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domingo, 31 de julho de 2005

No Porto


É que é fim de semana e hoje teve tarde de sábado de brisa suave e céu azul. Como eu sou baiano e tenho, me desculpem, o privilégio de ir à praia no inverno, fui deitar embaixo desse céu azul para limpar a alma...
Namasté...

sexta-feira, 29 de julho de 2005

Um mantra inspirado em você

Te desejo boa sorte na conversa com seu chefe, ou quem quer que seja superior a você de fato, ou insista na ilusão da superioridade, boa sorte na conversa com seus botões, boa sorte na hora de fazer suas escolhas, por menores que sejam, por mais tímidas e inúteis que pareçam. Desejo boa sorte quando for atravessar a rua, pôr no prato a comida do dia, fazer um telefonema, olhar nos olhos de quem você deve ou de quem te deve, boa sorte na hora de andar para não sujar os pés e os sentidos com inutilidades, boa sorte na escolha da atitude e gestos certos, na escolha da palavra-mãe, boa sorte na hora de fechar os olhos - que seja um arco-íris o que te espera - , te desejo boa sorte com a cartomante, que venham boas cartas e boas interpretações, boa sorte com seu pai, sua mãe, seus irmãos e seus filhos, boa sorte com o médico, que ele olhe nos teus olhos e veja uma íris saudável, descomprometida cada vez mais com o peso do mundo, te desejo boa sorte na hora de cozinhar, na dosagem do tempero no almoço e no amor, no beijo e na dor, te desejo boa sorte quando for dividir uma saudade, um gesto, uma impressão. Te desejo boa sorte na hora de lançar seus foguetes, partir rumo a novos rumos, sorte na escolha do seu amor, sorte no primeiro toque, no primeiro amasso, na primeira noite de entrega, sorte na escolha das suas trilhas sonoras, da cadeira que vai sentar no cinema, do gesto que vai escolher ao partir para longe, te desejo boa sorte na hora de abraçar um plano, uma idéia, uma novidade, boa sorte para manter-se firme no seu propósito, convicto de suas verdades, simples nas suas intenções. Boa sorte na hora de escolher um nome, batizar um filho, apadrinhar um amigo, recolher um gesto, apontar para alguém, boa sorte na hora de anotar o nome, o número, a placa, a cor. Boa sorte na hora de ver o outro, distinguir o bom, intuir um segredo escuro, boa sorte na hora de entregar-se ao mundo, lançar-se no beco, encontrar a saída, vagar suave sem destino, escolher um amigo. Boa sorte na hora de elogiar, de dizer eu te amo, de olhar no olho, de dar mais do que tem, de ser todo e inteiro. Boa sorte na hora de ouvir uma crítica, de construir um mundo novo, boa sorte na hora de fazer o desenho, pular o muro, mirar uma estrela, subir nas nuvens, escolher o mais colorido dos chapéus, aquele que vai fazer irradiar com a maior clareza a sua felicidade, comprido de tocar o mundo mais alto de todos, aquele que vai te dar o disfarce perfeito, figa na mão, fitas do Bomfim no pulso, pé de coelho, ferraduras. Boa sorte na escolha da sua sorte, seu caminho, sua fonte. Boa sorte, principalmente, na hora de tocar-se inteiro, olhar pra dentro, centrar-se na Verdade, que é a Sorte em estado puro, abundante, toda, inteira sua.

quinta-feira, 28 de julho de 2005

Fafá, os gestos e os gritos

Não há como dizer que Fafá não é uma grande cantora, mas ela grita. E muito. Só não doem os ouvidos porque ela grita afinado, como convém a uma cantora com a sua história – trinta anos, comemorados com esse show em que homenageia a obra de Chico Buarque de Hollanda. Mas Fafá é alegria pura, simpatia, entrosamento político. Me lembro muito bem dela sentada em frente ao piano, chorando e cantando o Hino Nacional, meados dos anos 80, quando Tancredo Neves se foi e, com ele, – era esse o nosso medo - o sonho primeiro de uma democracia. Fafá sempre demonstrou essa alegria imensa, materializada na sua risada solta, gostosa de ouvir, mas ontem não acho que ela tenha conseguido encantar 100%. Pelo menos, não a amantes de Chico como nós (né, Buruco?). Ela mesma disse, no início ainda do espetáculo, que Chico era “simples e exato, o sonho de qualquer intérprete”. Fafá não é simples, nem exata. Ela é emoção aos gritos. Técnica, na maioria das vezes, é bem verdade, afinada, acho eu, com meu mero conhecimento de leigo, mas a música de Chico certamente não foi feita para ser interpretada, em alguns momentos, com tantos gestos óbvios (‘deixe em paz meu coração, que ele é um copo até aqui – gesto: mão direita na testa, formando um ângulo de 90º - de mágoa” ou “quando me cobiçou sem querer acertou na cabeça” – gesto: apontando para a cabeça com dedo indicador em riste), nem com tanta dança de salão – sim, ela deve ter tomado umas aulinhas, e não perdeu a chance de pô-las em prática ontem. Vamos concordar que ‘Gota D’Água’ não foi feita para ser dançada nem tão pouco interpretada aos passos de dança de salão, não é pessoal?

No mais, foi é divertido mesmo. Fui, sabendo o que me esperava – ou quase, admito. Ela é inegavelmente uma das nossas grandes cantoras e conseguiu, sim, me emocionar, principalmente quando cantou ‘Tanto Mar’ e ‘Angélica’, revivendo a Fafá politizada que ainda faz tanto sucesso no nosso imaginário. E fica uma idéia: quem sabe um show tipo “Fafá canta o Chico político” não fosse uma luva nas mãos dela?

(Cruzou-me os oceanos, cruzou-me os sentidos dormentes de sono, cruzou a perna, em peso quente, sobre mim, abriu-me a porta pela manhã deixando uma luz embriagante entrar pela proteção ínfima das minhas pálpebras, via a luz, sim, eu via. Banhando-se por completo, voltou com um beijo, outro sorriso e mais outro. Não sabia ainda se já estava acordado, se era tudo onirismo, lirismo dos sonhos, não sabia. Pôs a camisa das quintas-feiras, no punho os documentos importantes que lhe davam um nome e entrou na minha carruagem e partimos, afoitos para conhecer mais um dia.)

quarta-feira, 27 de julho de 2005

Bem

Eu estaria bem, sim, mesmo que se partisse em pedaços esse mundo que me dá um chão e um céu estrelado, estaria bem assim, como estou hoje, mesmo se me fugissem, por completo, as palavras que prezo tanto e que são a mais importante ligação minha com o mundo, eu estaria bem, mesmo se a inspiração me faltasse, se me faltasse, com mais freqüência, o chão que piso e às vezes me deito, e se mais vezes durante o dia eu tivesse que ouvir uma voz muda dizer o meu nome.

Estaria bem se perdesse um, dois dias de sol e praia cheia, se perdesse um céu estrelado e tivesse de viver dentro da escuridão de uma noite, estaria bem, mesmo se me chegassem notícias tuas com atrasos de um ano, mesmo se batessem à minha porta à meia-noite, tirando o meu sono, mesmo se meu coração disparasse com qualquer carro que buzinasse à minha frente. Sim, eu mesmo assim estaria bem.

