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terça-feira, 30 de novembro de 2004

Lapidações

Existem dias estressantes. Dias em que todas as questões do mundo convergem na sua direção. Você se sente como um imã que atrai os problemas alheios e é posto, involuntariamente, na posição de ouvinte e/ou apaziguador. São tarefas que a vida nos dá. E a sensação nessas horas é que você é uma esponja, pronta para, mesmo sem querer, absorver tudo. E é nesses instantes que muitas vezes, fracos, amaldiçoamos a vida. Digo fracos, porque geralmente nos falta visão de lince, ou a que sabe ver o que não está lá, ao alcance de olhos menos sensíveis. É a vida nos dando a oportunidade de ajudar, ou é a vida nos colocando em situações desconfortáveis, como faria alguém que nos quer ver perdidos?

Eu fico com a primeira opção. Quem tem amigos tem problemas, quem tem amigos tem que ter ouvidos limpos e bem treinados e calma na voz e tranqüilidade no olhar. Todos nós, sem exceção, somos postos em situações como as que eu vivi hoje - que aliás não foi uma, mas três - foram três momentos que tive de ouvir um amigo em apuros, dar conselho, 'pensar-junto-com'. Não é fácil, nem sei se me saí bem - nessas horas muitas vezes me sinto como uma criança de 7 anos cujos pais deixaram um bebê de 1 aninho sob a sua custódia. A reação mais natural nessas horas é 'tomar as dores' do outro, resultando num inevitável acoplamento de energias. O problema deixa de ser do amigo e passa a ser seu. E tudo indica que isso não ajuda. Nessas horas, distanciar-se parece ser a melhor forma de ajudar. Só olhos de fora podem, muitas vezes, perceber de forma clara o que se passa. Entendendo o ocorrido, vendo os fatos em perspectiva, a atenção agora volta-se para o quanto se fala, ao quanto se ouve, ao cuidado com as palavras e com a ética, porque você pode estar atingindo uma das partes - e isso é extremamente delicado quando as duas partes lhes são igualmente caras. É difícil, vocês sabem. Mas depois que a gente de fato se distancia e o tempo passa, fica bastante claro o objetivo do confronto. A tal da pedra no seu caminho estava ali por uma razão. Ela não surgiu sem fundamentos, ela não foi atraída por nenhum motivo. Você a convocou para estar ali, e ela veio.

(Depois que os ânimos se acalmam, retomamos a pedra nas mãos e, sedentos por uma resposta da vida, abrimos a palma direita e, num olhar, examinamos o que ali está, ávidos pela visão de um diamante recém-lapidado.)

segunda-feira, 29 de novembro de 2004

Fim do suspense


Hoje é uma segunda-feira especial. Depois do suspense de ontem, finalmente inauguramos o nosso Blog coletivo, o Dos 4 cantos, que já está no ar, e o primeiro texto adivinha de quem é? Meuzinho. Toda semana teremos um tema diferente e cada um dos seis cantos será responsável por um dia da semana, quando ele dará a sua visão sobre o assunto. A idéia é bem interessante, surgiu entre amigos virtuais e o embiãozinho foi lançado hoje. Por hoje ser um dia especial, dedicarei este post ao nosso novo Blog. O Diário Evolutivo continua firme e forte, portanto continue sempre passando por aqui. Hoje, o seu comentário é bem vindo aqui e .
***
Pra quem mora em Salvador, recomendo a peça 'As feministas de Muzenza'. Assisti ontem e fiquei impressionado com os atores, todos muito bons e engraçadíssimos - e desconhecidos do grande público. Vale a pena dar uma conferida lá no Teatro do Sesi, Rio Vermelho. E aos domingos, uma boa pedida antes de ver a peça é assistir a um show de samba que começa às 18h no mesmo espaço, só que ao ar-livre. Boa semana! Namasté!

domingo, 28 de novembro de 2004

Novidade

Podem aguardar ansiosos porque a partir de amanhã tem uma grande novidade chegando por aí. E novidade das boas, vinda dos quatro cantos desse País. Ainda hoje vocês vão ficar sabendo do que se trata. Bom domingo e Namasté!

sábado, 27 de novembro de 2004

Ancestrais

Gosto muito de passear pelo Centro de Salvador. É nostálgico. No finalzinho da tarde de hoje eu estacionei o carro e andei um pouco por lugares em que há dez, quinze anos atrás, já foram o cenário de grandes momentos da minha vida. Passei pela frente dos Cines Art 1 e 2, para lembrar que aqueles eram os meus cinemas favoritos, principalmente na época em que eu sofria de uma mini-depressão ao entardecer dos domingos e o cinema era o lugar onde eu me afugentava para fugir do pôr-do-sol, que desencadeava a tristeza. Hoje os dias são outros, não temo mais os domingos e muito menos seus entardeceres, mas sinto pela falta que aquele cinema de rua, com pipoqueiro de verdade na porta faz. E essa saudade, essa nostalgia, eu sei que é comum nas grandes e médias cidades, que hoje têm seus cinemas concentrados nos shoppings, mais confortáveis, é bem verdade, mas tão distantes daquele tempo de simplicidade que graças a Deus eu vivi...
***
E todo final de tarde que se preza, na Bahia, tem de ser regado a acarajé com coca-cola. Não resisto, mas mais gostoso do que o próprio acarajé é parar pra observar um tabuleiro de baiana. Vocês já não devem mais agüentar ler sobre esse assunto por aqui, mas é que parece que não se esgotam as palavras quando se trata desse lugar onde tanta coisa acontece. E acontece mesmo. Há um cheiro de dendê no ar, há palavras com aquele sotaque que canta nos ouvidos - apesar de ser baiano e falar cantando também, nunca deixarei meus ouvidos se acostumarem com esse jeito de falar; quero sempre sentí-lo. E eu fiquei atento; estas horas são de tamanha riqueza, que eu me comporto com uma curiosidade quase antropológica:

- ... vai seu capenga. - bradou a mulher sentada ao lado do cara que vende coca-cola.

- Capenga não! Sou de-fi-ci-en-te. - respondeu com um sorriso, demonstrando orgulho quando pronunciou a palavra 'deficiente' com todas as letras - Eu não ando com uma perna lá e outra cá. Capenga é que anda assim.

O cara era de uma simpatia, que eu não resisti e sorri pra ele, sorriso que ele me retribuiu com espontaneidade. Espontaneidade de gente feliz com a vida mesmo. Enquanto isso, no tabuleiro, iam e vinham as colheres cheias de vatapá, salada de tomate, pimenta, caruru. No fogaréu o dendê fritando os bolinhos de feijão. Uma baiana batia a massa enquanto outra acrescentava a cebola moída, num gesto, pensava eu, que vinha dos meus ancestrais, um gesto que mais uma vez se repetia, como vêm se repetindo anos a fio nessa terra dos meus amores.

sexta-feira, 26 de novembro de 2004

O que te estressa?

Hoje perguntei aos meus alunos o que mais os estressava. Eis as respostas:

Motoristas lentos no trânsito, gente que me pede a mesma coisa insistentemente, alguém se apossar de minhas coisas sem a minha autorização, prazos, pessoas burras, esperar, ter de falar ao telefone, gente que come fazendo barulho, discussões à mesa, médico atrasado, blá, blá, blá....

E por aí vai. Inevitável perguntar a mim mesmo o que é que mais me estressa. Cheguei à conclusão que são quase as mesmas coisas, só que com uma nuance diferente: tenho praticado um maior controle sobre o estresse; ao invés de deixá-lo me dominar, tenho tentado dominá-lo. Uma aluna narrou que teve gastrite nervosa, e só depois disso resolveu não se estressar mais com seus alunos. Ela precisou ter uma gastrite nervosa para tomar a decisão. E parece que não foi tão difícil; hoje ela aparenta uma serenidade que parece que é verdadeira e vem de dentro. Eu tomei a decisão antes do meu corpo reclamar. Respiro duas, três, cinco, dez vezes antes que se forme em mim aquela bolha vazia no estômago, que me leva a gritar, a buzinar, a perder o equilíbrio. Eu sei que custa muito caro à nossa saúde essa tal bolha. E sei também que nada, mas nada mesmo vale um dia de paz ou uma noite bem dormida. Quando passo pela orla não deixo de olhar para o mar, quando passo por uma árvore - como aquela centenária, na Vitória, bairro de Salvador, cheia de epífitas - não deixo de respirar e abraçá-la com a minha energia, quando vou dormir faço questão de pensar em coisas boas, quando o final de semana chega faço questão de não pensar nos problemas que ficaram pra trás ou que estão prestes a vir à tona. Uso a respiração como aliada. Muitas vezes, mas muitas vezes mesmo, amigos, eu caio. Levanto, como todo bom bebê que quer aprender a andar, sorrio, aperto o botãozinho em mim que faz os meus olhos começarem a brilhar novamente, olho pra frente para não atropelar ninguém, sacudo a poeira, passo a primeira no meu cavalo alado e continuo. Firme no meu intuito de ser mais feliz.

