banho de sais e de um colo dos mais macios. Nada disso tem no shopping, eu sei.)

segunda-feira, 21 de novembro de 2005

[aos goles]

Ainda há muito, muito que ser vivido, se ainda não sabes. Veja que ainda sopra forte um vento que não cessa. Já paraste alguma vez para temer o seu cessar? É que uiva constante, entregue, abundante, ninguém pode tirar este vento de ti, de mim, de nós. Temos uma fé que mora dentro, uma fé natural, quase tão simples e grande quanto este bater constante no peito, que também se move e nos move com esse combustível de duas letras. Se não há nada que possa ser retirado de ti, pra que então tanta avidez, tanta fome, tanta sede de uma só vez, se a vida se dá é aos goles calmos e constantes, se a vida é um momento e depois outro, uma respiração depois outra, um fim que precede um começo, um não que te prepara para um sim, uma ponta que espera seu nó, uma paisagem que se vai e outra que se emoldura, nova em folha, aos teus olhos que não conseguem se fechar, um quebra cabeça de peças que precisam ser contempladas e entendidas antes de serem encaixadas... pra que mesmo é que andas afoito, meio-ar, meio-olho, meio-tempo, meio-si, se há um ponto à sua frente pedindo abraço antes que se forme linha inteira, a linha da tua vida, a linha das tuas escolhas, a linha que, ao fim, será o teu diário aberto, as peças encaixadas em uma paisagem que vislumbraste por toda a vida?

sábado, 19 de novembro de 2005

[guardião]

(ao meu anjo Noel)

Porque sei que tenho a tua guarda
a tua ponte
a tua proteção

sei que és a minha lanterna
os meus olhos
os meus ouvidos
sei que me guias na escuridão
e nos dias de sol em que a luz me ofusca

porque sei que nem sempre lembro de ti
(sei das minhas limitações)

porque eu devo a ti esse percurso
e quero anunciar a minha gratidão.

sexta-feira, 18 de novembro de 2005

[jardineira fiel]

Em um sonho era a minha mãe que me preparava um belo jardim, de bancos brancos, de flores de todas as cores, de céu azul que não se apagava nunca. Era um sonho dirigido por talentoso homem de cinema: takes perfeitos, luz ao fundo, filtros, e todo um aparato que confirmava ainda mais a sua natureza onírica, mas que o diretor tentava disfarçar, dando-lhe um mínimo de realidade para que eu não ficasse triste por ser apenas um sonho. Mas, como num sonho desconexo, lembro-me agora que o diretor na realidade era, de novo, a minha mãe, que por não saber nada de cinema era a diretora perfeita para dirigir um sonho e seus takes irrepreensíveis: nas mãos dela, o perfeito do sonho transformava-se em imperfeito da realidade e eu vivia dentro de um sonho, mas o via como uma realidade, como se minha mãe me dissesse que é de realidade e não de sonhos que se vive, mas que mesmo assim não poderia me privar deles.
(mas fazer o que, se no sonho estavas sim, se eras o banco branco, a paisagem intocada e intocável, a marca maculada do jardim em que eu pisava para dar um toque de realidade tua?)

[minha amiga conchita]

quinta-feira, 17 de novembro de 2005

[procon]





Amizade tem prazo de validade?

quarta-feira, 16 de novembro de 2005

[velhos dias de capão]

Entregar-se. Estar próximo ao divino. Deixar-se levar pelo fluxo.

Sou geminiano não-ar. Geminiano terra firme, medroso das alturas. A representação material da minha necessidade de subir escadas de corrimões firmes, subir cachoeiras sob platôs bem calcados. Estou praticando a entrega. Este cheiro de água em movimento que sinto entrar pelas minhas narinas, o toque no caminho das pedras seguras e das outras em falso, a distância de tudo, a surpresa dessa flor de cor estonteante que me aparece no caminho e pulo a cerca para sentir-lhe o cheiro. O meu olhar acompanhando a água em direção ao precipício, o beijo na boca, cheiro e fumaça. Copo de vinho degustado aos goles corajosos e sedentos. Gata mansa no peito: eu, abrigo da noite fria. O olhar na passarela, mãos dadas, toque de dedos, confie em mim. Febre súbita, dor lá embaixo. Entrego-me ao vento.