Estaria bem e intacto, mesmo se não tivesse um dólar para comprar um sonho, um ar para dar um espirro, um dedo para apontar o caminho através das estrelas. Estaria bem, mesmo se me dissesses a mentira para a qual sou surdo, mesmo se desfizessem em pó as palavras lindas que ouço de ti, mesmo se meus monstros guardados por trás da cortina verde resolvessem gritar. Estaria bem, mesmo que não me ligasses ao meio-dia, mesmo se de tua voz viesse um sonoro e automático não, mesmo se tirassem da fotografia a paisagem, eu estaria bem. Eu estaria bem se não houvesse os risos, os riscos, os cheiros, os barulhos, os gestos, as crenças, as vontades e as saudades que me partem em dois a cada dois dias, eu estaria bem mesmo com o interrogatório e as mentiras, estaria bem na ausência do poder declarado, do poder acabrunhado, do poder de cima do muro, que não sabe se vai ou se vem.

Estaria bem sem ti, mesmo longe e suspenso no ar, mesmo me entregando na bandeja o mínimo do que tens, estaria bem, sim, bem porque sei de onde é que vem o fluxo desta paz inexorável, desmedida, de fonte pura e incessante. Tenho as chaves do cofre onde mora a fonte de onde jorra essa energia que sentes. Mesmo na falência de tudo, mesmo se tudo faltasse, mesmo se tudo que quase tive escorresse, num oceano, por entre estas brechas de sonho que ainda deixo ao acordar, mesmo perdido na floresta negra e entregue aos uivos dos pássaros, mesmo entregue ao fluxo dessa água que me leva para-onde-nem-sei, mesmo preso, que fosse, num mundo onde não se visse a cor azul, permanece aqui, grudada aos meus dedos frios e finos a chave que abre o coração de onde jorra esse brilho que sai dos meus olhos e cruza com os teus.

Tenho tanto, que dá para mim e pra ti.

terça-feira, 26 de julho de 2005

Dia da avó

Ela já não está mais nesse mundo de cá. Não está mais tão próxima materialmente, deixou de ser vista há três anos, quase. Mas ela está tão viva em mim, mas tão viva, com aquela voz doce, suave aos meus ouvidos, que não posso negar que ela existe com muita força, viva como nunca esteve, no meu coração.
Um beijo doce, minha vó Mana.

Uma oração

E quem quiser que não acredite que existe uma força maior, uma força que protege. Tenho descoberto que desconfortos que sinto com relação a lugares, pessoas, coisas, aqueles desconfortos que não têm explicação aparente, geralmente estão ali para alertar-me de que algo está errado.

Muitas pessoas que cruzaram a minha vida e que eu não conseguia olhar nos olhos, ou me sentia desconfortável na presença, demonstraram-se, no futuro, como pessoas com falhas grandes de caráter. Falhas pequenas, normais a (quase) todos nós, são aceitáveis, comuns, coisas contra as quais nós lutamos diariamente e que acabam sendo vencidas com o tempo. Mas aqui estou falando de falhas grandes, daquelas que prejudicam o outro, destróem vidas, causam desarmonias, geram carmas imensos e, infelizmente, muito sofrimento para os autores.
(...)

Quero agradecer a Deus pela minha intuição, pedir que me aumente a consciência e a proteção, agradecer pelas pessoas boas e nem tão boas que cruzam o meu caminho e, acima de tudo, pedir a Deus por elas.

Hoje, eu prefiro o silêncio. Nele, quero encontrar a confiança de que o mundo está repleto de bondade e que estas coisas ‘menores’ são passageiras.

Silêncio, por favor, e muita paz.

Namasté.

domingo, 24 de julho de 2005

Spiegel


É uma parede cheia de reflexos, todos eles eu.

Entrei no quarto disperso, ausente de mim, vendo o chão, parede e teto que me sobrevoava. Ausente de mim, longe da minha pele, dos meus sentidos, longe do toque abafado da minha carne que vive, crua, sob a minha fina camada de epiderme. Longe dos meus sentidos, dos meus órgãos viscerais, aqueles roncos surdos, aula de anatomia. Longe do que não se via, tão perto e tão longe por não ser visto. Estava incluído eu no mundo, estava eu, incluído naquela cortina espessa que me separava do quarto cheio de espelhos, vendo-me, nu, em cada um deles. Cada um uma moldura, em cada um, um gesto meu diferente, todos pasmos, surpresos, relatados: eu várias vezes repetido, eu várias vezes gesto repetido, onde quer que eu fosse, um fosso e eu, incólume do lado de cá, antes do reflexo duro meu no espelho.

sexta-feira, 22 de julho de 2005

Tentando ser feliz (e te fazer feliz)

Eu tou tentando
(Kid Abelha no CD Pega Vida, Faixa 1)
Eu tou tentando largar o cigarro/Eu tou tentando remar meu barco/Eu tou tentando armar um barraco/Eu tou tentando não cair no buraco/Eu tou tentando tirar o atraso/Eu tou tentando te dar um abraço/Eu tou penando pra driblar o fracasso/Eu tou brigando pra enfrentar o cagaço/Eu tou tentando ser brasileiro/Eu tou tentando saber o que é isso/Eu tou tentando ficar com Deus/Eu tou tentando que ele fique comigo/Eu tou fincando meus pés no chão/Eu tou tentando ganhar um milhão/Eu tou tentando ter mais culhão/Eu tou treinando pra ser campeão/Eu tou tentando ser feliz/Eu tou tentando te fazer feliz/Eu tou tentando entrar em forma/Eu tou tentando enganar a morte/Eu tou tentando ser atuante/Eu tou tentando ser boa amante/Eu tou tentando criar meu filho/Eu tou tentando fazer meu filme/Eu tou chutando pra marcar um gol/Eu tou vivendo de roquenrol
(o que anda tocando sem parar na minha vitrola)


Estar tentando é estar em um processo, é ser humilde para dizer que ainda não chegou ao fim, é ser esperançoso, também porque o fim ainda não chegou. Estar tentando é estar mobilizado, geralmente com alguém mais que partilha o mesmo ideal, a mesma causa, o mesmo sonho. Estar tentando é estar engajado, é não ter desistido, é estar no processo de encontrar soluções.

Estar tentando é respirar. Toda respiração é uma tentativa de ser manter vivo. Estar tentando é estar vivo. Estar tentando é andar rumo ao desconhecido, ou ao velho conhecido, é ter um foco e não desprezá-lo por nada, é dar valor ao que se sente, ao que se tem (ou quase tem) e ao que se quer, pela perseverança com que se luta. Estar tentando, acima de tudo, é ter uma idéia boa na cabeça, uma crença no possível ou impossível, é não se intimidar com o som de um ‘não’, é não desligar a televisão e achar que tudo já acabou.

Estar tentando é acordar cedo disposto a refazer os métodos, descobrir caminhos, recontar segredos e negociar com o ar que se respira. Estar tentando é escolher com delicadeza um caminho entre muitos, é saber que há sempre caminhos, entre muitos, a ser escolhidos.