E você, o que te estressa?
***

Final de semana tem show de Maga e Paralamas, visita a mainha, aconchego dos amigos, acordar tarde, cineminha, dinheiro pouco no bolso, sushi no sábado, Internet de graça, mergulho no Porto da Barra, pôr-do- sol no Porto da Barra, cortinas ao vento no sábado à tarde, dissertação de mestrado, duas monografias me esperando para serem escritas, domingo que antecede a minha penúltima segunda-feira de trabalho do ano, beijo na boca, aula particular com as minhas meninas, queda de audiência no blog. Tem também sal na boca, vizinho batendo na porta, vontade de comer doce, preguiça de sair de casa, TV fora da tomada no domingo. Não tem Jô, não tem novela, não tem que sair de casa, não tem que fazer nada se não quiser, não tem estresse. Porque final de semana tem cheiro de alforria, de liberdade, de ser e fazer o que bem se entende pra rir até perder o ar, até perder o medo, até aprender de uma vez por todas que 'felicidade se acha em horinhas de descuido'. Bom final de semana pra você. Namasté!

Meus amigos, meu orgulho - Hoje, apresentando Tati.

Tati, ou Tata, é minha modelo favorita. Modelo de amiga, modelo de gente do bem, modelo de luta, de força, de vontade de vencer. Não tem nada nesse mundo que possa abalar essa força que vem de dentro dela. E ela sabe disso; ela sabe que tem um poder que transcende. Tati e eu nos tornamos irmãos em Itabuna, BA, em 2001, quando me mandaram pra lá, diga-se de passagem, rumo à felicidade de encontrar pessoas maravilhosas e ter um dos anos mais confortáveis da minha vida. Confortável, entre outros motivos, porque eu tive amigos como Tati, cheia de gírias, cheia de vontades, cheia de coragens. Não posso esquecer das nossas longas caminhadas do Jequitibá até em casa pela Av. Cinqüentenário, parando pra comer pizza de um real, aquecida num forno montado em um carrinho de pipoca, que, até onde vai o meu conhecimento do mundo, só tem em Itabuna. Não posso esquecer de Tati falando dos seus sonhos, não posso esquecer de Tati e eu juntos, rindo à toa, num domingo de sol em Itacaré. Não posso e nem vou esquecer. Essa minha amiga já tá gravada na minha memória feito tatuagem, com a força do sol escaldante do sul da Bahia.

quinta-feira, 25 de novembro de 2004

Evoluir e Fluir

"Viemos para lembrá-lo de quem você é".
(Transmissões da Estrela Semente, Ken Carey, p.41)

"Seu nascimento individual acontecerá no momento exato do tempo linear em que você deixar de se debater com os seus padrões racionais de temor e abandonar-se à divina dança de direção interna."
(Transmissões da Estrela Semente, Ken Carey, p.40)

***

"No início eu não era nada, pairava num oceano sem rumo, sem direção. Vivia num estado de letargia, indescritível para você, que vive na relatividade. Um dia fui chamado, e comecei a enxergar novos mundos. Deparei-me com seres da mesma espécie que eu e, como quem se vê num espelho pela primeira vez, num susto, fui apresentado à minha imagem. Mas vê-la não bastava. Precisava tocá-la, explorá-la, senti-la. E assim, parti. Encontrei imagens que me trouxeram a recordação de quem eu era, do que eu estava sendo, do que eu queria e até do que eu não queria ser. Relacionei-me com todas elas, fiz as minhas escolhas, me recriei, experimentei sensações, gostos, emoções. A cada experimentação, fiz uma escolha. Eu sou o resultado destas escolhas, eu sou, nesse instante em que faço a você essa comunicação, o que eu escolhi ser. (...) Agora, peço a sua licença. Preciso partir novamente. Preciso avançar, cair, levantar. O que eu sei de mim ainda não basta... não sei parar essa busca, preciso recordar de onde vim."

Um dia, há muitos anos atrás, durante uma discussão de temas em um Centro Espírita - que costumo freqüentar -, a palestrante foi questionada com relação à nossa evolução - como ela acontece, por assim dizer. Não acho que nenhum de nós possa responder a esta pergunta de forma eficiente, mas existem maneiras de explicar que pelo menos podem apaziguar nossas curiosidades e até mesmo servir como um meio de reflexão a respeito do nosso papel aqui no mundo. Ela deu uma explicação que achei, apesar de muito simplista, interessante e bastante esclarecedora. Ela dizia mais ou menos assim: partimos de um ponto X - 'Deus', e por isso ouvimos dizer que 'fomos criados à Sua imagem e semelhança' - como seres não-individualizados, sem consciência. Evoluímos desde o reino dos minerais até o reino dos animais, passando pelos vegetais. Nesse processo evolutivo, adquirimos gradualmente resquícios de consciência. Ao atingirmos a forma humana, já com uma consciência mais bem elaborada, partimos em busca do retorno ao Pai, ou em busca de 'nós mesmos'. Este caminho de volta é o que todos nós estamos fazendo agora. É nesse caminho de volta que encontramos e reencontramos afetos e desafetos, criamos e recriamos partes de nós mesmos, fazemos e desfazemos conceitos, lidamos com extremos como Medo e Amor, nos relacionamos com o mundo o tempo inteiro para nos descobrirmos como seres únicos, perfeitos - ou apenas e simplesmente para relembrarmos de tudo isso. É mais ou menos como o Alquimista que volta ao lugar de onde saiu para descobrir que era ali mesmo onde estava seu tesouro e, voltando, também descobre que, se não tivesse partido, jamais teria sido capaz de encontrar o que sempre esteve ali. Namasté!
(as habilidades do desenhita aqui não são nada evoluídas, desculpem...)

quarta-feira, 24 de novembro de 2004

Namasté

Minha amiga virtual Cassinha um dia me perguntou se eu tinha religião. Eu respondi que não. E realmente não tenho religião no sentido estrito da coisa. A minha religião tem um sentido mais amplo por ser feita de uma colcha de retalhos, formada pela junção de aspectos das diversas 'religiões' que me servem. E esse conjunto é para mim um meio de restabelecimento da minha conexão comigo mesmo, ou seja, com meu Deus interior, porque o Deus em que eu creio não está fora, mas dentro de mim. Por isso resolvi fazer essa tatuagem. Sempre quis escrever alguma palavra no meu corpo. Mas não podia ser qualquer coisa. Tinha de ser algo que realmente refletisse positividade e que tivesse a ver comigo, com as minhas crenças, com as minhas concepções a respeito de quem eu sou, do que estou fazendo aqui e para onde estou indo. Escolhi Namasté - saudação iogue que significa 'O Deus em mim saúda o Deus em você' ou 'A minha luz curva-se diante da sua' - porque trata-se de uma palavra que contém em si mesma muita sabedoria.

Em primeiro lugar, há a legitimação do Deus interior, ou do sagrado, primeiramente em mim mesmo - o que, por si só, já é um passo maravilhoso - e depois no meu próximo. Isso leva, inevitavelmente, ao humilde reconhecimento de que somos iguais e de que a minha essência é idêntica à de todos. Ao reconhecer e afirmar esta igualdade, estou atestando que não há diferenças no plano mais sutil da vida e que, portanto, SOMOS UM. Isso reafirma a existência da Unidade Sagrada. A força do significado dessa palavra gera, ao pronunciá-la, o alinhamento e harmonização com a força cósmica.