Fechei meus olhos sob essa pedra gigante que mataria mil de mins caso resolvesse soltar-se, e sei que a entrega me tornou um outro Leo: distante da Babilônia, mas próximo, muito mais próximo, de Deus.

(Post que nasceu há meses atrás na beira de uma cachoeira no Capão. Dias lindos. Nasceu em um papel de extrato bancário, de mãos que flamejavam inspiração, sorte minha ter uma caneta em punho e o resumo das minhas escassas finanças em um papel já pálido. Sumiu rápido como surgiu: voltei a Salvador, procurei por entre os restos da minha viagem e só ficou a vaga lembrança da palavra ‘entrega’, tão presente nessa viagem mágica. Por algum motivo, encontrei o extrato e o velho post, escrito a mão. Quanto ao extrato, não faz mais sentido, os saldos se alteraram. Quanto ao post, continua tendo um sentido, não mais o mesmo do dia em que foi escrito, quando meu saldo era de milhões, mas outro, porque a entrega continua, só que não mais em águas de diamantes, mas águas que correm, subterrâneas, em outros lençóis.)

[o que há em um nome]

Escolhi o meu próprio nome no momento em que fiz minhas malas para partir rumo a esta vida. No meu nome vinham a minha marca, o meu sonho, estes meus desejos e aquelas minhas dores há tanto perdidas. No meu nome vinham marcas indeléveis e marcas que eu apagaria com o tempo. Vinham, juntos, meu nome e a minha história, meu nome e minha energia, meu nome e meus porquês respondidos e porquês perguntados, vinha tudo no meu nome, vinha eu inteiro, eu e minha sinergia, eu e minha fantasia, eu e essa minha alegria. Nesse meu nome vinham novas e velhas vias, novas aos meus olhos, velhas à minha alma, alma antiga que, distante, nada via. Sonho com meus antigos dias, e acho que são sonhos loucos, louco varrido que eu era e ainda sou, perdido por entre as letras do meu nome que ainda estou. Mas nesse meu nome veio essa minha vontade, esse cheiro que cresceria com os anos, os medos meus que agora transformo em coragem. Veio você, que me lê, que me beija, me odeia e me ama, você que não agüenta mais isso aqui, você que fecha e abre essa página há anos, e vem essa folha em branco a esperar nova tinta, novas palavras derivadas e perdidas entre as letras do meu velho nome.

terça-feira, 15 de novembro de 2005

[brincadeira de cabra-cega]

Às vezes é preciso apenas fechar os olhos e se deixar levar pela fé que é cega, pela vontade que é inabalável e pelo amor que move os braços, as pernas, as células, os instintos, os sentimentos. É nessa brincadeira de cabra-cega, de menino que anda sem ver onde pisa, mas sabe que o terreno é bem calcado, que se descobrem ventos que levam não se sabe direito para onde, pedras que indicam caminhos por vezes absurdos mas cheios de verdades, destinos que se entrecruzam por momentos ou quem sabe por eras a fio. É por esses caminhos que desenvolve-se a confiança, a fé em ninguém-sabe-direito-o-quê, é nesses caminhos que depositamos nossos segredos infantis em papéis de carta perfumados, na esperança de que, ao serem lidos, exalem um belo perfume que é só nosso. Perfume antigo feito a infância, mas atual e vivo como essa enorme esperança.

[drip me]

Presente de Deus esses dias de chuva. Altas gargalhadas vindas de céus tão altos, tão cinzas, tão breves, saliva divina escorrendo do andar de cima em pingos que me limpam a alma.

(De bônus, um cobertor felpudo e dos mais aconchegantes.)

segunda-feira, 14 de novembro de 2005

[pelas narinas]