Estar tentando é abrir os olhos e fechá-los na hora certa, num gesto de aceitação, mas não de alienação. Estar tentando é trabalhar, é lutar contra nós mesmos, é perguntar sempre o que o amor faria naquele momento. Estar tentando é escrever um blog todos os dias, negando-se a acreditar que novas idéias não mais virão, é estar disposto a mais uma vez respirar e ouvir, é tirar a nuvem dos olhos e tentar ver uma situação angustiante por outro prisma. Estar tentando é fazer as pazes com os dias de luz suave e com nossos sonhos .

Eu tou tentando. E você?

quinta-feira, 21 de julho de 2005

Ida ao porão

De quando em vez tenho de passar para trás da cortina verde que separa o mundo dos ponteiros ligeiros do meu relógio do mundo das horas paradas, estagnadas. Para além da cortina verde, verde-bandeira, verde-esperança, estão sonhos guardados, estão livros imensos, lidos, relidos, nem lidos, estão objetos do meu consumo, hoje empoeirados, esquecidos, renegados à condição última do caixote e do pó. Dignos, alguns, de serem ressuscitados, de serem postos de novo frente à luz que, por serem inanimados, ainda acham que parou de brilhar de uma vez. Retirei meus livros da caixa, estes precisam da luz e de olhos e de gente para viverem, me doía a alma sabê-los enterrados, tristes, longe. Minha relação com os livros – não os meus, porque livros não são de ninguém, mas os livros que vivem comigo - é uma relação táctil. Tê-los é tocá-los, tê-los é sabê-los ao alcance imediato das mãos. Tê-los é poder compartilhá-los com quem eu amo. Compartilhá-los por amá-los.

Atrás da cortina continuam os seres inanimados, continua o que há de velho em mim, ou que precisa estar estanque, numa cela escura, a solitária. Estão lá não por erros cometidos, mas por pura necessidade de reclusão. Deixo os empoeirados naquele canto, pois sei que, com um sopro, posso tirar-lhes a poeira morta que jaz em seus corpos e trazê-los de volta à vida.

Sempre que preciso cruzar a fronteira para o mundo das caixas empoeiradas e das horas mortas, volto diferente, tomado pelo mofo, pelo velho, pela escuridão que existe lá dentro do meu improvisado porão. Espirro e me bato todo no chão, expurgando o cheiro do inerte, do parado. Consola-me a força dos meus pulmões, a água que ainda existe abundante, o sol que reduz o ácaro ao pó de que ele mesmo se alimenta. Consola-me, nessas horas, onde vago, cego, por trás das cortinas verdes, a minha coragem de ir lá, respirar o velho e expirar, aqui do lado de fora, onde o tempo passa, um ar novo, filtrado pelos meus possantes e pulsantes pulmões.

quarta-feira, 20 de julho de 2005

Dia do Amigo

Eu quero um amigo que seja o brilho nos meus olhos, que seja o momento exato que o ponteiro toca a hora da felicidade, quero um amigo que tenha três ouvidos, duas bocas, mil braços para me abraçar, quero um amigo que tenha carro, carroça, carrinho de mão, que beba o que eu bebo, que coma do que eu como, que me dê o presente de me ver como eu sou e não como eu quero ser visto. Quero um amigo que sente à mesa de um bar, que estoure champanhe comigo em uma noite nada especial de terça-feira, amigo que vibre na minha alegria e vibre, por nós dois, na tristeza, quero amigo bom de coração, bom de alma, quero amigo que de longe está perto, amigo de mau humor que sorri, amigo que liga às três da manhã pra chorar, quero amigo que vem de Minas, quero amigo que mora no Rio, que mora em Londres, quero amigo da Rainha, quero amigo foragido, mal-entendido, quero amigo que quer ver meu mundo, quer saber qual a minha música, quer saber como foi o filme e sobre o que eu ando pensando. Quero amigo de quem eu possa aprender a ser amigo. Quero amigo que me diga o inverso do que penso, amigo que me chame pra tomar sopa, que me apresente uma novidade fresquinha do mundo. Quero amigo que me dê de presente um chiclete, que arranque de mim segredos esquecidos, que me ensine a fazer de conta, que me deseje um caminhão de prêmios de amor. Quero amigo pra banho de piscina na noite escura, passeio de cavalo sem cela, banho pelado na praia deserta, amigo pra dividir a conta, pra pagar a conta, que ria do que rio, que cruze comigo o rio, que diga que vem, que diga que não vem, amigo que quer meu bem. Quero amigo que sonhe com nuvens, que me conte, chorando, o pesadelo, que plante girassóis, que colecione espelhos, amigo que goste do arco-íris, que me olhe na íris, amigo pra madrugada, que curta olhar pra o nada, amigo que curta o inverno e o verão, amigo que me apresenta a mãe, o pai e o irmão. Amigo que não me cobre o que devo, que me cubra quando estremeço, que me ache em um palheiro, que me ensine sobre velhas coisas. Quero amigo que faz dedicatória, que me dedica um dia inteiro, amigo que me empresta o carro, amigo a quem não temo emprestar o carro, quero amigo que dorme em lençol branco e encosta a cabeça feliz no travesseiro, quero amigo que lê Clarice, que chora com Quintana, amigo que se apaixona em instantes e desapaixona muito antes, quero amigo bege, branco, preto, amigo que ouve Chico, quero amigo que lê e chora, e até o que vem mas não demora. Quero amigo virtual, do mundo real, amigo-tornozelo, que pega no pé o dia inteiro, amigo-ar, daqueles que deixa levar...

(E se deixe levar por aí, quem sabe viver não seja apenas isso: ter um amigo, ser um amigo, pegar na mão de alguém e escrever juntos um plano de vôo…)

terça-feira, 19 de julho de 2005

Contra a maré

Não quero ser coesivo nem coerente, não quero minhas frases nem meus ideais ligados por marcadores de discursos, conectores, referentes. Exófora, endófora, anáforas, catáforas: tô fora. Não quero que você me leia e aqui descubra-se, não quero o que está no manual da sintaxe, nem no da semântica, nem em nenhum dos manuais que existem. Não quero frases conectadas em busca de um script, não quero meu texto lido em goles curtos, mas em goles imensos, despaçados (quero o neologismo), despedaçados, não quero te dar um significado, quero o Aurélio como inimigo, não quero saber dos teóricos nem de suas práticas, ando cansado das citações entre aspas, das referências milimétricas, não quero que me referenciem nem me reverenciem, quero dar ao mundo a ausência da linguagem, da palavra, já que dizem que a linguagem surge somente quando nos entendemos mutuamente. Não sei quem disse isso, mas não dou a mínima, porque não quero referências, já disse.

Quero essa metalinguagem, quero o intertexto cruel, o texto que parte do todo e gera um nada incompreensível a muitos, quero essa imbricação sem ética, essa junção desesperada de coisas, quero texto de Clarice sem substratos últimos, sem it’s. Leminsky redundante, Cecília sem rimas etéricas, Hilst sem palavras de força, quero Pessoa, corajoso, aqui, sem heterônimos, Saramago em períodos curtos, Ubaldo sem Bahia, Nelson Rodrigues sem subúrbio, Graciliano sem o Nordeste, Amado sem o Candomblé, Lobato sem Emília. Quero ver essa troca, atrapalhar os teóricos, fazê-los reverem tratados. Ando cansado dos academicismos, cansado de mim mesmo tentando entender estas composições onde não há palavras leves como ‘amor’ e ‘luz’.