E agora vocês já sabem que o que carrego nas costas, longe de ser um fardo, é uma palavra com força de luz. A palavra que eu acredito que, um dia, será substituída pelos 'ois' e 'olás' - aqui no mundo ocidental, porque em países orientais já é uma saudação comum - e ajudará a materializar um mundo mais harmonioso para todos nós.
***
A terça-feira em Salvador foi chuvosa, trazendo de volta a melancolia do inverno... é como se um velho amigo que você não vê há meses voltasse em sonhos, ou lhe fizesse uma breve visita durante a sua jornada rumo ao norte. Se a minha felicidade dependesse somente do tempo, a saber, de dias nublados ou de sol escaldante e céus azuis, eu não teria como temer a infelicidade. Qualquer uma das opções me faz extremamente feliz. Sinto-me acariciado igualmente pelas duas paisagens, pelas duas visões da minha janela.


terça-feira, 23 de novembro de 2004

Inadequações

O mundo de fato está virado. Já devo ter dito aqui que minha mãe é diretora de uma escola aqui em Salvador. Pois bem, ela tem um aluno de mais ou menos 13 anos que tem trejeitos afeminados. Até aí, nada demais, normal em qualquer lugar do mundo. Não acho que trejeitos sejam indício algum de orientação sexual, portanto não me assustei ou fiquei surpreso quando recebi a notícia de que esse garoto resolveu arranjar uma namorada. A menina é aluna da escola e da mesma sala que ele. E aqui as coisas começam a sair um pouco do aceitável: eles insistem em se agarrar durante as aulas, trocando beijos ardentes. O garoto inclusive foi flagrado com a calcinha da namorada nas mãos. Minha mãe, obviamente, teve de convocar os pais e informá-los do ocorrido. A preocupação da mãe da menina era com relação à índole do menino com quem a filha estava mantendo o “relacionamento”. Minha mãe respondeu que se tratava de um bom menino, mas aquele comportamento não estava adequado para um ambiente escolar. Agora vem a razão para o título desse post. Ao contar o ocorrido ao avô do garoto, um senhor de mais ou menos setenta anos de idade, ele olhou para o menino e disparou:

- E você não era viado? Ta querendo agora me dar trabalho, é? Você que engravide essa menina!!

Isso sim, me deixou pasmo. Normalmente, o problema seria com relação à suposta homossexualidade do garoto. Mas o vovô dele conseguiu dar um nó na cabeça dos mais liberais. Ele não só dá como certa a homossexualidade do neto, como critica o menino por estar experimentando atos heterossexuais. Imagine a cabeça do garoto, que talvez nem se sinta homossexual, diante de um avô que pensa desse jeito... Olha, vou parar por aqui. Quanto mais penso nessa história mais meus cabelos ficam em pé.

Meus amigos, meu orgulho - Hoje, apresentando JÚNIOR

Júnior chama-se Edmo. Como todo - ou quase todo - Júnior, seu primeiro nome não é convencional. Esse amigo meu é dos mais queridos, porque além da amizade, temos um algo mais em comum que nos une muito: as raízes. Nascemos e nos criamos na Península Itapagipense. Ele na Ribeira, eu em Roma - Cidade Baixa, Salvador, Bahia. Ele nasceu apenas cinco dias antes de mim e crescemos vendo a mesma paisagem pueril da Península. Esse é talvez o mais ingênuo dos meus amigos, mas ingênuo no sentido bom mesmo, ingênuo de 'sem maldade', de coração bom, de alma branca. Já vivemos muita coisa juntos, já aprontamos tanto que eu nem posso contar aqui. Existe entre nós uma cumplicidade que a gente só tem com aqueles que vieram de onde a gente veio. É como se o entendimento da vida se completasse e se manifestasse um no outro. Estar com Júnior é como estar em casa. É isso.

segunda-feira, 22 de novembro de 2004

Eu amo as segundas

Numa segunda a esperança se refaz. É a materialidade de mais uma oportunidade de retomar o fôlego, e é como se o mundo nos desse uma nova chance de não desabar sobre ele. Por isso me nego a odiar as segundas-feiras. Não poderia ser insensível a ponto de não amar a esperança, ela própria, nascendo em forma de dia.

Quando tu vens

Então me beije e que deste suave beijo eu sucumba à tua vontade e que os meus pés se desfaçam em pó, ou virem asas, ou virem olhos imensos a te ver. Cada sonho em que tu vens é como apertar uma tecla que remonta a paisagem. O que vejo é a tua ausência, o que sinto é aquele beijo, o que quero é o teu corpo e que me destrói é o desejo. Me procuro no emaranhado das lembranças, me perco naquilo que foram nossas esperanças. Me perco no hálito, no cheiro morno do teu sexo, na árvore caída, na foto no posto de gasolina, nos teus cabelos longos e soltos sobre mim, no embaraço daquele encontro: a cabeça baixa, um sonho quase despedaçado. Tanto desejo, e hoje é tudo apenas sonho. De lá te vejo, ouço a tua voz, insensível à minha espera. E é no espinho da rosa que latejam as minhas vontades. E a cada passo que dou, me torno mais óbvio. A cada batida das minhas asas, mais plumas se soltam. Caí como um anjo.

- Sob teus pés descanso. Sob teu sonho, me desejo.

domingo, 21 de novembro de 2004

Bebê

Não intimide-se nem tema a vida quando ela lhe mostrar um caminho que nunca antes tinha pensado em percorrer. Ao contrário, desafie a novidade e parta rumo a si mesmo. No centro do novo, pode estar um bebê que sorri para você, em busca de um pai ou de uma mãe, disposto a amar e trazer-lhe a felicidade de novos dias.

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(foto tirada em Baixios, by Leo.)

sábado, 20 de novembro de 2004

Pintando estátuas

Minha sexta-feira foi um daqueles dias acolhedores, de paz, de emoção à flor da pele. Até com o final de Cabocla, da qual eu nunca tinha assistido a um capítulo sequer, me emocionei. É que passei uma tarde maravilhosa com a minha família, principalmente com a minha mãe. Ir à casa de mainha é sempre um bom post, porque nada que eu faço lá é rotineiro. Imaginem que hoje passamos quase a tarde inteira pintando as imagens do presépio que armamos há mais de não sei quantos anos no Natal. Eu fiquei responsável pelo São José. Colori a roupa do pai do Menino Jesus, mudando radicalmente as cores em tons pastéis da estátua original. Eu puxei à minha mãe a ao meu tio Almodóvar: adoro cores. E meu São José não ficou de se jogar fora não. Acrescentei um brilho especial à vestimenta, a pedidos de mainha: “Os pastores não, mas São José tem de ter brilho, afinal de contas ele é um santo.” E confesso que tive que maneirar na purpurina senão São José acabava mais parecido com uma drag-queen do que com um pacato carpinteiro de Jerusalém. Escolhi o São José porque, sendo ele o protetor das famílias, achamos que ele seria um bom santo para me ajudar a comprar o meu tão sonhado apartamento. Se eu de fato não exagerei na purpurina, acho que vai rolar uma mãozinha dele para eu deixar de pagar aluguel muito em breve.

Fomos também no Mercado do Frutos do Mar em Água de Meninos (Cidade Baixa). Lá, se não fosse pela astúcia de minha mãe, teríamos sido enrolados pelo vendedor de camarão, que habilmente coloca os camarões maiores à vista e, na hora de pôr o pedido na balança, mistura os grandes com os pequenos. Ao ver isso, obviamente eu questionei e só faltei medir camarão por camarão com ele, querendo encontrar junto com o sujeito uma razão que justificasse tamanho disparate - nessas horas eu sou mau e quero ouvir da boca da pessoa uma explicação lógica (que obviamente não existe). Não fomos grossos com o vendedor, mas mostramos que não somos bobos. Não compramos lá. Preferimos uma barraca de gente honesta. Espero que tenha servido de lição para ele... O engraçado é que a minha mãe diz que quando ela vai com uma amiga nossa – que é negra – o preço cai absurdamente e eles não têm coragem de enganar. Pode?

