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segunda-feira, 31 de outubro de 2005

[interrogações]

Quando a gente passa a ficar mais desperto para as nuances da vida, começa a descobrir que o que ela nos traz, sempre, são experiências que nos ajudam a descobrir quem de fato nós somos. É nesse momento que começamos a abandonar as velhas perguntas que julgam o outro e não nos levam a lugar algum e perguntamos sobre nós mesmos. Quando paramos de perguntar porque fizeram isso ou aquilo comigo, ou porque mereço esse ou aquele resultado da vida e começamos a perguntar que efeitos esse ou aquele acontecimento tem em nós e qual a razão disso, entramos no processo de crescimento verdadeiro, aquele que não tem volta, porque é um passo que se dá rumo ao autodescobrimento. Não é fácil. Temos de nos despojar do ego, tirar as máscaras, voltar atrás, ter certezas e depois negá-las, pondo no lugar verdades que às vezes doem. É preciso quebrar o espelho da vaidade e olhar lá dentro, para aquele mistério nosso que insistimos em manter desvendado, por medo, por vaidade, ou até mesmo pela utilidade momentânea de se fazer de cego e se deixar enganar. Mas até quando esse jogo se sustenta?
O processo de crescimento e reforma íntima não passa pelas respostas que obtemos da vida, mas pelas perguntas que fazemos sem, necessariamente, termos resposta alguma.
O ato de perguntar, por si só, às vezes já vem impregnado de respostas. Quem tiver olhos que veja.
Boa semana a todos.

domingo, 30 de outubro de 2005

[sim, pode]




Can a heart break after it's stopped beating?

[pra cantar abraçando o mundo que flutua, invisível, no ar à sua frente]

Eu encontrei-a e quis duvidar
tanto clichê deve não ser
você me falou pra eu não me preocupar
ter fé e ver coragem no amor
e só de te ver
eu penso em trocar
a minha tv
num jeito de te levar
a qualquer lugar
que você queira
E ir aonde o vento for
e pra nós dois
sair de casa já é
se aventurar

(los hermanos)

sábado, 29 de outubro de 2005

[meu sotaque]

É muito bom sair do cinema e descobrir-se ainda dentro do filme. Nossa experiência de brasileiro é de ver filmes que em nada retratam uma realidade concreta nossa. Ou o filme é estrangeiro mesmo ou é brasileiro, mas estrangeiro na metáfora. Quase nunca nós, baianos, nos enxergamos ali na tela, quase nunca nos ouvimos, quase nunca vemos aquela rua por onde passamos sempre, ou aquela paisagem com a qual já estamos tão acostumados.
Para mim, que tenho 31 anos, nunca tinha tido antes a experência de me ver na telona com tanta realidade. E no meu caso, em especial, por ser brasileiro, baiano, nascido, criado e morador da Cidade Baixa, esse filme sem dúvida tem um quê bastante especial.
Para ser assitido, admirado e degustado. Baianidade pura. Na essência.
Na foto, Wagner Moura, Alice Braga e Lázaro Ramos. O filme, sem dúvida é do primeiro. Quem é baiano sabe.

[barreiras]





Essa felicidade é o meu escudo.

[noivos]

Foi ao casamento, não era o noivo, não estava usando a fantasia, mas um paletó como todos os outros que assistiam dos bancos os dois mascarados no palco encenando o rito. Na festa quis uma menina, que não o quis, ficou triste, tá bem, vamos lá pra essa festa a fantasia, fazer o quê, ela não me quer, mas foi de paletó mesmo, e chegou na festa e viu uma outra menina toda de branco, grinalda, não era a noiva que tinha acabado de casar na festa em que estava, era a noiva da fantasia de seus sonhos. Em meio a tantos príncipes, fadas, aladdins, gregos e bruxas, ela era a única noiva, e ele, quando a viu, olhou para si mesmo e viu que estava tudo no plano, porque além das fadas e dos deuses mascarados, estava ele também com sua máscara de noivo não-planejada, a máscara que só é mascara porque ele estava entre outros mascarados, a máscara que ele vestira sem saber que era o passaporte para sua fantasia da noite, que fez dele o par perfeito para a noiva que vagava, sem buquê, entre os gregos, anjos, querubins, deuses e aladdins.
Pegou a mão da noiva e fez o pedido, não aquele para vida toda, afinal não trouxera os anéis e os convidados já andavam embriagados, mas o pedido de um beijo que pudesse durar a noite inteira, o beijo que se pede ao mesmo tempo em que se pede para tirar a máscara e, no caso deles não podia, porque era a máscara o passaporte para o altar, o palco onde se encenaria o sonho da noite.

sexta-feira, 28 de outubro de 2005

[na vaga: de um fôlego só]

Leva ela, mas vai com ela, pisa nela, mas fica nela, sonha ela, mas treme nela, corta ela, mas come ela, corre depois e antes que seja tarde e alguém mais leve ela, e corte ela, e suba nela, e faça dela o que era o seu sonho, antes mesmo você tem de escrever pra ela, dedicar-se a ela, contornar o mundo por ela, pô-lo em um papel, mas deixar um sim por ela, riscar um não por ela, veja que tem de deitar-se por ela, mas não nela, ela vai sorrir e você sorri por ela, cruza o rio por ela, depois não se deita nela, mas deita e sonha por ela. Ela é a vaga, a que vai e vem, você vai junto, você que a acompanha, você o barco, o mergulhador e o antigo vento que balança a vaga. Não se faça – conselho de amigo – de vaga, não se abra em cristas poderosas, mas vai nela, rola nela, deita-se nela, cresce todo nela, surfa-a inteira, muda a sintaxe por ela, mas escreva dela, por ela, com ela, você é barco, não esqueça, é mergulhador, não esqueça, você é o dono de nada, não esqueça, segue a vaga e cai nela no raso e depois espera as tempestades vai ao fundo e se aninha nela.

[urna]


Estou em campanha.

Primeiro você vai e vota nesse blog. Depois você volta aqui e lê os três posts de hoje.

Como você já se deu ao trabalho de votar, até entendo se não rolar comentário nos três.

[estalos]

Como sabemos então da existência de Deus, não resta nada mais senão esperar por ele, esperar que ele ponha Suas mãos mágicas na nossa fronte e em tudo à nossa frente, diga uma palavra mágica e todo o mal se desfaça e todo o bem finalmente se faça, concreto, aos nossos olhos. Certo?

Bem, eu acho que não, mas se você acha que é assim, que basta acreditar nos estalos dos dedos divinos que o mundo ficará de repente melhor à sua frente em um toque de mágica, é meu direito pelo menos achar que você está redondamente enganado. Tão redondo que tem andado em círculos que não levam a canto nenhum, porque anda acreditando em milagres que não custam uma gota sequer do teu suor. Pois saiba que Deus não é mágico, não é adivinha, não é um poço de vingança nem de bondade gratuita. Deus é um cara assim, vamos dizer, meio poeta, meio maluco, mas daqueles malucos que ficam de longe espiando, escrevendo umas poesias brilhantes, aguçando umas cores, soltando umas brisas e de vez em quando uns furacões, assim meio como uma criança que quer chamar a atenção, sabe? É assim que ele age, e ele só age assim, não se engane não, filho de Deus, e vá logo arregaçando as mangas, viu?
(reclamaram, pois hoje tem 3)

[os quatro mil e quatrocentos]

Cada vez mais me encanto com a capacidade que alguns roteiristas têm de criar minisséries espetaculares como esta. Já comentei aqui sobre algumas outras produções americanas, como Angels in America e A sete palmos, que me fazem ter vergonha da novela brasileira que, eu sei, é um gênero distinto, mas que - vamos admitir - estão cada vez mais repetitivas e entediantes.
Não vou falar muito aqui do The 4400. Se quiser saber mais, clica aqui.