Quero não ter temas e começar minhas linhas sem o desespero do meu despreparo, da minha angústia. Quero construir o texto que vem de dentro e não o que sai dos livros e compêndios que me deram às mãos com prazos exíguos para serem devorados, o que quero devorar mesmo é o it de Clarice, a simplicidade de Leminsky, as rimas suaves de Cecília, os longos períodos de Saramago, a Bahia de Ubaldo, pisar na teoria, dar um tiro nas enciclopédias, compêndios, escritos de anos.

segunda-feira, 18 de julho de 2005

De trás pra frente

Teve o show de Kid Abelha, que foi o último evento do final de semana, teve o show com Paula Toller exuberante, mais madura e mais simpática também. Teve as baladas dos anos oitenta, teve eu enchendo os olhos de lágrima ouvindo uma música lá que diz que nada sei. Teve domingo com noite de muita estrela, de céu infinitamente azul, de brisa suave, de sol morno, dia sem suor escorrendo no corpo. Mas antes desse domingo teve Clarice aqui em casa, vinho seco e suave, sempre tinto, mesa repleta de pão da Perini, frios e bons amigos à luz de velas. Teve eu, intimidado com tanta riqueza na obra de Clarice, teve eu, lá em cima no tablado, naquele lugar onde eu já disse que estou mais próximo das estrelas, lendo “Medo da Eternidade” e aquele texto em que ela descreve flor por flor. Teve eu descobrindo que gostamos, os dois, das tulipas. Teve Tom com seu humor sempre delicioso, teve cerveja gelada, geléia, vela. Teve amigo que disse que vinha e não veio porque queria um lugar onde pudesse beijar na boca. Teve de tudo, até blog da Regina lido em voz alta e dor na barriga de tanto rir. Mas antes mesmo teve feijoada, cinema, sopa de feijão verde e torradas, emoção e olho cheio de lágrima por qualquer coisa, teve isso, sim, mas não sei dizer por quê teve. Às vezes sou assim, emotivo. Na sexta teve tempo frio, e teatro no UEC, depois Pelourinho e carpaccio e conversa profunda, teve início de gripe, e meio rolo de papel higiênico no lixo, teve isso e teve aquilo, teve reencontro com amigo distante, posto de gasolina às três da manha. Até isso teve.
E agora tem segunda, e depois terça, porque segunda sempre tem, por mais que ponhamos o calendário no fogo, ela sempre vem. Renovando, na preguiça, as coisas que a vida tem.

:::

O que vale mais a pena:

Sonhar o mesmo sonho (quase) impossível a dois, ou sonhar cada um um sonho diferente e mutuamente incompatíveis, mas possíveis?

sábado, 16 de julho de 2005

Sobre as faltas

Mas se há o amor, o que mais falta?

sexta-feira, 15 de julho de 2005

Eu no papel duzentas vezes

"Para ser grande, sê inteiro. Nada teu exagera ou exclui." (Fernando Pessoa)
Sou feito de diversas faces. Sou a composição de recortes minúsculos, milimétricos, diversas facetas, eu mesmo repetido duzentas vezes em um papel. Sou feito de cores, mas me apresento nessa representação gráfica e momentânea de mim, que vocês vêem acima, em preto, branco e em seus tons intermediários. Mostro as minhas cores, junto com as minhas diversas facetas, para poucos. Não sei se privilegiados ou torturados, mas minhas cores estão à disposição de poucos.

Faço caras e bocas, olho de soslaio, olho direto nos olhos, estou por vezes nu, por vezes sou eu mesmo que desnudo o objeto à minha frente . Em alguns momentos caem sombras sobre mim, mas junto-me a elas, na fotografia, precavendo-me: é melhor juntar-se ao inimigo do que tê-lo morto, ou à distância. Muitas vezes ponho, eu mesmo, a sombra à minha frente, em mais uma tirada estratégica: a sombra, em oposição com a luz, gera um conflito em que sobressai a luminosidade - aqui, o opositor dando armas ao inimigo.

Por momentos respiro, e deixo que vejam meu ato involuntário no olhar. Outras vezes, a minha respiração é apenas um gesto involuntário que me fazem voar levemente os pêlos à frente do nariz. Gesto meu, invisível, como tantos outros, que você não vê e não toca.

Sou um geminiano, uma composição, uma obra cubista, pedaços de mim na calçada, na sua tela. Olhos, nariz, boca, orelhas, quase tudo no singular. Meu coração, que não vês, também no singular. Seu pulsar, invisível, também.
De plural, só eu mesmo e essas minhas mil faces em tons de cinza.
:::
Boa sexta!

Namasté.

quinta-feira, 14 de julho de 2005

Mãos dadas


(texto que fiz de encomenda ... leiam e dêem-me as suas apreciações...)
Ser parceiro é olhar o mesmo horizonte, é compartilhar planos e objetivos idênticos. Ser parceiro é dar as mãos, numa metáfora, ou em um ato físico mesmo, em que você levanta o outro e, automaticamente, levanta-se junto, por perceber que o parceiro é a força que você precisa para alavancar a sim mesmo. Ser parceiro é entender que o mundo, hoje, movimenta-se mais e melhor porque um dia alguém entendeu que não há sucesso sem o outro, não há sucesso sem essa mão estendida, sem esse gesto de gratidão e de abertura para a ajuda e o crescimento mútuo. Ser parceiro é entender que a parceria que vale a pena mesmo é aquela em que os dois lados ganham, e por isso vale a pena estar junto. Ser parceiro é descobrir que não haveria tanto a ganhar se o parceiro não estivesse ali, oferecendo-lhe os ombros. Ter um parceiro é demonstrar-se humilde, porque só quem procura por parceiros sabe que ninguém pode nada sozinho e que a união, como já foi dito e repetido, é que faz a verdadeira força.

Se você ainda duvida que a parceira é a ação mais inteligente para quem quer alcançar o sucesso, observe exemplos natureza: o boi cheio de carrapatos e o bem-te-vi que se alimenta do inseto que poderia matar o gado, os corais, em uma colônia em perfeita harmonia, como a das abelhas, trabalhadoras incansáveis e organizadas, as árvores centenárias e as epífitas, como as orquídeas e as bromélias, que no tronco dessas árvores podem receber mais luz do sol, o crocodilo e o pássaro-palito, que retira da boca do primeiro parasitas que podiam causar-lhe mal, as anêmonas-do-mar e o peixe palhaço (foto) e por aí vai. Mais uma vez a Natureza, o Sistema Perfeito ensinando lições aos olhos mais sensíveis.