Mas se você for bastante atento (a), vai observar que eu falei lá na primeira linha em ‘emoção à flor da pele’. É que a sapiência e nobreza de mainha me deixam realmente muito emocionado. Hoje eu aprendi com ela algumas coisas de uma nobreza incrível. Foram duas lições. Cada uma dá um post. Tá prometido, eles saem fresquinhos na semana que vêm.

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Em tempo: acabei comprando meio quilo de camarão e meio quilo de siri-mole, dos quais eu e Vinis vamos fazer uma deliciosa moqueca amanhã, aqui em casa. Quer vir?

sexta-feira, 19 de novembro de 2004

Das vantagens de se ter um blog

· Ter a chance de expor o que pensa sem censuras prévias;
· Conhecer gente na mesma sintonia que a sua e fazer amigos, pelo menos virtualmente;
· Aprender a ler mais - porque para fazer um bom Blog, você precisa escrever bem e para se escrever bem, você precisa ler muito;
· Passar a observar melhor o mundo ao seu redor - ele é a sua pauta;
· Ter a chance de ser lido por pessoas em diversos lugares do seu país e do mundo;
· A possibilidade de um dia poder juntar tudo e fazer um livro;
· Ter um ponto de encontro com os amigos;
· Não precisar mais responder à pergunta tipo "Como foi o seu fds?", pode-se simplesmente responder: "Leia no meu Blog";
· Dá um prazer danado voltar tudo e ver o quanto você já produziu;
· Dá mais prazer ainda receber os elogios, críticas e saber que no mundo existe mais gente que pensa do que você imaginava antes de se aventurar pelo mundo dos blogs;
· Pra quem está longe, é uma ótima maneira de manter os amigos bem informados;
· A possibilidade de publicar aquele monte de tralha que você tinha em casa guardada e que só as traças vinham aproveitando.
· A chance de desabafar, principalmente para aqueles que precisam do papel para isso;
· Chance de vender as suas idéias, vender as dos outros, ter gente concordando e discordando de você, o que não deixa de ser um processo de crescimento;
· Promover a discussão de assuntos que interessam o bem-estar em geral das pessoas, o desenvolvimento do ser humano e a paz.

Escrevo meu Diário Evolutivo há menos de dois meses, e posso garantir a todos vocês que esta tem sido uma das experiências mais interessantes da minha vida. E aproveito também para agradecer as visitas, os comentários, os elogios, as críticas. Eles têm me ajudado a refletir, mudar, crescer. E sei também que existem várias pessoas que acessam, mas não comentam - aliás isso é o que mais tem -, pessoas essas que são obviamente muito bem-vindas, sempre, mas que me deixam sempre com uma sensação de dívida com elas porque eu nunca posso agradecê-las. Este post é também para isso. Muito obrigado, bom final de semana e não sumam!

(coloquei uma foto minha hoje, porque tem os novos amigos que ainda nem sabem como eu sou!)

Meus amigos, meu orgulho. Apresentando hoje, MATTHIAS


Hoje a minha homenagem é para alguém que já se foi, que já deixou esse mundo há alguns anos - que insisto em perder-me na contagem, talvez pela pouca importância que isso tem -, mas que nunca saiu de meu coração. Hoje é dia de falar com vocês sobre meu querido irmão belga Matthias, que nos idos de 1991 morou na minha casa aqui em Salvador como estudante de intercâmbio e marcou não só a minha, mas a vida de toda a minha família, com seu jeito pacato, simples, decidido. Voltei à Europa duas vezes para revê-lo e nunca a distância fez com que deixássemos de nos sentir irmãos. Ele sucumbiu às exigências que uma sociedade fez a ele, e que ele acabou fazendo a si mesmo - a de ser médico -, tirando a própria vida. "Ele foi muito feliz no Brasil", disse a mãe dele na carta em que ela nos dava a notícia da fatalidade. E eu tenho certeza disso. Para você, meu irmão que virou a esquina, desejo muita paz, muita coragem e muita fé. Eu tenho certeza que as conversas que tivemos sobre a Espiritualidade enquanto você estava aqui na Terra - às quais você sempre reagia com um certo ceticismo - lhe serviram e lhe servem agora para apaziguar seu sofrimento e aguçar o seu entendimento da vida e da sua eternidade.

quinta-feira, 18 de novembro de 2004

Halloween

Tem uma professora no Instituto de Letras da UFBA, onde sou mestrando, que eu admiro muito. Ela conhece a área em que leciona como ninguém, e é muito bom ter um professor que de fato entende do que está falando – você se sente seguro, completo nas suas expectativas e ansiedades. Ser aluno dela seria um prazer indefinível, não fosse uma característica que quase anula todo o conhecimento que ela tem: ela é grossa, não tem quase nenhuma maturidade emocional e não sabe tratar com as pessoas. E isso é lamentável, porque todo conhecimento dela vai diretinho para o bueiro mais próximo, simplesmente porque ela não sabe tornar seus alunos de fato receptivos a todo aquele conhecimento. Corrigo: ela sabe sim, mas somente os alunos que de fato se destacam na matéria dela – que é muito difícil, diga-se de passagem. Esses são claramente tratados com uma diferença constrangedora. Eu, que não tive destaque – mesmo porque tratava-se de uma cadeira fora da minha área –, me senti por vezes tratado como um lixo. No início eu até achei que era impressão, e que eu estava apenas agindo como um menininho mimado. Mas não era: vi outras pessoas serem maltratadas também. Uma pena, uma grande pena.

Hoje tive de tratar com ela assuntos curriculares e mais uma vez ela usou de expressões tipo “meu filho”, que dita com uma entonação especial pode detonar a auto-estima de qualquer um, principalmente quando você está diante de alguém que você admira muito e, por isso, diante mão, já tem um certo poder sobre você, como é o meu caso. Mas não quero ficar aqui falando mal de ninguém, a intenção não é essa, mas eu tinha de escrever sobre isso, porque trata-se de algo que vem me incomodando há um ano, porque diante daquela mulher eu de fato me sinto o 'cocô do cavalo do bandido', e isso me incomoda. E eu andei me perguntando por quê. Encontrei a resposta na minha infância, quando eu sempre respeitei e temi excessivamente meus professores. Por considerá-los dotados de um poder especial (?), eu sempre os idolatrei de uma forma que os tornava 'inalcançáveis'. Tímido que eu era, qualquer olhar mais direto sobre mim me fazia tremer, gaguejar. Essa foi a relação que tive com meus professores até entrar na faculdade, pasmem! Neste momento, as coisas começaram a mudar, me sentia mais seguro e deixei a timidez de lado, aprendi a contestar, questionar e não ter medo de nenhum professor – porque o que de fato eu sentia antes era medo mesmo. Naquela época eu já estava me tornando um educador – estão sentindo aqui a complexidade da coisa? Pois então, anos depois de formado me bato de novo com este fantasma. O fantasma é o mesmo, mas está mais apaziguado. Sei contestá-la sim, sei perguntar e, apesar das reações dela, não me privo dos meus direitos de aluno (afinal, isso nem faria muito sentido para um homem de 30 anos...).É certo que na hora em que ela age dessa forma, a minha vontade – e não achem que eu não teria coragem pra isso – é a de perguntar porque ela me trata com aquele tom de voz, se ela tem algum problema, se ela é feliz, etc. Mas não posso, ainda não posso, principalmente porque ela não teria maturidade para conversar a respeito do assunto ou ter alguém que a contestasse tão diretamente – nesse mundo de universidades e de avaliações subjetivas, acho que vocês entendem que a última coisa que eu quero é alguém me perseguindo.

E fica a reflexão:o que faz a diferença, no exercício da minha profissão, é saber como lidar com emoções como impaciências, transferências, medos, ansiedades, quando você tem tamanha responsabilidade nas mãos. Um “meu filho” mal dito pode destruir a auto-estima de um aluno e condená-lo a nunca mais querer aprender inglês na vida, um tom de voz diferente pode gerar conflitos de tamanhos incalculáveis. Todos nós estamos suscetíveis a dias mais estressantes, dias em que a paciência está no limite, mas estamos lidando com vidas humanas, com sonhos em construção, com pessoas que se abastecem a cada dia com o nosso conhecimento e saber lidar bem com estas emoções é imprescindível. O compromisso de um educador é com a paz, com o bem-estar, com o ‘conforto emocional’ (termo que roubo de meu querido amigo mineiro Eduardo Galvão) de seus alunos. Para muitos – como para mim, como aluno – o professor é um herói dotado de super poderes – eu sei que de fato não é assim, mas essa é a metáfora mais próxima que eu encontro. Acho que só me resta agora rezar pela alma desta pobre criatura, e pedir a Nossa Senhora dos Educadores que dê a ela muita paz e serenidade para lidar com os desafios da vida.