[bitter]

-Que lágrimas são essas e de onde é mesmo que elas vêm, se acabo de pingar uma delas na minha boca e o gosto é de fel, como se elas tivessem surgido de um poço cheio dele, cheio dessas tuas mágoas antigas que ainda não destilaste, nem foste capaz de transformar em perfumes que agradam ao mundo ao invés de detê-las como um velho gosto amargo na boca?

- Não é fel, não é perfume, é apenas o velho salgado de minhas lágrimas mesmo, é que nunca tiveste a coragem de experimentar a minha dor, e agora que a tens assim, tão presente e salina em tua língua, sabes exatamente o gosto que têm. Não é fel, mas mata se não souberes, como eu um dia soube, mantê-las o tempo exato na boca, a fim de sorver-lhes o mínimo de pesar necessário que elas têm a oferecer.

- Pois já cuspi o teu fel, já amassei as velhas rosas e agora na minha boca só entram novas salivas, respiradas, alheias ao veneno que mora em teu poço.

- Salivas respiradas apodrecem e viram veneno pior que fel. Fica de boca fechada mesmo e alimenta-te desse gosto antigo que tens ai. Esse velho gosto humano, nada divino, que tens e também tenho, mas que não se junta mais ao meu em química mortal, nem fica guardado na minha saliva esperando que o ventilem, pois já se descobriu volátil e mal-cheiroso pelo passar da brisa.
(amargo, não? sorry!)

quarta-feira, 26 de outubro de 2005

[pesos]

Toda vez que da tua boca sai o manifesto de um sim, um tijolo a mais se põe na parede do teu futuro, um passo a mais é dado rumo ao teu destino, e ouve-se agora mais de perto o som do teu riso ou do teu choro.

A cada ‘sim’ que soletras com estes fonemas que te tocam a língua, um novo ‘não’ é também pronunciado, paralelamente, em um outro canto. Não ganha nem um nem outro, formam eles apenas o equilíbrio de que necessitas para cruzar de um lado a outro da vida sem tropeços nem tonturas e sem cair no abismo onde ecoam ‘sins’ e ‘nãos’ mal-ditos.

Pendem, em cada uma das tuas mãos, os pesos de cada afirmação e negação que fizestes, e estas cargas neutralizam o teu andar de corda bamba que mira ao longe o já falado e temido abismo, equilibram os teus passos tontos, levando-te seguro rumo ao lugar onde pousa o teu futuro.

terça-feira, 25 de outubro de 2005

[update]

É que meu computador anda de preguiça, vou ter de levá-lo a uma visita ao médico, e eu ando às voltas com o corpus, e a tendência é que a autópsia demore.

No mais, ando loucamente à procura de textos interessantes sobre o meio ambiente para preparar as aulas da UNIFACS. Aliás, essa procura me tem posto em contato com tantas mazelas... tá na hora de mudarmos alguma coisa nessa nossa relação com o meio ambiente, não é mesmo, pessoal?

[um reino que será]

Lá vai então ele de volta ao reino, onde as velhas pedras ainda estão no mesmo lugar, os tijolos ainda esperam as mãos que vão construir o castelo, a estação de trem, nunca inaugurada, espera a dama que virá no vagão de luxo, com seu vestido de princesa. Ele ainda vaga por terras desconhecidas em seu velho e potente cavalo branco, troca sempre o penacho para não perder o ar esbelto e vaga, vaga pelos arredores do seu reino ainda vazio, sem manetas, pernetas, súditos, nem rei. Há apenas a promessa de um reino, em cujo futuro sítio já corre um rio caudaloso e crescem árvores que um dia, como ele, serão centenárias. Ele está retornando, que mesmo sem nada, é lá a casa do príncipe, que ainda não mora, não vive, só respira o ar do seu reino, velho reino onde não moram traças nem habitam bolores, posto que é um reino apenas de passagem. Até que chegue o trem, por ordens expressas do príncipe, nada deverá ser construído no terreno vazio, que ainda não existe em nenhum mapa a não ser naquele que a princesa têm nas mãos sem saber que tocam as suas palmas as direções por onde devem ir seus passos na busca de seu próprio tesouro.

sábado, 22 de outubro de 2005

[mãos estendidas]

Reconfortante saber que existem pessoas neste mundo que estão criando um caminho firme e verdadeiro rumo a evolução planetária. Não é difícil, hoje, listar estas pessoas, nem é mais tão difícil encontrá-las. Simplesmente porque são seres humanos cheios de dúvidas e defeitos como todos nós, mas que possuem um diferencial diante da grande massa: essas pessoas já estão agindo e já entendem que o caminho da felicidade pessoal passa necessariamente pela ajuda ao próximo e que não adianta viver em um arredoma, olhando somente para o próprio umbigo, querendo estabelecer parâmetros de felicidade pelo que temos ou pelo que achamos que somos. Essas pessoas já entendem que o que leva adiante mesmo é a crença de que não há caminho evolutivo, de melhora, de felicidade, de cura, que não passe pela doação, pela entrega, pelo entendimento de que ninguém evolui sozinho e que os caminhos que percorremos sempre se cruzam com o do outro por um motivo que pode – quando temos esse entendimento mais amplo das forças da vida – nos alavancar. E essa alavanca é sempre o outro, simplesmente porque não vivemos no absoluto, não estamos sós. O outro existe para relativizar, ensinar, provocar. É interessante quando aceitamos a provocação e vemos com outros olhos certos desafios. É exatamente nessa hora que damos um passo à frente e o que parecia um tormento, acaba se transformando em uma grande lição.

Dentro desse mundo da ‘forma’, no qual estamos presos, acorrentados até em alguns casos – sim, muitos de nós estamos encarnados compulsoriamente -, temos a ilusão de que estamos separados uns dos outros e que é só olhando para meu próprio umbigo que eu serei feliz. Ledo engano. Diferente do que insistimos em achar e acreditar – até mesmo para tornar esse momento aqui nesta vida mais ‘fácil’-, ninguém evolui querendo tudo para si. Observem até na nossa vida social. Ninguém consegue viver sem o outro, sem um amigo, sem estar em comunidade. Precisamos do outro porque é nele que fazemos nossos ajustes internos; e estou falando de energias mesmo! Óbvio que há momentos em que é bom e preciso ficar sozinho, o silêncio é fundamental, mas não estamos falando deste momento em que ‘encontramos nós mesmos’ no silêncio e na solidão. Estou falando mesmo é em por as mãos na massa, é em formar uma massa crítica, de pessoas que acreditam num ideal de caridade, de ajuda, de gentileza com o outro, é uma massa de pessoas que arregaçam as mangas e deixam de olhar para suas próprias necessidades por algum momento e olham para o outro com o olho da alma, aquele que vê a verdade que mora em nós no irmão que pede um prato de comida. Vejam que essa verdade varia em cada um de nós. Felizmente, graças à nossa diversidade, ela não é sempre a mesma.