Ser parceiro é entender dessas coisas, ser parceiro é ser gentil com quem te bate à porta, num pedido de ajuda. Ajudar, nessa hora, é descobrir a essência do sistema de harmonia do universo: para se viver bem no nosso mundo hoje, necessitamos do outro, da diversidade, de olhares diferenciados sob o mesmo ponto a ser observado, porque é daí que surgem idéias, oportunidades, e novos horizontes a serem trilhados de mãos dadas.

quarta-feira, 13 de julho de 2005

Leve-me


(agarre-se forte no chão,
prenda a respiração,
depois entregue-se leve ao dia,
que é hora de se deixar levar pela poesia)

É de leve que se chega,
sopro roçando surdos ouvidos.

É de leve que penetra
Dó, ré, mi, fá, thi, lé, vi

É de leve que se ouve,
que se enxerga, que se vê.
Olhos: verve.

É do alto que vem
A lava
Que desce.

É de leve que se chega,
rastros mudos,
gafanhoto em caule verde.

É de leve que se sopra,
vento tímido.

É de leve que se sobe,
Passos lentos de pantufas:
Chão que brilha.

É de leve que se banha,
água rasa, pés molhados.

É de leve que se molha,
que se esvai,
que se entrega.

É nessa leva que se vão,
dias cheios,
noites cheias,
pés de cobre.

É de leve que se vive,
é de leve que se exprime,
sublime,
suave: redime.

É a leveza que me leva,
lava,
banha a alma que vaga, leve.

É de leve que se morre,
que se escorre,
morto, leve: releve.

É de pluma que se leva, leve, lebre, rápida, leve-me

É num sonho que te levo,
- Por favor: leve-me.


:::


Obrigado pela participação intensa na enquete. O quase-incêndio realmente ocorreu. Não foi imaginação minha, nem tão pouco o relato de uma noite ardente...
Namasté e felicidades, que hoje é quarta, dia de dormir de costela na costela, porque não sou de ferro!


terça-feira, 12 de julho de 2005

Notícias das flores




"Tuas mãos, um espelho.
Minha pele
(um corpo inteiro):
meu irmão gêmeo,
idêntico,
nas tuas palmas."
As flores que me espreitam no meu jardim, novas habitantes do meu banho, passaram por uma fase de dificuldades. Adaptar-se à nova vida é difícil por vezes. Nova terra, novos ares, novo admirador, novos adubos e novas essências a lhes subir pelas raízes, tudo ao mesmo tempo. É apenas normal que lhes caiam todas as folhas, e eu, que tenho tentado tanto entender sobre as mudanças, busco a paciência e a resignação necessárias para vê-las florirem de novo: primeiro as folhas mais verdes, em um verde tímido – gotas leves de esperança -, depois os botões e, por fim – mas não que esse seja exatamente o fim -, as flores.

Como elas ainda muito novas perderam tudo o que lhes crescia no caule, não pude guardar na memória exatamente que cor de flores cada uma fazia desabrochar. Isso, contudo, criou em mim uma curiosidade imensa, a ponto de querer não só falar com elas, mas ouvir delas a resposta para a minha pergunta de curiosidade infantil:

- Qual a cor da flor que tu és? – perguntei a cada uma delas, só caule, quase despidas à minha frente. Não responderam. Acho até que se sentiram insultadas com tamanha displicência minha.

Passaram-se alguns dias e, flores desabrochadas, relembrei, com a íris iluminada e em tons avermelhados que vinham do reflexos dos botões em flor, que minhas amigas são da cor vermelha e rosa. Duas delas. Porque uma, ainda tímida, não se revelou, e a outra, não sei ainda, mas parece que não conseguirá mais gerar flores. As mudanças, muitas vezes, fazem morrer.

Jardim florindo, eu, egoísta, ainda queria mais: é que elas, com o tempo, inclinaram-se em direção ao sol. Eu, egoísta, preferiria que elas se inclinassem em direção a mim. Mas tenho de entender que minhas palavras e meu olhar admirado não bastam para fazê-las florir, e entendo, resignado, que para se ter acesso à beleza das flores, temos que deixá-las seguir adiante, na direção do sol.

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Prometo postar aqui fotos das minhas flores. Ainda não: são vaidosas e odiariam sair semi-nuas em fotos na net.

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ENQUETE:

O post anterior, ‘Burn’, relata um ‘incêndio’. Como o interpretou?

a) como uma metáfora.
b) como uma narração de um fato ocorrido
c) como uma narração proveniente da imaginação fértil do autor.
d) Outra? _________________________________

Resposta amanhã. Obrigado pelo carinho!!

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Me chame no ORKUT.

domingo, 10 de julho de 2005

Burn

Se soubesses o bem que me fazes quando acaricias o meu corpo no amanhecer, com estas tuas mãos de espelho, que refletem, em contraste, eu em ti e vice-versa, se soubesses como o calor que vem delas me aquece, e como o frio se vai, temeroso, tu me acariciarias mais e mais vezes nessas manhãs tão frias. Se soubesses o quanto estremeço ao toque teu no nosso ninho de caras amassadas, risos interrompidos até o primeiro banho, edredon embaralhado entre nossos corpos, se tu soubesses, tu farias daquele que é o nosso ninho a tua casa eterna, e dessas mãos, que são espelhos que nos olham, a tua boca de fome sem-fim.

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Não gosto de cigarros nem de cigarrilhas, não gosto do cheiro amargo que eles me deixam na boca, mesmo que disfarçados por essências de baunilha, de cravo ou até de chocolate. Gosto mesmo é de estar contigo e, de dentro daquele café, encravado na história primeira da cidade onde nascemos, ver aquele sol redondo descer na Baía de Todos Nós, os santos, e se esconder por trás daquelas nuvens que mais tarde desabariam, em chuva, sobre o nosso telhado.

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Neste lugar, aqui do alto, mais perto do que nunca estivemos do céu, mais sujeitos do que nunca estivemos às nuvens que descarregam água fresca sobre esse telhado laranja, sinto-me como que envolto por uma carapaça de vento que se mexe, afoito, apagando velas - como quem protege -, levantando fumaças perfumadas dos incensos e a espalhando pelo ar – como que numa benção de perfumes sutis -, vento transparente como a tempestade lá fora, lá fora, mas tão presente, lá fora, mas tão rente, adjacente, tangente a nós dois.

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Não importa se é nove ou dez o número da música, sei que a tua cegueira de ontem à noite foi culpa da luz da vela que não iluminou suficientemente bem a tua vontade de deitar sobre meu corpo e, numa declaração, tocar a nossa música. Sei que a sinfonia dos pingos no telhado surrupiaram de ti os ouvidos, embriagando a tua mente que cantava, já, a nossa música. Sei que de tantos elementos, sei que de tanta embriaguez, não tivestes como.

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Nosso ninho foi pego pelo fogo de uma vela solitária, que tocou a tua fronha e se embriagou, numa crescente, por entre as fibras mais que inflamáveis do nosso travesseiro. Eram três da manhã e como já acontecera antes, acordamos em chamas. Você de pé, espalhando as brasas de um vermelho vivo por todos os lados, eu, vigília constante, alerta máximo, toquei e tirei do fogo o oxigênio que lhe dava a respiração. Ficaram o teu joelho e meu dedo em bolhas e nosso edredon, com marcas indeléveis, o sonho e o sono interrompidos pela nossa quase-catástrofe.