Desculpem-me o desabafo e obrigado por me ‘ouvirem', mas vão se acostumando, porque o Diário Evolutivo também é um divã. (Ah sim, e fiquem à vontade para contar sobre as 'professoras-bruxas' que cruzaram seus caminhos... sou todos ouvidos, ou olhos, se preferirem.)

quarta-feira, 17 de novembro de 2004

Mãos ao alto, ou vai levar dendê quente nos cornos!!


Você já deve ter ouvido falar daquela lista de coisas que ninguém nunca viu e portanto são consideradas inexistentes: cabeça de bacalhau, enterro de anão e ex-viado. Pois aqui na Bahia existe uma quarta coisa, que é baiana assaltada. Aqui não tem ladrão macho o suficiente pra meter a mão no tabuleiro de uma baiana porque ela tem uma arma poderosíssima: dendê fervendo! Pois é, mas esse post não é sobre baianas assaltadas, mas sobre baianas que assaltam. E eu fui assaltado a quase mão armada na última semana em Stella Maris (praia local). Calma, não é que a baiana veio toda de branco com uma daquelas máscaras a la Irmãos Metralha e mandou que eu passasse tudo. Não é isso. Vou contar:

Eu estava em uma barraca na referida praia e para os que não conhecem a Bahia, é costume haver várias baianas de acarajé próximas a esses locais. Pedi um acarajé a uma delas e fui atendido na minha mesa. Comi o acarajé e algumas horas depois, surge uma baiana perguntando se eu queria mais alguma coisa:

- Quero sim, freguesa, quero te pagar logo.
- Foi com camarão, né? Dois e cinqüenta.

Saquei meus dez reais e esperei o troco, que veio, certinho. Meia hora depois, para minha surpresa, passa outra baiana:

- Viemos aqui pra fechar a conta.
- Como assim? Acabei de pagar a conta.
- O senhor pagou a quem, freguês?
- A uma das suas. Ta aqui ó, olha só o troco que você me deu.
- Eu mesma não. Vou ver se foi com a outra.

Não tinha sido com a outra. Pelo menos achava eu, na minha dispersão - já disse aqui que sou distraído e péssimo fisionomista?

- Deixa Vinis chegar então - disse eu, agarrando-me à minha última esperança antes que o acarajé de dois e cinqüenta passasse a custar cinco reais - mas o que é que pode ter acontecido? - pergunta eu, mais perdido do que cego em tiroteio com a tal da história.
- É que a outra baiana tem mania de fazer isso. Recebe por nós.

Ficou bonito pra minha cara. Eu não podia acusar ninguém, porque eu mal tinha olhado para quem eu tinha pagado e, se Vinis não lembrasse do ocorrido, teria de pagar novamente, porque eu não sou de acusar sem ter certeza. Avistei a minha possível salvação. Vinis apontou lá da escada e no olhar dele eu já sabia que ele sabia não só o que significava aquele auê embaixo do meu sombreiro, mas também quem era a baiana assaltante.

- Pode ficar aí que eu resolvo tudo. - falou, numa decisão virginiana.

Andou até a barraca, apontou o dedo na baiana ladra.

- Ei lembra que meu amigo te pagou o acarajé?
- Que hora foi isso? - perguntou a tal, com um ar pernóstico.
- Você não quer que eu te diga, quer? - ameaçou Vinis, estouradíssimo, já olhando na direção da bacia de dendê.
- Quanto a gente te deve? - interrompeu a 'baiana-mãe', oferecendo-se logo pra pagar.

Vinis recebeu o dinheiro e voltou para a barraca. Eu ainda fui lá e fiz várias perguntas, irritadíssimo, a tal da assaltante. E ela foi cínica e sarcástica. Que coisa feia. Imagine se é com um turista? Imagine se Vinis não tivesse lá? Mas isso não estragou o meu dia de sol. Aliás, nada, nem um acarajé de cinco reais poderia ter estragado. Porque eu acabei de lembrar de mais uma coisa que não existe: desperdiçar um dia de sol na Bahia por conta de uma baiana safada.

Meus amigos, meu orgulho. Apresentando hoje, VALTTER


Valtter é meu amiguinho mais artístico. Dançarino, diretor, escritor, coreógrafo, ator... foi ele quem escreveu, dirigiu e coreografou Joana D'Arc. Isso já é um grande feito, mas só que ele não pára por aí: no seu currículo já estão mais de 30 espetáculos. Ele começou a dançar muito novinho ainda. É carismático, inteligente, cheio de idéias a respeito das coisas. Meu melhor companheiro para eventos culturais. Sempre gosto de ouvir o que ele tem para dizer a respeito dos filmes e peças que a gente vê juntos - já aprendi muito com ele. Valtter é um amigo muito, muito querido e é com ele que eu vou, muito em breve, dividir apartamento. Vida longa a você, meu amiguinho!

O excesso de algo bom pode ser maravilhoso

Esse é uma foto tirada do interessantíssimo Flog da minha amiga virtualíssima Nanda. O IBOPE dela tem caído esses dias, o que é uma coisa totalmente injusta porque a página que ela escreve é deliciosa de ler. Clique aqui, dê um pulinho lá e delicie-se com o texto maravilhoso dessa minha querida amiga. E essa semana ela está cheia de novidades, publicando uma séries tipo "Recordar é viver". Imperdível!!

terça-feira, 16 de novembro de 2004

A velha janela


A tua fome se explica: é que ainda não vistes o mundo. Tudo o que conheces mora ali, na paisagem da janela em que te debruças todo dia. Há mais além daquele horizonte, há mais além do que pensas que vês. Para apoiar-te, há mais do que aquele parapeito . Há mais que aquela janela para abrires. Há mais paisagens para serem vistas do que aquela a que estás tão acostumado. Pegue a tua mala, recheie-a com teus trapos velhos, os de ontem, e parta em busca de trocá-los por novos. Na viagem, redima-te de teus velhos hábitos, abra novas janelas, investigue os teus mistérios. Mas não te tranques no primeiro conforto, não contenta-te com o primeiro novo amigo, não more na primeira paisagem. Faça do diverso o teu passatempo. Da novidade, gere o teu instinto, na instabilidade plante as tuas raízes. Por que em ti há o novo a ser desperto, mas, para tanto, precisas do acolhimento de um universo recente.

Daqui da minha janela que vê o mundo te observo, daqui dessa velha janela, esse velho homem cansado que muito já viu entende a tua esperança. Caminhe sem cessar, caminhe por que um dia terás de parar em uma janela e aceitar a paisagem que te contempla. Nessa hora este velho mais velho que o mundo só poderá te dizer as palavras inúteis, as palavras do tempo, as palavras dos sonhos estáveis.

- ... e porque um dia tudo acaba, não se pode sonhar sempre. Haverás de parar em uma janela e de lá contemplar o mundo que criastes.

- Mas a minha caminhada foi dolorosa, me custou muitas vidas, muitos nomes, muitos amores.

- De nada teria valido a tua caminhada se agora não pudesses me dizer essas palavras.

E aceitou a finitude dos sonhos, sua maior limitação humana. Preparou-se para o mergulho que daria nos mundos. Catou as esmeraldas do seu céu, traçou em um velho mapa seu destino, recolheu as tulipas do seu jardim - o que seria de uma viagem dessas sem tulipas vermelhas a lhe embelezar o caminho? - e partiu rumo à ultima janela que o esperava talvez no mesmo lugar de onde partira, talvez em outro. Vá saber.