Os tempos do ano vêm, para mim, em cheiros, e foi num desses dias que, entrando em casa, vi – ou melhor, cheirei -, um ciclo que se fechava, de velhos cheiros que voltarão em exatamente um ano, e de novos cheiros que vêm junto com novembros e dezembros. Os mesmos novembros, os mesmos dezembros, o mesmo cheiro do flamboyant amarelo que mora na frente da minha casa e que nessa época do ano abre-se, perfumado, em cachos de flores amarelo ouro, que pendem e exalam aquele cheiro de Natal, de verão, de surpresa por já ter tudo acabado.
Conforme-se, então, já que o ano acabou, já que os dias praticamente já se foram, o tempo de hibernação das flores amarelas do meu flamboyant já passou também, e agora é verão mesmo e no verão as flores saem para ver o sol. Eu mesmo perco meu tom amarelo pálido e cresço em cores de tons dourados, e em todos os cantos do meu corpo sentem-se os cheiros desse verão que anuncia sua própria chegada, o prenúncio de algo que morava em uma velha árvore - ou mora ainda, porque dessa casa antiga nunca se sai para sempre. E fica no ar, nas minhas narinas, no meu contato com o mundo, esse cheiro, me invadindo inteiro como se o mundo tivesse parado nos alegres dias de janeiro e não fosse mais avançar rumo a fevereiros e junhos e agostos de chuvas e alguns breves desgostos. Paro em janeiro, ainda inteiro. Em janeiro, sou todo, todo cheiros.

[blackout]

(A luz faltou, acenderam-se as velhas velas. Velhos hábitos para momentos em que o clique da modernidade já não serve pra nada. Silenciou-se a noite, havia uivos e chuva caindo, e nada mais que o raro silêncio das noites de sábado da velha Cidade Baixa.)

Chama flamejante
Me chama, chama
Chama que vou,
por estes caminhos
de sombra e luz.

Detenho-me nesse jogo
de luminosidades
Que desenham (eu ávido)
esta escultura à minha frente.

Devaneio meu é arriscar-me
nas partes que insistes
em manter nas sombras

Como se para percorrê-las
Eu devesse aceitar
teus mistérios

quinta-feira, 10 de novembro de 2005

[bum-bum]


Trazer de volta e deixar que dêem as mãos a menina que ama e ri e o menino que faz crescer e multiplicar o mundo. Que eles formem o par perfeito e harmonioso, coração e força motriz, afeto e instinto, pena e impulso, choro e gozo.

[pontas]


Meio cansado dos extremos
não quero nem oito
nem oitenta
mas algo que fique ali...
perto dos cinqüenta.

segunda-feira, 7 de novembro de 2005

[perfeitas contradições]

Toda contradição contem em si mesma uma verdade inerente, que vive presa e pedindo ar entre duas outras possíveis 'verdades' que, sozinhas, na realidade, só servem de instrumentos que usamos para mascarar verdades mais poderosas. É como se, para nos defender da vida, criássemos barreiras momentâneas que geram crenças e que evoluem até o ponto de acreditarmos nelas como verdades absolutas. Quando a vida nos dá a oportunidade de olhar para nós mesmos com olhos mais piedosos - e portanto mais interessados nas nossas verdades profundas do que nas ilusões que geramos para protegê-las de nós mesmos -, nos deparamos, em princípio, com contradições que vivem, intensas, em nós, materializando-se em nossos atos, palavras, pensamentos, sentimentos, emoções. Tudo que somos é a expressão constante dessas contradições. Vamos adotando no decorrer da vida comportamentos de defesa e incorporando-os às nossas vidas. Chega, no entanto, a hora em que eles começam a incomodar. E é exatamente nessa hora que temos a oportunidade de espaná-los, agradecê-los pela presença, pela utilidade que tiveram para nos ajudar a atravessar tempestades, mas amorosamente dizer que não, não preciso mais de vocês, podem se dissipar no ar, voltar o mundo das ilusões de onde vieram, que agora quero viver com essa verdade minha que é o que me move a partir de agora.

sábado, 5 de novembro de 2005

[web]

É que nos falta a noção exata da quantidade de perfume que retemos nas mãos e doamos ao outro quando damos uma flor, nos falta a noção do resultado dos nossos gestos, da vibração que causamos do outro lado da linha, da força que sugamos ou redobramos, do sonho que cultivamos ou apagamos. Nos falta a noção exata da responsabilidade que temos pelo outro, por vivermos nessa teia intricada, vistos do alto por uma aranha-mestre que nos pôs todos aqui nesse emaranhado de fios tênues, mas poderosamente fortes que nos unem de maneira tal, que não há como dar um passo sequer sem que reverbere no outro um sinal dos nossos movimentos.