A metade que se foi do nosso travesseiro é a metade que terás que aprender a usar do meu. Duas cabeças e um único sonho.
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Meu ORKUT: Clique aqui.
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Meus sinceros agradecimentos ao carinho de minha querida ex-aluna Yara Sylvia, que sempre comenta aqui, mas que nunca deixa um e-mail para que eu possa agradecer...

sábado, 9 de julho de 2005

19º

Venta e chove muito, céu cinza, roupa de lã grudada no corpo para aquecê-lo, chuva indecisa: uma hora forte, outra fraca. É seu inimigo, o vento, que a deixa assim, sem saber em quantas gotas se transformará, e, sabendo, qual o peso de cada pingo e que sensação é a que vai causar em mim, essa chuva gelada em corpo quente.

19 é o número que pisca, em verde, nos totens que indicam as horas, espalhados nas praças da cidade, informando a nós, amantes dos tempos mais frios e mais aconchegantes, que ele, o frio, chegou. E esse frioziinho de inverno baiano veio me chamando para baixo do edredon, para o lado aconchegante dessa pessoinha que se embala ao vento indeciso que mexe nossas telhas, arrepia nossos pêlos, faz dançar aquela árvore e agita aquela velha poeira escondida nos telhados, que agora é a minha companheira nesse chão que piso.

Chuva combina com frio, que combina com namoro aquecido, que combina com casa vazia só pra gente, que combina com perfume ao meio-dia, que combina com céu cinza, que combina com aquele casaco vermelho, em contraste, que combina com um cheiro de frio, sim, porque o frio tem um cheiro, que combina com vela acesa, que combina com filme no dvd, paisagem da janela, pantufas e banho morno.

Hoje não é dia de águas geladas no banho, sedes imensas, ou dia de atirar-se, insano, nas águas do mar, num alívio de calor. Hoje é dia de águas mornas, fomes imensas e de atrirar-se, insano, na cama quente. Ela, a chuva, me disse, na linguagem da chuva - aquela, decifrável apenas por aqueles que entendem a linguagem dos telhados e da sinfonia das telhas de cerâmica em contato com pingos, cada um uma letra, um fonema, um som mais fraco ou forte - , que ela veio para ficar por mais alguns dias. Pedi a ela que chova muito sobre essa cabeça minha que arde por vezes e que agradece a Deus pela presença dela, a chuva, nas horas em que a cidade, a casa, meu telhado, eu, nós todos, pedimos a purificação.

sexta-feira, 8 de julho de 2005

Escudos

O meu escudo protetor se abre na medida em que controlo, como um observador – não juíz – os meus pensamentos, palavras e ações. A minha força protetora se multiplica quando os mantenho sob observação constante. Com quedas eventuais, como se espera de novatos nos passos da evolução como somos todos nós, mas um constante observador. A presença de um observador já é a arma mais poderosa, mesmo que ainda seja o observador falho, ausente por vezes.

Procuro direcionar a minha gratidão ao Universo por tudo que tenho, sou e posso fazer, todas as construções que já terminei, as que estão ainda em andamento e as que virão. Esta postura de gratidão com Tudo O Que Há é um treinamento constante com relação à nossa constante necessidade de pedir. Não peço proteção, mas força para ser capaz de criá-la ao meu redor, força para manter o nível das minhas vibrações, força para manter a qualidade do que digo, falo e faço. É difícil, mas existe o Amor, existe a Força, existe a Presença Interna, Deus, e Goethe um dia disse – e cito de memória, mais uma vez nesse blog – que sempre que você se põe em movimento para realizar algo grandioso, uma série de fatos acontecem para ajudá-lo e que, para tanto, basta coragem. Coragem de querer alcançar essa Paz.

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Eu iniciei o Diário Evolutivo, um dia, há quase um ano, com a intenção de escrever a respeito da Evolução, assunto que me interessa muito, pois tenho pressa. Pressa saudável de encontrar a mim mesmo, estabelecer uma relação mais saudável comigo e com os outros e contribuir para a Evolução Planetária. Estes dias, mais tranqüilo em casa, a tendência natural é a de se travar uma busca interior mais profunda, antes quase inexistente pela dificuldade do dia-a-dia, do trabalho e do corre-corre cotidiano. No silêncio, mais presente nesses meus dias – pelo menos o interno, porque vocês nem imaginam o barulho que faz lá fora - é mais natural que o Diário se volte, igualmente, mais pra dentro.

Para os que se interessam por estas idéias aí expostas, posso recomendar os livros:

O PODER DO AGORA e O PODER DO SILÊNCIO, de Ekhart Tolle
CONVERSANDO COM DEUS VOLS 1, 2 e 3
AMIZADE COM DEUS
COMUNHÃO COM DEUS, todos os cinco de Neale Donald Walsch

(todos livros que mudaram minha vida)

Para os que querem encontrar na Internet esses assuntos, existem essas comunidades no Orkut:

Conversations with God (em inglês)
Namasté!
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Update: o contador do Haloscan tá loooooko!

quinta-feira, 7 de julho de 2005

Que venham os anjos...

Por essa paz que não chega, mas que existe abundante no mundo, por esse torpor de alegria que nos invade nos momentos de leveza, mas que escapa tão facilmente quando atentados como esse eliminam vidas inocentes, ou nem tão inocentes assim, por este medo que às vezes lidera, comanda, mata a gente aos poucos, por esta dúvida que invade a alma toda vez que a humanidade decepciona com gestos cruéis, pela escuridão bombardeada, pela pólvora, pelos ricos que geraram e confirmam a miséria, por todos nós eu peço hoje que nos sejam enviadas tropas de anjos de asas curtas mesmo, mas que sejam anjos, porque deles, hoje, queremos aquele canto sereno e de paz, de acolhimento e de ajustes das nossas incertezas. Que venham à Terra os anjos, que portem extintores, água, curativos e muito ungüento para acalmar , curar e perfumar nossos corpos e mentes, mais uma vez abalados, mais uma vez temerosos, mais uma vez sem saber para onde foi essa crença que temos nos homens.

Silêncio, por favor. Nosso respeito e indignação aos ataques em Londres.

quarta-feira, 6 de julho de 2005

Multipost bestinha

(Hoje na academia):
O grandalhão da academia sai da sala em busca de uns halteres. Volta:

- Não achei o peso não. Ta lá na outra sala, na casa da porra! Vou usar esse aqui mesmo, mais pesado. Não é pra atrofiar? Então vamo lá.

‘Atrofiar’? Então tá..

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Comecei a malhar na semana passada, um programinha em dupla, se vocês me entendem. Uma vontade mútua de ficar bem fortinho, se vocês me entendem. Não gosto de malhar. Aliás, são raros os períodos em que realmente gosto de malhar. Faço por obrigação mesmo, por vaidade e por saúde. Não dá pra ser sedentário... é claro que não vou pra academia emburrado, ou quando não quero mesmo. Vou e tento encontrar prazer no que faço, afinal a gente não só faz o que quer na vida. Malho em uma academia pertinho de casa, o que facilita bastante. Em academia não consigo fazer amizades, sou sempre muito prático, não fico olhando se meu tríceps está menor ou maior, mais ou menos definido, nem tão pouco fico tirando cravos na frente do espelho para depois dizer, com a boca cheeeeeia, que passei três horas malhando. Ok, na academia, mas não malhando.