Meus amigos, meu orgulho. Apresentando hoje, RITOCA



Ritoca é a minha coisinha horrorosa. Capricorniana de gênio forte, a gente se conheceu, em 1997, exatamente porque ela antipatizou com a minha cara (é que eu insistia em entrar numa conversa em que ela participava sem cumprimentá-la). Não demorou muito para ela me dizer logo isso na cara e sentar no meu colo nas baladas e se tornar uma grande amiga. Dançarina e atriz de mão cheia, Ritoca é daquelas pessoas corretíssimas - e é uma monstrinha no palco (foi ela quem interpretou Joana D'Arc, de que falo num post anterior). Foi com Ritoca que eu passei os melhores verões da minha vida (e muitos ainda virão), e era ela que levantava da cama exasperada quando eu dizia a frase mágica: "É verão e as coisas estão acontecendo". Essa minha amiga é aparentemente frágil, mas não queira vê-la comprando uma briga, porque o que ela tem de amável, tem de guerreira quando o negócio é defender a vida que ela criou.

segunda-feira, 15 de novembro de 2004



Cecília...

Esse teu corpo é um fardo.
É uma grande montanha abafando-te.
Não te deixando sentir o vento livre
Do infinito.
Quebra o teu corpo em cavernas
Para dentro de ti rugir
A força livre do ar.
Destrói
mais essa prisão de pedra.
Faze-te recepo.
Âmbito
Espaço.
Amplia-te.
Sê o grande sopro
Que circula...

(Cecília Meireles)

Minha homenagem a Cecília Meireles, a poetisa que falou da liberdade, falou das potencialidades humanas e falou principalmente de Deus como eu nunca vi nenhum outro poeta falar. Dia 9 último, fez quarenta anos da sua morte.

Original da Bahia

Estar na Bahia e passar uma tarde em Itapuã, e depois comer um acarajé em Cira, de sobremesa um bolinho de estudante, ver aquela bagunça deliciosa que é o lugar, depois tomar um suco de jaca mole, passar pelas ruas estreitas e mal-iluminadas do bairro e ver aquele monte de mulher requebrando ao som dos pagodes, os negros, os brancos, os turistas, todo mundo misturado. Quem mora aqui já acostumou, mas basta um olhar mais distanciado para notar a originalidade do cenário. Hoje passei mais uma tarde em Itapuã. E não é a primeira vez que falo desse lugar aqui. Poderia estar falando do Pelô, ou do Bomfim, estes lugares mágicos onde a baianidade está tão presente. Leia e vá imaginando a cena:

No ar um cheiro forte de dendê, sons se misturam, carros buzinando, entro na fila e peço um abará com camarão e um bolinho de estudante (iguaria feita de tapioca, coberta com açúcar e canela). Quem me despacha é uma senhora coberta de ouro. "Ela só usa ouro 18", me informa um amigo. É a própria Cira, a baiana-mito de Salvador - junto com Regina e Dinha. Quatro reais a minha conta. Recebo fichinhas de acrílico e entro na outra fila, onde estão pelo menos cinco assistentes de Cira, uma delas me lança um sorriso e grita. Pode vir, você é o próximo.

- Um abará com vatapá e camarão, freguesa. - faço o meu pedido.
- Podexá.

Enfia a faca num caldeirão com diâmetro de quase um metro, pega o bolinho amarelo com uma habilidade de malabarista, num gesto retira a folha de bananeira que cobre a iguaria. Parte ao meio. Uma colher cheia de vatapá recheia o espaço aberto entre as duas partes. Mais outra. Depois os camarões - enormes, secos e cobertos no dendê. Fecha tudo num embrulho de papel rosa.

- Tá aqui freguês. Próximo!


E mais uma cena no ritual de todos os dias da semana das baianas se repete. Já caiu no normal para pessoas que, como eu, não dispensam um acarajé ou um abará num final de tarde. Mas é uma cena linda. Linda porque é uma cena que só acontece aqui. Podem até tentar fazer acarajé em qualquer outro lugar do mundo, mas o original está aqui. Existem, por exemplo, réplicas da Torre Eiffel em Las Vegas, mas para ir à Torre Eiffel mesmo, só indo para Paris. E a Bahia é mágica por isso. Porque é original. Podem imitar o nosso carnaval, podem até convidar os mesmos cantores para o lugar que for, mas só vindo aqui para ver, por exemplo, Ivete, ou o Olodum, ou o Ilê, ou Daniela Mercury, no lugar onde tudo começou.

Sentei-me no barzinho, comi tudo, camarão por camarão. Enquanto eu comia, observava aquele cenário. A globalização está aí, a Internet está aí. Bush está aí. E Itapuã continua ali, intacta, ignorante do tempo, mergulhada em seu caos, em seus cheiros de marezia e dendê, distanciada dos avanços, dispersa, única nesse mundão de meu Deus.

domingo, 14 de novembro de 2004

"Ela voltou... e agora vai falar."


Meu amigo Antônio Valtter Leone explora os paradoxos das crenças humanas - muitas vezes criados pela falta de reflexão acerca do que já estabelecido - no seu novo espetáculo, Joana D'Arc, que estreou ontem no Teatro Diplomata (Patamares, Salvador-BA) e fica em cartaz apenas até hoje, domingo.
No seu novo espetáculo, que trás, aliados, teatro e dança, Joana D'Arc volta à Terra nos nossos dias e propõe seu rejulgamento. O texto denso e provocador de Leone, linda e visceralmente interpretado por Rita Leone, expõe uma Joana D'Arc com uma voz que pede liberdade, que pede uma nova reflexão, que clama por justiça. "Eu não quero ser santa", grita a personagem diversas vezes durante a montagem, negando uma condição que lhe foi praticamente imposta pela mesma Igreja que a levou para a fogueira 500 antes da sua canonização. É a fala de uma heroína que teve a chance de voltar, numa metáfora perfeita que simboliza um grito contra a hipocrisia e as imposições a que estamos submetidos pelos diversos dogmas com os quais convivemos.
Rita Leone está simplesmente linda e para espanto de muitos que não a conheciam pessoalmente, cresce de forma espantosa no palco, impondo à sua personagem brilho, carisma e força - características marcantes da heroína. Minha amiga Iara, na coordenação geral, dá um show com suas caras e bocas e a incrível capacidade de contornar sufocos, receber os convidados como se estivesse na porta de sua casa - todo mundo se sente especial e particularmente bem-vindo - e fazer a Cia de Dança brilhar. Foi uma noite maravilhosa, que culminou com uma resenha geral na Cantina Montanaro, num delicioso rodízio de pizzas onde o assunto principal não poderia ser outro: Joana D'Arc. Pra quem mora em Salvador e curte teatro, dança e reflexões acerca do mundo e das coisas, não perca.

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E o jantar me fez pensar numa coisa: ser garçom em restaurantes de rodízio é uma profissão que pode simplesmente destruir a auto-estima de uma pessoa. Quando os clientes chegam, o garçom é o salvador de suas vidas. A fome é tanta, que ele é o grande herói, "venha até nós", todos clamam. Uma bela metáfora da paixão, porque assim que estão saciados, a mera presença daquela pessoa de branco com gravatinha preta já dá mal-estar. E a natureza do seu trabalho o impede de parar de oferecer; ele quer que você coma, mas você diz não, você o renega. E o pior é que o seu não é irreversível - não adiantam insistências (pelo menos nas próximas duas horas). Ele te dá opções maravilhosas, sobremesas, mais um pedaço de picanha - porque, apesar de ser rodízio de pizza, a carne também ta incluída - , mas você olha para ele com o ódio típico dos saciados e diz um sonoro 'não'. Eu não agüentaria. Seria demais para a minha auto-estima.

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E pra quem não leu ainda a segunda parte da saga da gordinha, é só descer a página só mais um pouquinho e ver o que achou.

sábado, 13 de novembro de 2004

La Mala Educación


Finalmente estreou "Má Educação", o mais novo filme de Almodóvar. Saí estupefato. Sou suspeito para falar de Almodóvar. Gosto de todos os filmes dele, sem exceção. Desde a época em que ele era trash mesmo, até os mais recatados e emocionantes de seus filmes, como "Fale com Ela".