Vivemos entre a dor de ver tanta gente passando fome e a responsabilidade que (não) temos com relação a isso tudo, do quanto podemos fazer e quase nunca fazemos, existe uma voz lá dentro que deixa na maioria de nós uma incerteza, uma pergunta, um impulso que às vezes obedecemos e outras vezes não. E justificamos sempre a nossa passividade ou pró-atividade com desculpas que nos dão uma paz passageira. Pomos os pés na rua e lá está outra criança de mãos erguidas e os mesmos questionamentos voltam. Isso tudo ocorre porque estamos dentro de um mundo louco, é bem verdade, mas que está também sendo modificado aos poucos por abnegados trabalhadores da paz, e as vibrações se misturam, criando saudáveis questionamentos. Se antes havia muito pouca gente que se sensibilizava, hoje há muito mais, é só ver a quantidade de voluntários trabalhando na seara da ajuda ao próximo.

Não quero pregar nada aqui. Cada um sabe de suas verdades, sabe se deve ou não dar esmola, dinheiro, comida, uma palavra, seja o que for. Até os que viram a cara, fecham os vidros do carro, mudam de passeio, de cidade, de país, têm seus motivos, seus medos, e devem ser respeitados em suas escolhas. A minha intenção é só por o assunto em pauta. Pensar, sim, faz uma diferença enorme.

:::

A inspiração para este post veio de uma palestra que assisti ontem, com Saulo Calderon, um cara muito gente boa que desenvolve um trabalho com Projeção Astral aqui em Salvador. A energia desse cara é tão pra frente, ele fala com uma simplicidade tamanha a respeito de um assunto tão cheio de tabus e medos, que me encantei pelo seu trabalho. Quem quiser conhecer melhor, clica aqui. Aconselho que vocês leiam os relatos das projeções astrais dele, muito interessantes e cheios de reflexões legais a respeito dessa nossa missão aqui na Terra.

sexta-feira, 21 de outubro de 2005

[razões]

Para que se escreve um blog? Um exercício de que mesmo? Um desabafo? Um choro? Uma análise do mundo? Uma necessidade de se expor? De ser aprovado? Um ato de generosidade com o mundo, tipo, eu quero que todos sigam meus exemplos? Como era a sua vida antes dele? Escrever um blog é provocar uma explosão de tédio? Uma explosão de idéias? Sem ele haveria uma dor de cabeça infernal por não ter onde desaguar suas dúvidas, medos, alegrias? Por que essa necessidade, heim? Será o blog uma válvula de escape para sua ansiedade, sua vaidade sem limites? Necessidade de escrever? Mas se é só isso, por que não escrever tudo isso e guardar? Ah sim, porque não se escreve sem ter pra quem, o ato da escrita por si só já presume um leitor. Mas você mesmo é o leitor, o primeiro de todos, o leitor de antes do blog, do post, de tudo. Você lê o mundo antes de pô-lo no papel. É verdade, então não sei para que eu escrevo. Será que a pergunta não seria para quem você escreve, será que você não encontra a resposta por não saber fazer as perguntas corretas? Mas tanta gente escreve... Sim, e você é do tipo maria-vai-com-as-outras? Não creio. Não, não sou. Quer dizer, não quero ser, mas acho que estou sendo. Hmmm. Será? Ah, mas meu blog tem personalidade. Sério? Como assim... personalidade? Você diz isso com a boca cheia... Personalidade... você quer dizer... seu blog é único, especial? Acho que é isso. De certa forma sim, ele é. Mas qualquer blog é especial e único, afinal as palavras de uns não se repetem nos outros. Sim, tá. Não é isso, ou melhor, isso não quer dizer nada, isso apenas não justificaria ter um blog. Acho que você foge da resposta. Talvez... Mas talvez eu também não precise de uma razão. Tudo na vida, antes de existir, existe por uma razão. Não se engane. Então essa razão daqui ou não existe, ou vem tanto lá de dentro que eu nem sei dizer. Escrever isso aqui é prazeroso. Como sexo? Não, sexo é mais ainda. Como o quê, então? Não sei.

(O diálogo continua, não aqui, mas aí pelas tuas estranhas.)

[pelo sim e pelo não fico com a minha razão]

Somos donos do nosso destino, disso não há dúvida alguma. Um ‘não’ que decidimos dar a uma possibilidade que cresce à nossa frente representa uma (re)definição de rumos, uma (re)organização de objetivos e, em um nível mais interno, uma (re)arrumação íntima que fazemos com nossos botões. Um ‘não’ a uma possibilidade é uma decisão nossa, de mais ninguém, afinal de contas a negativa sai de nossa boca mesmo, e será impossível saber, algum dia, como seria a nossa vida se, ao invés do ‘não’, tivéssemos dito o ‘sim’. Aliás, essa é a mesma dúvida dos noivos que um dia disseram não o ‘não’, mas o ‘sim’ no altar. Mas isso aí já é pano pra outro conto.

Infelizmente o filme alternativo não corre em paralelo, infelizmente não teremos acesso ao que aconteceria, ao que seria, ao que seríamos. A realidade não aceita o ‘se’, ela se faz com os ‘sins’ e os ‘nãos’. Por isso é preciso coragem para negar ou confirmar. A vida, geralmente, não dá a mesma chance duas vezes.

(disse não, mas disse com a certeza que ecoa em mim agora. A minha vida me mostra que não é feita apenas de cifras, mas de consciência tranqüila, pés descansados, olhos brilhantes e coração batendo forte e pausadamente no peito. Meus valores são testados a cada hora. Tanto na hora em que vejo aquele pássaro pequeno no céu, que de hora em hora desce para beijar a flor, quanto na hora em que vejo o grande pássaro de aço, que poderia me levar daqui, me dar um mundo novo, mas que levou apenas um advérbio de negação sonoro e bem dado na sua velha lataria.)

[o sonho que anunciava o fim]

Hoje sonhei que eu havia escrito esse blog inteiro. Não que eu houvesse escrito durante um ano e semanas e um belo dia tivesse desistido dele: era o seu próprio fim que eu sonhava. Sonhei com o fim dos meus dias, se é que me entendem.

Eram todos posts pequenos, de quem passou a vida em pequenas gotas insossas, era um sonho de vida que passou e deixou pequenos textos já lidos por todos, sem nenhuma novidade. Os textos diziam algo repetido, era como se tivessem copiado e colado todos eles e apressado o fim dos dias. Não teria havido evolução, apenas control c, control v. A repetição dos dias, o inverso do que é esse blog, o inverso do que é a evolução que pretendemos todos para as nossas vidas.