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Voltei a todo pique a escrever a minha dissertação. Do jeito que meu horário estava nos últimos meses não dava nem pra parar e pensar em fazer alguma coisa, simplesmente não tinha cabeça. Agora, de férias, tenho o dia inteiro em casa para escrever, ler, escrever e ler mais um pouquinho. E fazer o que estou fazendo é mais ou menos como malhar: você adquire um certo ritmo e pega gosto pela coisa (pela malhação tô demoraaaando de pegar gosto...). Realmente estudar é muito bom, e eu costumo dizer que você realmente entende de um assunto quando consegue fazer associações interdisciplinares. Imagine que você está estudando lingüística e consegue aplicar determinados conceitos no entendimento, por exemplo, da história, ou da psicologia. Ou até em coisas mais práticas da sua vida mesmo. É como se formasse um ciclo, como se as coisas, de fato, se encaixassem. Quando isso ocorre, você descobriu uma verdade – relativamente falando, claro. E entendeu essa ‘verdade’ direitinho.

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Deletei várias comunidades minhas no Orkut. Deletando, eu descobri outras, muito mais interessantes, e começo a discordar que o Orkut é um saco, ou é coisa pra gente desocupada. Não: o Orkut é uma ferramenta interessante e poderosa, mas muito sub-utilizada por muitos de nós. Está havendo um boom de novos orkuteiros, e acho que com o tempo a seleção natural vai fazer sua parte e os mais afoitos vão se afastar. Espero que a ferramenta interessante que é o Orkut permaneça e se transforme, proporcionando encontros e conhecimento.

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Dizem as boas ou más línguas que, hoje em dia, antes de se admitir alguém, o recrutador pede o endereço do candidato no Orkut e, através da comunidade, pode ter uma idéia de quem é a pessoa que possivelmente será contratada. Acho plausível, apesar de achar também que é uma tática falha, já que nada me impede de criar um segundo perfil com comunidades do tipo “amo Madre Tereza” ou “sou igualzinha à Irmã Dulce”, etc só para ganhar o emprego. De qualquer forma, é interessante passear pelos perfis dos amigos e ver as comunidades em que eles estão. Se antes era “diga-me com quem andas e te direi quem és”, hoje é “diga-me as tuas comunidades no Orkut e te direi quem és”.

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E dizem por aí que tem um hacker esculhambando as comunidades, principalmente aquelas que tem o pessoal mais metidinho. Soube que havia uma comunidade tipo “Adoro me vestir de rosa”, cheio de patrícias e que o tal do hacker entrou e trocou o nome para algo tipo “dou um c.. besta”. E o pior: ninguém consegue sair da comunidade. O trabalho do hacker foi muito bem feito. Hilário. Imagine se uma dessas resolve arranjar um emprego por esses dias...

terça-feira, 5 de julho de 2005

Tripé

Me manifesto na vida em palavras, atos e pensamentos. Se o tripé for saudável, tenho a certeza de que não estou indo de encontro a nada, nem a ninguém, e nem a mim mesmo, o que é o mais relevante. Se há palavras boas, se há pensamentos saudáveis, e se meus atos são de abrangência humana, solidária e caridosa – não no sentido do ‘dar’ programado, mas no ‘dar’ espontâneo - a minha vida está num circulo harmonioso tal, que nada que seja menos que isso pode influenciar.

A observação destes padrões que formam o tripé, a observação constante, a criação de um ‘ser’ que observa o que acontece, não como participante, mas como elemento de fora e por isso mesmo capaz de aceitar e entender melhor o que ocorre lá dentro, é um passo importantíssimo rumo à evolução. É o gerador de consciência, a chave para o crescimento espiritual. É este ‘ser’, que na realidade somos nós mesmos – a parte mais pura e menos conhecida de nós -, que diz à mente que o poder não está mais nas mãos dela, e que pensamentos, palavras e ações, por estarem sendo observados, estão agora sujeitos a uma espontaneidade de fluxo mais sutil, posto que a mente não mais comanda, reduzindo-se a mera coadjuvante no processo da vida.

O ‘ser’ começa a tomar conta, e o poder pertence agora a este ‘ser’ que habita e que observa. Note que este ‘ser’, como mero observador que é, não julga, observa. Não concede nem retira, não reduz nem estende, não se apropria, não entrega, não adormece nem desperta, pois é o próprio despertar. Este ser é Deus, o Grande Observador. Não está fora nem dentro, apenas é. Não existe, é. Não está nessa definição, é.

Não está, é.

segunda-feira, 4 de julho de 2005

O que passa e vem, e o que sempre fica

Quero ficar no teu corpo
Como uma música de Chico
Como poesia e melodia de Chico
Ecoando em tua mente,
Ouvidos,
E bocas sedentas por minhas rimas
Por mais rimas
Por rimas largas,
Poderosas,
Lancinantes
Ricas.
Passam invernos, verões, outonos e primaveras, passam os dias, as horas, os anos, passa tudo, passa a sexta, passa a dor, passa a alegria, passam os medos, passa rápido, lento, passa em uma noite de sono, em um suspiro, passa aquela idéia antiga, a mais nova inspiração, essa passa em um esquecimento, em um sopro, passam-se os textos, e sempre a idéia é de que tudo vai passar um dia e que nada restará. No sentido inverso, no entanto, vêm mais horas, vêm mais dias, mais segundas, mais inícios, vêm mais alegrias e mais tristezas, vêm os gestos, vêm segredos, e vêm também suas revelações logo ali em fila indiana. Vêm mais gostos, mais desejos, mais montanhas, mais janelas, vem uma saudade, vem o encontro e ela passa, afasta e vem outra saudade, vêm um vento, uma tempestade, uma brisa e mais uma vontade – essa sempre vem. Vem sol quente, e vem uma nuvem, depois vem outra e se continuar vindo, vem mais um temporal, e vai-se com o tempo ruim a praia e a cor azul do mar.

E vem um tanto de cada coisa, coisas que, aos poucos, inevitavelmente, vão passar. Com tantas idas e vindas, ficamos, nós, escultores, observadores e escravos do tempo, aqui, nunca parados, mas como espectadores de jogo de tênis, uma hora para a esquerda, vemos o que passa, uma hora para a direita, vemos o que vem. E nesse movimento instável, incessante, inconseqüente, interminável por decisão suprema nossa, não olhamos pelo ângulo por onde nada passa e de onde nada vem, aquele ângulo impresso na carne de dentro, o ângulo da visão estática, imóvel, parada. O ângulo do olho que olha pra dentro e descobre que, enfim, nada passa e nada vem, mas tudo é.