Nesse ele dá um banho de competência, principalmente na elaboração de um roteiro complexo e intricado, cheio de idas e vindas. O elenco foi, mais uma vez, escolhido a dedo e com paixão pelo diretor. Gael García é fotografado pela câmera de Almodóvar com a maestria de quem entende onde estão as reentrâncias da sensualidade do rapaz. Vê-se ali, nas cenas em que o ator se desnuda - não no sentido mais literal, mas no sentido mesmo da aura sexual do personagem -, que quem está por trás da câmera é um gay. Filmes com essa temática não têm, obviamente, que ser dirigidos por um gay para ter a pungência deste, mas é inegável que, no caso de "Má Educação", esse foi um toque de requinte.
(e hoje tem estréia de Joana D'Arc, novo espetáculo do meu amigo Valter Leone. Teatro Diplomata, 21h. Imperdível)

Reveillon, farofa e perfume francês - Parte II (Final ?)

(Na primeira parte, a nossa protagonista estava no bem bom do ar-condicionado da Cherokee de Ariele, seu sonho de consumo, quando de repente seu mundo caiu: o carro de Lourdes, a namorada traída, estava emparelhado com o dela. Parecia que, para pagar a própria língua, a gordinha estava prestes a enfrentar a pior enxaqueca de sua vida.)
Sem desmentir a sua fama de barraqueira, Lourdes gritou do seu carro, não só para a nossa heroína gordinha ouvir, mas para quem mais estivesse de ouvidos bem limpos nos arredores:
- PARE ESSA PORRA AGORA!!! TÁ PENSANDO QUE EU SOU OTÁRIA, É? QUEM É ESSA VAGABUNDA QUE ESTÁ COM VOCÊ? ENXAQUECA, NÉ? ENXAQUECA MEU C...
- Calma, Lourdes. Eu... eu tava...
- CALMA O CARALHO... QUEM É A PIRANHA?
- Que piranha o que, Lourdes? É só uma amiga – contestou, fazendo caras e bocas.
Ariele, atônita, parou o carro no acostamento. Viu a cena aterrorizada. Nunca, nunca em sua vida inteirinha tivera de passar por tamanho constrangimento.
- Lourdes se acalme criatura, abafe que eu vou te explicar tudo...
- EXPLICAR? HÁ, HÁ, HÁ! VOCÊ NÃO CONSEGUE NEM FALAR DIREITO. OLHA AQUI, NUNCA MAIS APAREÇA, NUNCA MAIS OLHE NA MINHA CARA, OUVIU? SUA... SUA... TRAÍDORA AZARADA!
Virou-se para Ariele. O que viu foi o oposto de minutos atrás. Ela estava transfigurada, estupefata. Mesmo assim, não perdeu a classe.
- Como é que você me faz passar por uma situação dessas? – disse a voz trêmula, mas decidida de Ariele.
- Minha linda não é nada disso...
- Tsc, tsc. Tchau. Eu não preciso passar por isso.
E partiram, Lourdes e Ariele. Nossa indefesa protagonista estava agora no meio exato de uma avenida enorme, sozinha, sem um tostão no bolso. Aquela que seria a noite da sua vida acabou se transformando num pesadelo.
- Você por aqui? - alguém gritou de um carro.
- Pois é, bicha. Abafe!!! Tô aqui esperando um amigo que até agora não chegou - respondeu, super constrangida.
E assim se passaram minutos e mais minutos. Várias conhecidos passavam e faziam a mesma pergunta a ela. E para cada um ela dava a mesma resposta. Todos fingiam que acreditavam e continuavam o percurso.
Como uma coisa dessas pode acontecer comigo, pensava, com os botões da roupa que esvoaçava cada vez que um carro passava por ela. O constrangimento não podia ser pior: plena virada de século, toda de branco, sem um real no bolso, sem celular e com a cidade inteira de conhecidos passando e falando com ela. Que vergonha, meu Deus.
E eis que aparece a sua salvação.
- Você por aqui? Entra aí, o ano já vai raiar. Te dou uma carona.
Àquela altura fazer o quê? A nossa heroína entrou no Fusca 1980 de um velho amigo taxista. O cheiro de gasolina dentro do carro neutralizou na mesma hora o seu perfume francês. As outras cinco pessoas - a família de seu Dermeval - se espremeram na maior boa vontade para abrigá-la. Ela não pôde deixar de notar o olhar lascivo do filho mais velho de seu Dermeval, Laurindinho, e a protuberância nas calças do moleque. “Onde eu fui me meter, Senhor?” E lá foram eles. Destino: Praia do Farol de Itapuã. Toalha no chão, galinha assada, farofa, vinagrete e muita cerveja – para os que não bebiam, como ela, Fanta uva. De Itapuã ela olhou em direção ao norte; eram os fogos. Ariele devia estar lá a essa hora.
Interrompendo seus pensamentos, o filho mais velho de seu Dermeval se aproximou, lançou-lhe um olhar de desejo e, todo atencioso, disse:
- Aceita a coxa do frango?
A gordinha, aterrorizada diante da ameaça que seria passar a a noite ao lado de Laurindinho, caiu em si. E percebeu, para seu desgosto, que o novo século estava apenas começando.

sexta-feira, 12 de novembro de 2004

Reveillon, farofa e perfume francês - Parte I


Ela estava toda cheia de si. Cheia quase estourando de tanta felicidade. Teria o melhor de todos os reveillons. Era a virada do século - na realidade não era, porque o ano era 1999 e o próximo ano, 2000, é que na realidade seria o último - mas isso não importava. Ela passaria o ano novo em grande estilo: roupas brancas folgadas e esvoaçantes - bem à sua maneira de gordinha sexy - perfume francês gritando aos quatro cantos, e estreando: saltos altíssimos - meio a contra-gosto, é bem verdade, mas esses sacrifícios valeriam a pena pela companhia, afinal de contas ela queria mesmo era impressionar Ariele. Quantas vezes ela não tinha ouvido e cantado como um mantra aquela música de Caetano que Cássia Eller gravou ("tenho que pegar tenho que pegar, essa criatura..."). Quantas vezes ela já não tinha se atirado numa pista escura atrás de Ariele. Ariele era o seu sonho de consumo: mulher fina, madura e decidida, vida financeira estável, alta sociedade, lesbian-chic. Não lhe faltavam qualidades e por essas e outras mais é que ela sabia que aquela seria a noite.

Às 21h00 já estava no chuveiro, às 21h30 teve de interromper o banho demoradíssimo para atender o celular. Era a tal, e estava tudo certo. Dentro de uma hora Ariele pararia a Cherokee preta reluzente em frente ao apartamento dela e partiriam juntas rumo à grande festa. Às 22h00 já estava nos cremes, depois nas várias baforadas de perfume, depois na meia, nos brincos, na roupa, no penteado, no batom. Nada de bolsa, celular ou dinheiro. Ela precisava apenas de seu ingresso para a festa - onde tudo já estava incluído. Desde a champange até a ceia. Não tinha como não ser a noite de seus sonhos. Lourdes, a namorada oficial, estava remediada. Ela não agüentava mais seu temperamento forte e decidiu que daria o zignal. Horas antes ela inventou uma terrível dor de cabeça e disse à federal que ficaria em casa, isolada, mas seria melhor assim. Com enxaqueca não se brinca.

22h45. Com alguns minutos de atraso, chega Ariele. Nossa protagonista detesta atrasos, mas deve ser chique, pensou. Vindo de Ariele, ela perdoaria qualquer coisa. Entrou no carro.

- Cheirosíssima - observou Ariele, olfato refinadíssimo.

- Que nada. Só um perfuminho básico para não perder o costume.
- Você está linda. Deslumbrante.
- Você achou? - respondeu, timidamente.
- Pronta para o ano 2000?
- Com você, estou pronta pra tudo.

22h55. Rumo à grande avenida que as levaria para o sítio, local da grande festa. 23h00. O trânsito parou. A avenida que as levaria até a pomposa festa gay estava lotada de carros. Será que daria tempo? Tanto faz. A presença de Ariele já é uma festa, pensou ela. Confusão enorme, pessoas gritando, buzinas... mas nada a tirava de sua concentração: ela estava com Ariele, só elas duas. As pernas já se encostavam uma na outra, um olhar de cumplicidade já dizia o que as esperava. O ar-condicionado e os vidros fechados do carro faziam-nas sentir-se isoladas, alheias ao mundo lá fora.