O sonho era um alerta, era meu inconsciente contando-me das minhas repetições e da necessidade do novo: aliás, a minha alma era quem dizia, eu sou abastada, eu que dou a ti a riqueza das tuas horas, e meu inconsciente, de mãos dadas com ela, punha uma tinta horrorosa na repetição que se fazia ali. A tinta cobria a tela inteira, como que cobrando a retomada da variação, do inusitado, dos temperamentos e das calmas, alternando-se em milagres cotidianos.

Um eu meu que morava no sonho – o suposto agente repetidor, o que apenas clonava os dias – debatia-se em fúria quando via a tinta que escorria, a tinta lançada pelo polvo de oito patas, a minha alma que tudo alcança. O outro eu observava distante, ávido pela história completa, o repórter dos acontecimentos irreais. Esse repórter, outro eu como já disse, via de longe como quem vê um filme, e repetia para si mesmo, isso vai dar um belo post, daqueles que dizem muito. Basta acordar e lembrar, copiar daqui e colar lá, e ainda pedir ajuda à imaginação que rebusco estas alucinações até transformá-las em conto surreal.

Morreu o repetidor, ficou o polvo, acordou o menino que tudo sonha, lembrou o repórter do sonho, fincou-se o sonho na realidade. Você leu, refez o sonho pelos seus sentidos e agora estou aqui, relendo o sonho, revisitando o velho e angustiante sonho, descobrindo-me nele, sonhando-me comigo mesmo, criando um novo post já velho, exorcizando a rotina, o eu repetidor, o que vê a mesma hora a qualquer hora porque o relógio há muito só marca o mesmo de sempre e ele sabe e mesmo assim nunca vai ao homem-que-move-ou-remove-os-ponteiros-que marcam-o-tempo.

quinta-feira, 20 de outubro de 2005

[mil palavras]


Dizer nada, para alguns, às vezes é mais difícil que escrever mil palavras. Como eu sou um desses cuja prolixidade é evidente, hoje eu pratico o silêncio.

Que ele ecoe em você, trazendo-lhe a paz que eu sinto agora.

Boa quinta.

quarta-feira, 19 de outubro de 2005

[janus fala]

Se Janus ainda fala das velhas dores não é fato mesmo que ele ainda tenha estas dores dentro de si. Janus ainda tem um resquício de passado, sim, mas uma porção enorme de futuro daqueles que arrepiam só de pensar no tanto de felicidade que lhe aguarda. Janus entende a tristeza, mas ele não quer entrar na tristeza, ele entende o velho sonho, mas o transforma em pesadelo que lhe faz erguer a espada. Janus observa a tristeza e apreende dela os significados. O que há dentro de Janus hoje são apenas velhos e arcaicos sentidos, ou “velhas de falas tortas que não dizem mais nada”. Ou quase nada.

Vamos dizer que elas apenas balbuciam velhos sons que Janus expulsa, a milímetros, a cada dia e a cada instante de que são feitos os dias. Janus procura entender o passado, mas o rejeita veementemente, vê o futuro, mas o rejeita igualmente, porque Janus tem sede de agora, de respiração. Janus não respira no passado, nem no futuro. Janus respira do passado e do futuro, porque Janus não quer falsos e velhos ares, não quer respirar o hálito das velhas tortas, mas o hálito que emana dessas bocas que lhe cruzam agora, nesse mesmo instante.

Para Janus, o segredo da transitoriedade é sabê-la inexistente. Quando a vida é somente agora, entende-se que nada passa, nada foi, nada será. Tudo é.

segunda-feira, 17 de outubro de 2005

[medicina legal]

Minha orientadora hoje me repreendeu: chega de estudar teoria e vamos colocar as mãos no corpus.

Colocar as mãos no corpus. A etapa que mais adiei, a etapa que mais temia, porque no corpus não se coloca somente as mãos, mas a alma inteira. No corpus não se coloca apenas a alma, mas corpo, olhos, dentes, boca, língua e todos os sentidos.

No corpus coloca-se a mente que abstrai e a que concretiza.

Bem, que venham o corpus e seu mistério, e meu corpo inteiro debruçado, extasiado e temeroso, sobre ele.

[diálogo para sair das trevas]

Já são mortas todas as horas
Tu, que és do futuro,
Ainda padeces na secura
Dos teus ontens...

Pois saia então deste canto bolorento
E vem pra fora, o mundo do futuro,
Aqui não há lembranças
Nem saudades
Aqui é o tic-tac das horas, ele mesmo,
Que te dá alento.

Deste alento eu sei que preciso
Já que o tempo em que vivo
Cheio de cores mortas e velhas de falas tortas
Que não dizem mais nada
Já não me servem, eu sei.
(estas frases já há tanto tempo acabadas...)

Pois termina aqui este torpor de anos
Recolhendo-se ao sol que queima a retina
Que se põe de fora
É esse o momento.

Acredite:
É essa a hora.

(...)

(Pôs-se pra fora
sem temor da vida,
mas morreu ao sol

pois a vida que lhe restava
sob a luz do astro
parecia-lhe ainda mais doída.)

[gorda]

Essa lua cheia daria um ótimo post.
Pena que eu, sempre pela metade, minguante,
Jamais conseguiria falar de sua inteireza,
Ou desse mistério,
que mesmo cheia,
lhe concede tanta leveza.

[batata quente]

Mas qual é o tipo de normalidade de coisas que esperamos para as nossas vidas? Não seria a normalidade, ela mesma, um tédio? Ou seria ela o conforto desejado, pelo qual lutamos a vida inteira, enfrentando tempestades para ir ao trabalho pela manhã, adversidades para encontrar um par, nove meses inteiros e mais uma vida para formar um descendente que possa herdar tudo que deixaremos para trás? Que tipo de normalidade é essa que nos deixa cada vez mais insanos, anormais até, ansiosos, estressados, em busca de tudo ao mesmo tempo e agora? Será que queremos mesmo a normalidade, ou será que nossos parâmetros estão confusos, perdidos, como este texto, e nossos atos já não possuem um sentido próprio, robôs de nós mesmos que somos? O que era essa normalidade há séculos, ou até mesmo no século que passou? Era ter dinheiro e estabilidade? Que tipo de estabilidade, quanto de dinheiro? Os parâmetros mudaram, estagnaram, ou são eles nós mesmos, os mesmos e antigos e mal-humorados descendentes esperados durante nove longos meses, renascidos, mas apenas reprogramados, recauchutados, refeitos e resignados? Querer a normalidade é uma resignação ou um ato de fé em uma mudança? Quem quer a normalidade quer uma mudança, ou a mudança se estabelece dentro dos padrões de normalidade, tornando-se normal na medida em que é aceita? Querer a normalidade é querer mudar ou querer tudo como está? É ir à praia aos domingos, cinema no sábado à noite, é ir à escola, alfabetizar os filhos, crer em Deus, saber uma oração de cor e rezá-la automaticamente todas as noites? É isso a normalidade? Querer a normalidade é querer mudar-se para o campo se moramos na cidade e vice-versa? A normalidade é a volubilidade humana, ela mesma, fazendo rodar o mundo, fazendo-nos ter a impressão de que nada aconteceu já desta mesma maneira de agora, será ela, a própria normalidade, a mola mestra da ilusão de que está no nosso cerne apenas a reação e jamais a criação de nós mesmos a cada instante?