Não temos a noção exata da existência dessa teia ou da presença nossa nela. E não sei se advogaria pela nossa total compreensão disso. Entendo-a como necessária, mas não sei se, nesse estágio que nos encontramos, seria bom subir em uma montanha e de lá poder ver a nós mesmos amarrados uns aos outros por esses fios elásticos e tênues que parecem não existir, vendo que um simples espirro já faz vibrar uma outra ponta ou um simples suspiro rompe partes da cadeia. Não temos essa noção, a não ser quando tropeçamos em algumas dessas linhas e sentimos a dor de uma queda, ou, quando puxamos o fio e damos ao outro a noção exata de que não se está só nunca. Pisaríamos em ovos, se soubéssemos, perderíamos a o gesto-livre. Sabendo-se presos a fios, seríamos marionetes de nós mesmos.

É preciso andar com cuidado, cautela ainda em não puxar os fios de maneira tão suave ou abrupta, ficar atento às vibrações que voltam pelo fio que nos une na teia, pedir à aranha-mestre que nos dê, se não laudos exatos, pelo menos dicas destas intricadas relações que estabelecemos nesse emaranhado de linhas invisíveis em que estamos presos para, por fim, irmos puxando a linha única que na realidade isso tudo é, a linha-mestra do nosso destino, o fio que dizem ser de Ariadne, mas é nosso, e ter o prazer final de ver que lá na ponta estamos nós mesmos, já aranhas, já na montanha, já olhando um emaranhado do qual não nos livraremos nunca, mas no qual já podemos, pelo menos, pairar, mais livres.

[escassez]



Pra que tanto
se com tão pouco
já ando tonto?

sexta-feira, 4 de novembro de 2005

[identidades fragmentadas]

Tracy:Why do people have to die?
Nate:To make life important.
(A Sete Palmos, 1a. temporada, Episódio 13)
Como é fácil escrever um roteiro seja lá do que for em que existe a dicotomia bem e mal, representados pelos vilões e mocinhas. Como é difícil escrever um roteiro ou seja lá o que for sem maniqueísmo, sem forças diametralmente opostas e estereotipadas se combatendo do início ao fim, como é difícil falar de gente de verdade sem cair na fácil armadilha do ‘ou sou isso ou sou aquilo’. Ninguém é isso ou aquilo, ninguém é só bom ou mal, feio ou bonito. Nem alto ou baixo sequer somos. Num mundo de anões um rapaz de 1m60 pode ser um gigante! Gente não pode ser classificada por etiquetas, rótulos. Gente de verdade não segue os parâmetros do ou/ou, mas do e/e/e/e/e.... E esse é um dos grandes desafios da arte. Humanizar-se a ponto de falar da identidade nossa que se faz de retalhos e não de panos de cores sólidas e únicas.
Imagem referente ao seriado da HBO, A SETE PALMOS, no qual não há vilões nem mocinhas.

[uma praça com eu ausente]

Contemplar é contemplar-se, porque quem contempla no sentido maior da palavra vê a si mesmo, entra no mundo que é de dentro e se reencontra com uma essência que vivia morta ou adormecida ou entorpecida pelo barulho do eco que vem lá de fora. A contemplação é irmã do silêncio e este é condição para aquela. Não existe contemplação fora da calmaria da não-palavra. Contemplar exige ânimos acalmados, mente serena, voz rouca e baixa, sussurros, floresta virgem, mar e barco lá no infinito a navegar.
Quem contempla aprendeu a arte da conquista, aprendeu a ver com os olhos da alma e não da mente, aprendeu a ter acesso ao conhecimento invisível aos olhos e ouvidos racionalizados, doentes, impregnados de carne morta.

Contemplar é movimentar-se rumo ao encontro maior. Um dia eu aprendo.

terça-feira, 1 de novembro de 2005

[Do gr. metamórphosis.]

Ser sempre eu mesmo,

mas nem sempre

o mesmo.

[fênix]

A velha águia recolhe-se no alto de um rochedo - onde há o silêncio - e ali se refaz inteira: arranca o velho bico, as velhas garras, as velhas e pesadas penas que não lhe dão mais a leveza necessária para vôos seguros, e depois de meses estará pronta para seguir sua vida nas alturas.

A coragem de perder seus velhos pedaços dá a águia a possibilidade de continuar, poderosa, nos ares.