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E por falar em passar e vir, não canso de dizer – ou melhor, escrever – que fazer um blog é um exercício de vida, de entendimento do mundo e de si mesmo. Quem escreve sabe que a sensação que dá, quando termina-se um post, é a de que não há mais posts para vir à tona e que não haverá mais nada para se escrever. Mas amanhã sempre tem uma coisa. Amanhã ou depois, ou daqui a uma semana, não importa – isso depende do ritmo de cada um. Mas um próximo post sempre haverá. Porque a vida não pára nunca, porque ela escorre pelas teclas que toco agora, porque nossos milhões de sentidos percebem e sentem e têm essa necessidade deliciosa de se comunicar, por estarmos vivos em uma teia incessante de coisas. Inspirar-se, longe de ser um ato espontâneo, é resultado da observação incessante das coisas do mundo. A inspiração é fruto que se colhe pela curiosidade e encantamento pela vida, a flor que brota na mente, através dos olhos do coração, quando se tem uma postura receptiva diante da luz que ilumina tudo.

Escrever um blog, portanto, é experimentar nas letras o fluxo incessante que há na vida. É isso!

(e
você, já tá na hora de começar a escrever o seu!),

Bye bye cachinhos

Não contei: cortei minhas madeixas. E aí, gostou?

sábado, 2 de julho de 2005

Bumbum de fora

Hoje, finalmente, o Blogspot resolveu disponibilizar upload de fotos direto do computador, com alguns clicks, dispensando o uso daquele Hello. Sou ignorante em informática mesmo, não entendo muito do assunto desde que eu fazia propaganda de leite Ninho e afins e por isso acho que isso só vai facilitar a minha existência e a existência do Diário Evolutivo. O bom mesmo é que agora eu vou poder rechear meus post com mais fotos. Sei que isso é um blog, mas os textos não faltarão.

PS.: Tenho fotos tiradas na minha câmera digital e algumas tiradas no telefone celular. Essas últimas não consigo baixar aqui. E olha que estão em formato JPG, como essa aí ao lado, obviamente escaneada. Alguém explica o mistério?

Bem na foto: euzinho, mais ou menos trinta anos atrás.

(tem mais post fresquinho aí embaixo. Deu um trabalhão pra escrever. Vê se lê e comenta...)

Sem camisa no inverno

E ainda dizem que não há inverno na Bahia. Há sim. Mas só quem mora aqui o ano todo, só quem consegue ver o inverno daqui de forma absoluta, entende que nesses dias de inverno não faz frio, mas chove mais, não faz frio, mas tem um ar mais fresco desconcertando os cabelos, não tem frio, mas tem um mar mais arisco, pouco convidativo; não tem frio, mas tem fins de tarde lindos, como esse restinho de pôr-do-sol no Iate Clube (a foto é artística, nada de acusá-la de falta de foco, etc.)

Foi hoje que este céu flutuou pelos nossos olhares, neste fim de tarde típico de inverno. Inverno sim, só que visto, como disse, de forma absoluta, sem relativizar, sem fazer dele um parâmetro para entender outros invernos, invernos-iguais-a-todos-os-outros-invernos de outros cantos.

O inverno na Bahia é só ele, é mágico como o tempo na Bahia é mágico, sempre foi e sempre será. Não dá pra vestir casaco, nem comer fondue, nem esfregar uma mão na outra pra aquecer. Mas dá pra dispensar o ar-condicionado, agarrar o amor ao lado na hora fria da manhã, e até para chamar os amigos e tomar um vinho com chuva batendo no telhado.

(mas confesso que rezo por um friozinho, num repente de inveja do Sul...)

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"Luz, quero luz, sei que além das cortinas são palcos azuis e infinitas cortinas com palcos atrás..."
(Chico Buarque)
E ontem teve o Encontro de Chico na casa de meu querido amigo Tom, amigo de longas datas, de quem eu já falei aqui. Regados a vinho, cerveja, quitutes, amendoim e muito bom humor e astral lá pra cima e risada solta, recitamos Chico durante algumas boas horas. Recitando mesmo, cada uma escolhia uma música, explicava, se quisesse, o porquê da escolha e recitava, teatralizava, chorava, ria, o que quisesse. O que tava valendo era a emoção eterna das palavras do mestre.

Alguma dúvida de que foi o máximo?

Aguardem a Noite de Clarice.
Bem na foto, eu e Thi.

sexta-feira, 1 de julho de 2005

Sobre as coisas mortas e de como livrar-se delas

“Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la. Em um cofre não se guarda coisa alguma. Em cofre perde-se a coisa de vista. Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela, isto é, estar por ela ou ser por ela.”
(Antonio Cícero)

“Tudo que já tem tempo, leva tempo a compreender.”
( Pedro Ayres Magalhães)

Arrumava minhas gavetas hoje, uma amostra pequena ainda das milhões de gavetas que eu tenho, e que precisam de arrumação. Precisam ser postas ao vento, precisam respirar, precisam livrar-se de papéis velhos, de velhas fotos que não fazem mais sentido, precisam perder o mofo, o bolor das coisas velhas, trancafiadas, úteis ontem, inúteis hoje.

Tirei as gavetas com vontade das sepulturas em que se encontravam e vasculhei fio a fio, à procura de fatos meus registrados em papéis, fatos que foram, por assim dizer, fatos apenas, nada mais. Minhas gavetas continham segredos que eu guardei por anos, segredos que eu nunca joguei ao vento por medo de que um mendigo qualquer descobrisse as minhas senhas, e as atirassem ao mundo, me chantageassem a alma secreta, me divulgassem como um sub-produto das ruas. Revisitados os segredos, um a um, decidi incinerá-los das minhas lembranças. Não incinerá-los ateando-lhes um fogo covarde, mas incinerá-los olhando-os com desprezo, com um destemor quase perigoso, destemor de risco quando se olham para segredos tão antigos. Mas pela sua antigüidade mesmo eles mereceram o fogo do meu olhar, mereceram transformar-se na escuridão, mereceram o nada de onde vieram.

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É muito difícil para mim livrar-me do antigo, do guardado. É muito difícil também reabrir uma gaveta de anos atrás e ver que eu tenho, sim, a vela que era vital naquela noite escura, o fósforo para acendê-la e um castiçal para evitar o desastre. É triste saber que guardo inutilmente coisas na gaveta e esqueço de arquivá-las, igualmente, na memória. Ter e não saber que se tem é igual a não ter. Triste descobrir isso. Para tanto, precisei revirar as minhas velhas gavetas - você tem feito isso?

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É igualmente difícil para mim d(o)ar as minhas roupas, os meus sapatos, as minhas coisas. Sempre acho que posso precisar deles amanhã, mas a realidade é que eu nunca preciso, e me deparo sempre com eles, figurinhas fáceis, íntimas, sedentárias, de frente para mim no guarda-roupas. Alguns desses objetos são apenas inúteis - para mim - e o meu egoísmo não me permite ver-lhes a inutilidade, aceitando o fato de que alguém mais pode encontrar um uso neles. Outros são inúteis mesmo - para quelquer um - posto que velhos demais, mas aí já fazem parte de lembranças, ou podem servir para aquele dia em que se quer sair por aí como um mendigo que perdeu tudo...

Apesar da dificuldade, tenho exercitado o ato de doar. Entro no meu quarto, abro meu guarda-roupa, e a cada objeto que sai, sinto um peso a menos em mim. A responsabilidade de ter não tendo, por não saber usar.