(Acabei de comer batatas. Quentes, pegando fogo. Tê-las na mão: uma agonia extrema. Mas olhava para elas resignado e crente de que são necessárias as batatas quentes, elas nos movem. Passamo-as adiante, é vero, mas antes disso elas tratam de queimar nossas mãos e deixar marcas muitas vezes indeléveis, marcas que geralmente escondemos quando cerramos o punho, mas que impreterivelmente teremos de mostrar à cartomante - ela mesma: essa vontade nossa de dedilhar o futuro em música mágica -, e encarar de frente que algo mudou, alterou-se em nós pela queimadura que esquentou o sangue, os miolos, e fez novas linhas da vida ressurgirem quase magicamente em novos traçados e novos e profundos sulcos internos.)

domingo, 16 de outubro de 2005

[sem ponteiros]

Não me culpes se as horas passam, se os dias já estão lá pra trás e a fila de outros dias já estão na frente, esperando que venham suas horas, seus minutos, seus segundos e seus milimétricos e imperceptíveis micro-instantes, não me culpes se as velhas horas já estão mortas, se nem os ponteiros já estão mais inteiros e se tens agora que chegar mais perto e usar a tua antiga e confiante matemática para desvendar o agora em que te encontras. Não me culpes dessa cronologia devassa, potente e irascível que tu mesmo criastes, o cronômetro cujo botão com teu dedo acionastes. A culpa não é minha, não é do tempo - posto que ele já jaz no sepulcro do deus Chronos - não é deste sol que se põe e da lua que muda de fases, a culpa, entenda, não mora em ninguém, mas se quiser, abrace-a com teus braços que já sentiram o futuro, mas se recuaram, ávidos para tocar teus próprios pisos quase subterrâneos que não marcam horas novas, mas velhas e repetidas horas de relógios tão antigos quanto essa tua vontade de pisar em chão de barro e pedra.

[leve (me)]

De tão leve a tua alma
Caí precipícios inteiros
Na crença de que eu, também, era leve.

Mas é que via as tuas asas, teus ossos ocos
E via-me neles, eu pena, tu pluma,
E me atirava, insano, de precipícios de um metro e meio.

Já distante de mim a tua alma,
Fui ao teste final,
Atirei-me no mais fundo dos precipícios

Não para ver do alto a tua leveza,
Mas para cair, morto,
Para além da tua própria tristeza.

sábado, 15 de outubro de 2005

[mimetiza-me]

Era um siri e a cor dele era de concha. Portanto, para mim, ou para qualquer outro que andava na praia àquela hora, não era um siri. Era uma concha.

Mas para quem andava e parava, e não só olhava, mas via, de fato, tinha o prazer de notar uma concha que andava – sim, por alguns segundos a fantasia toma conta (é que somos seres que amamos as fantasias) – e se movia pra lá e pra cá, só para depois, num susto de realidade, notar que ali estava um siri e não pedacinhos de areia que se grudaram há anos e que agora andavam de mãos dadas. A realidade era o siri. A fantasia era que ele apenas fingia-se de concha.

Quanto a ele, se mimetizava para proteger-se. É que havia bem próximo dele uma cabeça de peixe ainda sangrando. Um banquete. E ia e vinha - às vezes pegando carona em uma onda – e comia um pouco e levava um pouco consigo. Mas só estava seguro enquanto parava e parecia uma concha, e entregava a mim o prato da ilusão. Ele comendo o peixe, eu comendo a ilusão de que ele era concha. Quando se mexia, sua condição de ser vivo gritava aos meus olhos. Eu poderia tê-lo esganado, pisado, maltratado, ou dito a ele mil vezes que não se mexesse, que siri que se mexe perde a camuflagem, entrega-se em sua condição verdadeira e um dia vira carcaça que alimenta outros siris.

Mas preferi ficar calado. Porque tinha o peixe sangrando, e tinha o banquete, e tinha o espetáculo da vida ali na minha frente. Vida que por vezes se camufla, vida que por vezes abre-se em asas, ou afoga-se em oceanos ou poças de tão pouca água. Mas vida que sempre oferece a cabeça sangrando do peixe que já morreu, o banquete que alivia a fome e prepara pra outras camuflagens ou saídas livres por aí.

sexta-feira, 14 de outubro de 2005

[pela atenção, obrigado]

É com urgência urgentíssima que pede-se ao passageiros que ajeitem seus cintos, coloquem a coluna ereta, fechem os olhos e preparem-se para o vôo de suas vidas.

Os olhos fechados farão ver o que há dentro.

A coluna ereta fará sentir o eixo de tudo.

O restante, se dará na viagem, ao longo dela.

Haverá buracos, mas teremos a recompensa de lindas paisagens. Principalmente para os que se atreverem a olhar lá de cima. De olhos fechados, preferivelmente.

[be my guest]

É bem verdade que não é só de alegrias que é feita a vida, e que até mesmo nas mais grandiosas festas que damos para nós mesmos uma vez ou outra um drink mal bebido, ou um croquete passado, ou até mesmo um convidado indesejado aparece estragando tudo.
Mas isso é só as vezes.
Festas, em geral, estão destinadas mesmo é a celebrar essa alegria que a gente guarda aqui ó.

[i deserve it]



É que amanhã é dia do professor, e eu mereço passar a sexta inteira na praia.

Bom trabalho pra vocês.

[cada um tem a orientadora que merece]


... e eu sou muito feliz em ter essa orientadora aí.
(bilhetinho que veio acompanhado de 7 livros 'para ler durante o final de semana'.)

quarta-feira, 12 de outubro de 2005

[mais sobre a paz]

Pela paz é preciso mais que desarmar, esconder o dedo em riste, fazer uma bandeira branca, odiar George Bush, rezar para que Bin Laden arda no fogo dos infernos. Para promover a paz não basta votar sim ou votar não, não basta odiar Hitler, Stalin, Mussolini, não adianta ver filmes sobre o Holocausto e chorar.
Não adianta só isso. Pela paz, é preciso agir localmente e com suavidade, é preciso pensar e agir com clareza d'alma, sentir com verdade, amar de verdade, é preciso vestir-se de branco e dizer que torce para que somente por um dia só saiam coisas boas da boca, é preciso olhar o vizinho com outros olhos, esforçar-se para olhar para o alto quando tudo e todos vão contra você, é preciso escrever palavras de paz, recusar as maledicências, abraçar a lucidez, recobrar a consciência. É preciso o silêncio, pensar duas vezes antes de falar, de agir, é preciso uma greve de coisas inúteis, um olhar mais brando para a vida e para o outro, é preciso, se não entender, pelo menos saber que existem as causas e os efeitos, incluir-se no movimento da vida, parar de lamentar-se como se fôssemos vítimas de um mundo mau, ou de um Deus irônico e vingativo, e erguer-se para o som que ecoa em nós mesmos, impassível e grandiloqüente, alheio que é a toda a barulheira que faz lá fora. É preciso descobrir-se dentro da vida, dentro de um mundo que é nosso, pelo qual somos responsáveis imediatos, é preciso proteger alguém, deixar-se mais à toa, é preciso amar o mais difícil de ser amado, exercitar a paciência no trânsito, em casa, no ônibus, com os velhos, com os aprendizes, com os ignorantes, é preciso abraçar uma missão, um objetivo, ter um alvo altruísta, parar de olhar somente para o próprio umbigo. Pela paz é preciso olhar para frente, olhar-se para dentro, parar de esperar que venham de fora as soluções, é preciso entregar de volta à Fonte o que nos tem sido dado com tanta abundância, com tanta freqüência, com tanto amor.
É preciso reconhecer isso tudo, mas não é preciso erguer monumentos, nem gastar fortunas, nem usar a mídia, nem fazer um filme ou uma música. Não precisa tanto. Por excesso de vaidade e de exigências acabamos por nunca começar, acabamos por estagnar, parar, antes mesmo de dar o primeiro passo. Quando descobrimos que a paz se faz em um simples aperto de mão, ou no olhar de paciência com o irmão, descobrimo-nos capazes de já poder começar agora. Sem grandes obras, sem precisar ser santo ou reencarnar ainda mil vezes, dá pra ser agora mesmo, depois que você acabar de ler essa última letra, a letra z, onde termina a palavra que começa com p e tem no meio um a, a de agora-é-pra-valer.

PAZ.
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No LAMBE-LAMBE (ao lado)já tem fotos do aniversário do Diário Evolutivo.

terça-feira, 11 de outubro de 2005

[encontre teu gesto]

É pela paz que eu desisto, é pela paz que eu tantas vezes insisto, é pela paz que eu planto flores no meu canteiro, deixo em paz o vespeiro, pela paz eu não me acho, mas assino logo embaixo, pela paz que acendo incensos, pela paz que fecho os olhos e não penso, pela paz esses dois gritos imensos, pela paz eu sigo, paro, mudo, viro, pela paz eu escrevo, pela paz eu começo, pela paz eu recomeço e refaço o gesto, pela paz levanto os olhos, dou a face, pela paz não buzino, não corro, não morro, pela paz te desconheço, finjo que não vejo, pela paz pergunto teu nome, pela paz de onde és, pela paz pra onde vais, pela paz te quero ainda mais, pela paz te dou a mão, te dou um chão, pela paz entrego a arma, a munição, o coração, pela paz um lençol branco em nossas camas, pela paz, eu sei que é por ela que me chamas, pela paz me viro ao alto e viro santo, pela paz acendo a luz, pela paz te dou um trevo, um beijo, um sonho, pela paz eu tropeço, me engano, me despeço, pela paz corações no ar, pela paz dos nossos dias nada mais há, pela paz eu disse não, sim, vou, quero, abro, refaço, despedaço enfim, pela paz uma rosa, uma pomba, uma jarra, uma sonata, pela paz uma árvore, um verde, um nada, pela paz um sonho bom, um afago, um beijo doce, um abraço, pela paz eu vou-me embora, até logo, não chora, pela paz eu te mereço, mas te esqueço, pela paz uma mão se estende, uma barriga enche, um sonho a gente nunca entende, pela paz, a arte, a cura, a canção, o cheiro molhado de chão, pela paz um alô, um doutor, um amor, pela paz uma lista, uma pista, um som, um novo tom, pela paz durmo cedo, pela paz o meu silêncio, o meu tempo, o meu instante, pela paz eu vou mais longe, pela paz a tua paz, pela paz a minha alma jaz nesse poço de luz, e reluz em teus olhos, nessa tela branca, cor da paz, que te dou e peço que não guarde, mas espalhe por aí, pelas esquinas por onde andas.

segunda-feira, 10 de outubro de 2005

[águia no divã]

Ela voa alto, tem garras poderosas, um bico num formato perfeito para a predadora que é. Não desce das suas alturas por nada: age sempre calculadamente, e sua visão, por ser tão poderosa, lhe dá o privilégio de só descer à Terra quando tem certeza: seu risco é calculado, e só desce em busca de uma presa se for a presa certa. Uma águia não aceita um não como resposta, por isso, plaina, liga seus binóculos internos, reativa-os na superfície de sua retina e desce, mas só desce se for a vítima certa.

Ela é altiva, poderosa e sua visão lhe dá o ar de onipresença. Uma águia está em todos os lugares. Até os outros pássaros que vivem igualmente nas alturas, são seus observados. Ela é a grande observadora de tudo, ela observa e cada gesto que vê, cada passo, cada ida e retorno entram na sua memória como informação especial para seus próximos ataques. Por ser predadora, ela age coletando informações e prospectando possíveis vítimas.

Vive nas alturas, vive soberanamente nos topos de montanhas, aonde poucos vão, olha por vezes aviões no céu e é nessas horas que se reduz a uma insignificância que a incomoda. Os aviões são os únicos predadores da águia: eles forçam nela a humildade – que nenhuma águia possui – e fazem os imensos pássaros lembrarem que aquele motor soa mais alto que o grito estridente que dão para assustar e marcar seu território tão vasto. Mas os pesados e barulhentos aviões passam rápido como chegam, e as águias fatalmente esquecem que existem aviões e olham de novo para baixo, achando que vivem nos tetos dos céus.

A agonia de toda águia é saber da imensidão do mundo. Por ver tanto e de tão longe, ela se dá conta de que há um mundo vasto. O mundo vasto é o outro inimigo da águia. Ela sabe, pela grandeza do mundo, que sua onipresença é relativa e que ela não pode ver e controlar tudo. Nessas horas a águia gostaria de ser uma avestruz e poder enfiar a cabeça em um buraco imenso, onde estão apenas minhocas velhas e subterrâneas. Mas a águia não é avestruz e ela no fundo se ressente disso e recolhe-se no cume daquela montanha, onde não moram avestruzes e onde as minhocas não sobrevivem por falta de ar. No mundo das alturas, onde tudo é tão rarefeito, a águia permite-se fechar por um minuto seus poderosos olhos e sonhar, sonhar, sonhar... sonhar que é ser da terra e que ser águia devia ser uma tarefa de maior leveza.

domingo, 9 de outubro de 2005

[eu fui!]

[receita de chá]

Foi apenas um segundo para que o instante que há um minuto era nebuloso se transformasse em um instante iluminado. Para transformar um momento em que há neblina no ar em um momento onde de tanta luz há até desperdícios, basta que se tome um copo inteiro de um chá cujo nome esqueci, mas que faz em nós o mesmo efeito que fazem no ar as asas de uma borboleta: é como se o colorido já colocado em formas de mosaico se expandisse e desenhasse novos e etéreos mosaicos nessa atmosfera clara que depois respiramos inteira pelos pulmões.
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Uma idéia nova no ar: se tem um papo legal pra publicar, manda pra gente.

[outono é fall]


Dizem que quanto maior o tamanho, maior a queda.
Então, pois: abençôo as minhas quedas, por que sem elas eu não saberia o tamanho que tenho, ou que finjo ter, ou que acho que tenho. Na realidade, nem nós nem as alturas de onde caímos são menores ou maiores do que o tamanho que nós mesmos lhes oferecemos.

[cifras]

Virei negociante de declarações de amor. A partir de hoje, declaro-me capitalista inveterado e só troco as minhas palavras doces por dinheiro ou por outras declarações igualmente cheias de amor. Cansei de florir o mundo com essa seiva vermelho-sangue, cansei de beijar bocas sujas e sem lógica nem nome. Agora, as minhas palavras, as troco, sem troco, por outras belas palavras de significados igualmente profundos.

Perdôo se não houver poesia ou qualquer toque estilístico. Perdôo a ausência de acentos, vírgulas e principalmente de pontos finais. Valorizo apenas o conteúdo e a essência tão clara e dita como em frases de amor simplório.

[leite derramado]


De barriga vazia
Tomar um copo de leite gelado
É como mergulhar,
inteiro,
em um rio de água fria.

sábado, 8 de outubro de 2005

[mas é só uma vela]


“Ao distanciar-me, me aproximo mais ainda de mim mesmo. Quando crio incerteza, mergulho num infinito de possibilidades. Hoje é o meu primeiro post. Nem sei se levarei isso em frente, essa é uma das minhas incertezas...” ( Diário Evolutivo, 08/10/2004)

Pois se há os dias que passam, há um, dois, três, mil posts até. A cada dia, a cada hora, a cada minuto, um sentimento. Um azul, outro verde, outro amarelo, outro com cores tão estranhas que dão medo, outro incolor, quase sem vida. Há um computador, um programa chamado Word e há o blogspot, há você que lê e eu que escrevo, você que depois escreve e eu que depois leio. Ai há a vida lá fora, eu andando solto por aí e olhando o mundo de uma maneira e de outra, um significado ali, outro aqui, uma dor em mim e outra acolá, um amor que vem e outro que vai. Um cheiro, um som, e tudo depois tem de virar letra grudada uma na outra, tem de virar texto na medida em que eu vou apertando esses botõezinhos à minha frente. Vão passando os dias e a cada virada no calendário isso aqui vai enchendo e esvaziando feito pulmão. Muita gente vem e fica, outras vêm e não ficam e outras caem aqui acidentalmente perguntando que língua é essa que esse homem fala. Esses são os japoneses, ou até mesmo um de nós – me incluo – que lêem, mas não vêem nada. (quantas vezes nem eu mesmo me entendo o sentido?). Aí depois elas – as letrinhas - vão descendo, descendo e desaparecendo.
Um belo dia, você clica ali onde moram os mortos e se depara com cheiros, dores, medos e felicidades antigos, que nem mais lembrava, e vê que passam-se anos, passam-se horas, passam-se posts inteiros e a gente vai descobrindo que evolui, que a vida é na realidade um grande diário evolutivo onde escrevemos impressões que serão transformadas, revistas e refeitas junto com nós mesmos a cada instante. Descobre-se então que tudo passa, descobre até mesmo que já se passou um ano, já passamos nós mesmos, tão antigos que éramos em outubro de dois mil e quatro.
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Já sabe onde vamos comemorar? Olha aqui. (aos amigos de outros estados, fica meu cheiro e a vontade de comemorar com vocês também. Obrigado a todos pelo carinho)

[e há ainda mais]


Há mais de mim do que há aqui, apenas. Sou muito mais do que estas linhas dizem, linhas já mortas desde a hora em que foram fincadas, eleitas, no papel.

sexta-feira, 7 de outubro de 2005

[tem e faz]

Ter algo, alguém, nada, ninguém. Ter por ter, ter sem ter, ter e reter, ter e desfazer, ter sono, frio, mágoa, um amor, um desamor, ter uma ilusão, um sonho, uma cama, uma casa, um rio inteiro, um chão. Ter esperança e depois só desilusão. Ter e não ter mais, ter o que um dia não teve, ter de novo o que já teve, não ter mais, não precisar ter mais, ser antes de ter, e não ter que ter pra ser.

(Ter é amarrar-se, ter é possuir, ter é laço na terra, ter é possuir e se deixar possuir. Ter é a prisão.)

Fazer amor, fazer uma casa, fazer um filme. Fazer de conta, fazer às pressas, fazer para ter, ter e depois desfazer, fazer como fazem, desfazer o que fazem, fazer e refazer, fazer pra rever, fazer com, fazer sem, fazer por ti, fazer por mim, fazer só por fazer, só pelo simples prazer de fazer e depois, sem mais, desfazer.
(O fazer é categoria da criação, da ilusão.)
Fazer-se a si mesmo é fazer-se Ser.
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>>>Lembrando a todos que amanhã esse blog faz 1 ano e estaremos comemorando no Crepe da Cidade a partir das 20h<<<

[de novo os irmãos]


Me digam: dá pra parar de ouvir esses caras?

[Abre essa porta, que direito você tem de me privar
desse castelo que eu construí
pra te guardar de todo mau,
desse universo que eu desenhei pra nós ...
pra nós

Abre essa porta, não se faz de morta,
diz o que é que foi
Já que eu armei tudo pra ti,
já que eu cerquei tudo ao redor

Abre essa porta, vai, por favor,
que eu sou teu homem ... vil
que eu sou teu homem ... vil

- Cala esta boca que isso é coisa pouca
perto do que passei
Eu que lavei os seus lençóis sujos de tantas outras paixões,
que ignorei as outras muitas,
muitas

Vai, depois liga diz pra sua irmã passar
que eu vou mandar
tudo que é seu que tem aqui
tudo que eu não quero guardar
que é pra esquecer de uma só vez
que este castelo só me prendeu, viu?
Mas o universo hoje se expandiu
E aqui de dentro a porta se abriu]

(Marcelo Camelo)

quarta-feira, 5 de outubro de 2005

[é e está]

Estar triste, estar com fome, desesperado, alegre, sonolento, de bem com tudo, de mal com tudo, estar ao vento, por dentro, por fora, por entre, estar nervoso, horroroso, descrente, estar solteiro, casado, enrolado, nem um nem outro, mas muito bem encontrado, estar nu, vestido, estar em mim, estar em você, estar na sua voz e na sua idéia, estar assim, sem dó e sem mais nada para encantar, estar perto mas distante, estar distante num deserto, melhor até estar perto, estar no fim, no começo, no recomeço, estar mesmo assim que eu nem me conheço, me desconheço, me reconheço.

(O estar é categoria das transitoriedades.)

Ser feliz, ser um, ser único, ser eu mesmo, ser estável, ser o meu amor, ser eu mesmo o meu próprio amor, ser de fora, de dentro, ser por ser, ser sem ser, fingir estar sendo, ser um fingidor, ser inteiro, ser o oposto, ser sua verdade, ser mais, ser menos, ser por nada.

(Ser é o estado da permanência, onde terminam os trânsitos e começa a vida, é onde saem os passageiros e chegam os moradores.)

Estar é passar.

Ser é ficar.

[the inner sea]

Foi de vez que entrei no mar, desbravando sais dissolvidos, algas ainda vivas, outras já viúvas, mortas, e via meu velho barquinho ao longe, minha ilha flutuante, meu centro, meu pódio, meu trono. A cada braçada, a cada mergulho, mais distante ficava vertical e horizontalmente da terra firme, da terra que só terremotos desestabilizam. Entre o estável do chão que se pisa e o instável da fluida água e do barco, igualmente disperso, sobre ela, eu fiquei com o movediço, o móvel, o barco que flutua apesar de amarrado a mil pés por uma âncora robusta, e nele subi, eu mesmo etéreo e volúvel, em busca do ninar constante do mar e do ar que, davam-me dicas de sobrevivência meio a tempestades, quando a âncora sinaliza o deslize, anunciando momentos à deriva, sem rumo, sem nada adiante.

[a paixão segundo eu mesmo]




Fui vorazmente nela. Eu, ali, era o animal em busca da presa, e meus instintos diziam:

(o instinto fala perturbadora e imperceptivelmente)

mate, mas não coma, porque, definitivamente, não é de comer. Mas mate, mesmo que ela corra, mesmo que se encoste em cantos indevassáveis pelas quinas do tênis que agora está em suas mãos, mate-a. Mas não a coma, porque não é de comer. Ela, sim, pode te devorar pedaço por pedaço caso você vacile um segundo sequer. Portanto, lhe digo e repito: em um mínimo segundo, resolva a situação e mate-a. Repito: mate-a a sangue frio mesmo se necessário for. Apesar do medo que a faz correr, apesar de filha de Deus como você, ela, em um segundo, pode lhe dar o susto da sua vida. Reative-me - sou eu mesmo, o velho instinto primitivo que guarda há anos com toda força que você tem - e mate-a, irreparavelmente, para que ela não ouse mais retornar, não ouse mais te assustar em pesadelos ou em barulhos noturnos que só quem percebe é você mesmo, só quem crê é você mesmo. Eu não poderia fazer diferente disso: digo-te que mate, mate, mate, impiedosamente.
Vendo a barata morta ao chão, espedaçada, noto que era apenas uma velha, manca e caduca barata que tentou inutilmente correr, voar, encostar-se por entre as quinas enquanto ouvia o instinto que gritava - em palavras audíveis nessas horas somente às suas próprias vítimas -, e me subiram hormônios, me vi no tempo das cavernas, no tempo em que ainda se corria atrás da presa para destruí-la a pauladas e vi que no final das contas era apenas uma barata, uma velha barata que se perdera na escuridão da noite. Saíra para passear, talvez, no seu último ato instintivo.
E eu, de arma na mão, tremia, enojava-me, temia. E tudo por uma velha barata que agora nem sequer valia mais a pena, porque sua alma já subira aos céus ou descera aos infernos.

(eu e minhas baratas, meus instintos e minhas velhas recordações, eu e meu tênis sujo, velha arma para matar igualmente velhas baratas, eu e minha voz instintiva gritando aos meus ouvidos que é necessário, sim, exercitá-la, que não é só de sonhos em preto e branco que se vive, mas de sonhos com cores egóicas também, eu com minha velha criação de baratas mortas, velhas, despedaçadas, que já não dizem mais nada, não sentem mais nada, mas que aparecem, novas e surpreendentemente belas em sonhos antigos, eu com meu velho tênis na mão, tremendo, temendo, gritando nestas teclas pretas e velhas de idéias como as velhas e caducas baratas.)

segunda-feira, 3 de outubro de 2005

[os irmãos]


"E até quem me vê
lendo o jornal na fila do pão
sabe que eu te encontrei."






Tá chegando o dia do show dos caras!!! Quem vai? Não me canso de ouvir e cantar aqui, treinando pro corinho!

[vela]

E pode um pai esquecer do aniversário de seu próprio filho, ou trocar as datas? Digam sonoramente que não, não pode. OK, admito que fui pouco atento. Na realidade, o Diário Evolutivo faz um ano no próximo dia 8, sábado, e como minha mãe sempre ensinou que aniversários a gente deve sempre comemorar, estaremos lá no Crepe da Cidade (Rio Vermelho) na data, a partir das 20h, para trocar umas idéias.
Tá a fim?

domingo, 2 de outubro de 2005

[célebre, você]

Se você não crê, pare aqui mesmo, não continue. Falo sério: esse é para quem crê e crê de verdade. Não me pergunte em quê, porque quem pergunta em que acreditar na realidade não crê em nada mesmo, porque para crer de verdade é preciso um pouco de cegueira. Cegueira e fé, juntas, não deixam seus donos se baterem em postes nem caírem em buracos. Se por um lado a cegueira não nos deixa vê-los, por outro a fé nos guia pelos melhores caminhos. E assim, cegos e cheios de fé, percorremos longas distâncias.

Eu, por exemplo, acredito em anjos. Aliás, acredito em eventos que trazem pessoas do nada para nossa vida – exatamente como fazem os anjos. Do nada mesmo: pipocam à nossa frente e nem nos pedem referências. Nos colocam em suas vidas como reis ou rainhas, nos servem como súditos, e nos entregam em uma bandeja um sonho bom. De tão belas, chegam a ser etéricas, inacreditáveis. Quando isso acontece, é como se um sino tocasse em uma igrejinha distante, despertando as pessoas para o evento do dia, a celebração tão esperada, o momento de encontro com algo que só ressoa no ar, mas é muito verdadeira não porque é vista, mas porque é tocada pelo coração e pelos ouvidos.

E é por isso que não me canso de agradecer ao que não se vê, mas se sente, ao que não se ouve, mas ressoa na alma, ao que não se toca, mas faz estremecer por dentro. Muitas vezes é a irrealidade que nos salva. E ultimamente eu tenho preferido uma – possível - mentira bem contada a uma verdade mal dita.

[primeiro um oitavo de domingo, mas ainda é sábado]

Já entramos na terceira hora de um domingo que se insinua ensolarado pelo tanto de estrelas que vejo no céu. Mais uma vez o sábado invade o domingo e sei que só sentirei que é ele que está a postos quando amanhã eu abrir meus olhos sempre preguiçosos de manhã - ou tarde – de domingo. Certamente vou me deparar com uma luz intensa pela minha janela, olhar minhas flores que crescem e encostam-se nos tijolos de vidro com uma indiferença que me faz invejá-las: seja segunda, quarta ou domingo, para elas é o mesmo sol, a mesma matéria viva que lhes dá vida. Por isso se recostam com tanto fervor nas paredes transparentes que as separam do dia lá fora e de possíveis brisas que talvez até fizessem algumas delas caírem ao chão: o amanhã da beleza de toda flor é virar pó.

Eu não me recosto nos tijolos de vidro em busca de claridade, porque admito que temo os domingos em que apenas um feixe de luz entra pelo quarto. Para se viver um domingo em plenitude é preciso derrubar as paredes - mesmo que sejam feitas de vidro e deixem esse sol filtrado entrar - e sair sem roupas nem amarras, livre, buscando brisas que nos derrubem essas flores belas que carregamos sempre em sorrisos ou olhares que emanam cheiros, jogando-as ao chão e embelezando caminhos mesmo que por alguns dias, quando o colorido dessas nossas flores, pela falta que sentem de nós, se transforma em cor de cinza, retornando ao nada de onde vieram e de onde vêm todos os mesmos domingos que produzem tanta brisa e tanta luz.