23h15. Uma buzina que não pára do lado do carona. A motorista ao lado insiste. Buzina mais, e mais e mais. Ela abre o vidro. E seus olhos incrédulos, maquiados como nunca estiveram antes, se cruzam diretamente com o olhar mais ameaçador que já tinha visto. Era Lourdes.
(a saga da gordinha continua amanhã aqui, no Diário Evolutivo - porque rir também é bom pra o espírito)

quinta-feira, 11 de novembro de 2004

As onze horas e o amor de uma vida inteira

" O amor é a vida acontecendo no momento: sem passado, sem futuro, presente puro, eternidade numa bolha de sabão."
(Rubem Alves)
E entregaram-se um ao outro num gesto de gratidão. Os olhos se agradeciam a visão daquele momento. Era como se devessem um ‘muito obrigado’ ao universo por tê-los posto um no caminho do outro naquele instante – e era acalentador saberem que sempre dividiram o chão do mesmo mundo.

- O que está acontecendo comigo? Você deve estar brincando com essa situação toda. As perguntas eram de incredulidade. A complexidade do momento lhes levava a dúvidas e incertezas. O que acontecia ali não pertencia à esfera dos sentimentos simples. Numa hora dessas, humanos que eram e acostumados que estavam às sentimentalidades instantâneas, não havia outra reação disponível.

Não demorou muito – mesmo porque não tinham mais do que onze horas pela frente - para começarem a acreditar no encontro. Não trocaram juras de amor por pura falta de palavras, não marcaram o próximo encontro porque faltava ao momento esperança, porque o amanhã deles ia ser em lugares distintos. Fotografavam-se com a ansiedade dos momentos breves, contavam nos relógios como prisioneiros que esperam a forca, como o marinheiro que espera a hora de zarpar e deixar pra trás outro cais, como mãe que espera o parto.

Ao fim de onze horas o encontro acabou, os olhares partiram pra distante. Ficou a memória e a questionável certeza de um dia se verem de novo. Alguma coisa tinha mudado, e eles sabiam, lá no fundo, que em cada uma das suas almas uma ferida se abrira e outra tivera sido estancada (como tudo na vida, um grande amor segue também a lei das compensações).

Um sentou-se no avião. O outro, voltou ao estacionamento e pegou o carro (não pôde deixar de sentir um cheiro diferente no ar). Um voou para seu mundo de chocolates e frio intenso e ruas limpas. O outro, que naquelas onze horas nem sequer tinha tirado os pés do seu próprio mundo, cenário daquele encontro, só precisou sair do transe e viajar de volta à realidade. Uma vida seguiu um rumo. A outra continuou no mesmo rumo. Agora, o que lhes restam são dois pensamentos em um, dois momentos em um, duas pétalas na mesma tulipa. O que lhes restam são dois sonhos que hoje partilham, apenas, o mesmo universo.

(Mas ainda há a esperança, e não esconderei de vocês a notícia do novo encontro. Porque na vida das incertezas, só o amor pode ter razão e paciência, só o amor reconhece o impossível como possível. Porque a chave de suas esperanças está em dividirem o mesmo céu, por vezes estrelado, por vezes azul, por vezes cinza. Mas o mesmo céu, do mesmo universo.)

Meus amigos, meu orgulho. Apresentando hoje, TOM


Tom é o mais antigo dos meus amigos. Há 12 anos eu conheço esse aquariano cheio de amor pra dar, com um humor delicioso. Considero ele o criador de muitas das minhas palavras, ele foi a influência certa, no momento certo. Quando eu tinha 20 anos e a vida começou a acontecer para mim, foi nele que eu me espelhei, foi nele que eu vi o que eu queria ser, foi dele que eu aprendi a tentar ser quem eu de fato sou. Tom me recebeu e me recebe todos os dias com um gesto de abertura, de carinho e de admiração - porque não existe amizade verdadeira, nem amor, sem admiração mútua. Hoje as nossas vidas e os nossos dias coincidem menos, apesar de trabalharmos no mesmo lugar, mas amizade como a nossa não se mede pela quantidade de palavras que trocamos, ou pelo tanto de vezes que nos vemos. A nossa amizade se mede pela emoção que sinto agora, ao escrever estas palavras para ele.

quarta-feira, 10 de novembro de 2004

Educação, família e Marcelos

Lia hoje o “Ponto de Vista” da Veja, escrito, esta semana, por Cláudio Moura de Castro. O assunto - educação - muito me interessa. Ele argumenta a favor de uma participação mais intensa da família na vida escolar de seus filhos, atitude comum em países orientais como a Coréia, onde os pais acompanham de perto o desenvolvimento de suas crianças na escola. Não tenho filhos, mas sei, como professor, da importância da família no processo educativo deles. Essa questão gerou uma discussão em uma das minhas turmas da pós-graduação (no UEC), que, de tão intensa e abrangente - aliás, as nossas discussões são sempre muito boas -, me fez refletir junto com eles sobre o papel do professor neste processo todo que é a educação. Lembrei então de um episódio com um aluno, Marcelo (nome fictício), que já chegou na minha turma com uma fama de problemático, de que falava muito português na sala, que já tinha tido diversos problemas com professores anteriores, etc. Eu ouvia tudo aquilo, lembrando, humildemente, que nesses 12 anos de experiência estou cada vez mais craque em conquistar este tipo de aluno. E as palavras-chave são afetividade, amizade, amor e crença na capacidade que todo mundo tem. Depois de dois meses de aula, posso afirmar que Marcelo é um bom aluno; você sente que existe comprometimento e que o respeito que ele tem por mim não surgiu de uma contestação ou de um choque – surgiu e se estabeleceu simplesmente porque ele foi tratado de igual para igual, de amigo para amigo. Não precisei, em nenhum momento, chamá-lo para uma conversa mais séria. Tentei apenas mostrar pra ele a seriedade do que eu faço e do que eu espero que ele também faça e dei a ele um voto de confiança. Hoje, a turma se surpreende com a desenvoltura dele e sei que isso tudo aconteceu apenas porque escolhemos traçar um caminho harmonioso. Eu escolhi ver o menino de boa índole que existe em Marcelo, escolhi descobrir que caminhos ele preferia percorrer, dei a ele opções e ele, obviamente, agarrou a que mais lhe agradou. Ele teve um professor que de cara se apresentou como aliado e amigo dele. E tem dado certo.

Se os Marcelos - dos quais as salas de aula estão cheias – forem tratados com mais compreensão, de igual pra igual, se o professor entender que eles têm que ser seus aliados e não seus oponentes, talvez o caminho para a família seja facilitado. E mesmo os pais mais distantes se surpreenderão com o filho mais rebelde não só pedindo, mas exigindo que eles desliguem a televisão e o ajudem a preparar aquela apresentação ‘incrível’ sobre Bob Marley que ele fará no curso de inglês amanhã.

O melhor comentário de ontem

(por Luíse)

"Se a Veja Salvador tivesse um dispositivo de pop-up, minha cara tava toda marcada! "


(depois dessa não preciso nem dizer que a Veja tava grossinha era de tanto anúncio)


A conflitante história do bem-te-vi despertador e do homem que sucumbiu à sua ordem.

Despertei hoje, depois de um cochilo vespertino, com um bem-te-vi gritando lá do lado de fora.

“Acorda pra vida Leo”, dizia o bem-te-vi, na sua linguagem de bem-te-vi, que só quem está em estado de leve delírio por estar acordando entende.

Ele gritava de lá, e eu de cá tentava não entender aquele aviso. Revirei na cama, tentando escapar do convite-quase-ordem que aquele pássaro deixava escapar dos bicos.

“Levante-se”, insistia. A vontade foi de levantar, ir até a janela e falar do meu gosto pela liberdade ou de como eu me sentia merecedor daquele sono. Mas aquele bem-te-vi não aceitava argumentações. Foi breve no seu grito, foi fiel na sua insistência, foi mestre da sua crença. E eu, que sempre fui tão dono dos meus sentidos e ainda mais dos meus direitos, baixei a cabeça e sucumbi ao poder do pássaro. Levantei-me, retomei o trem da tarde, abri os olhos e encarei o resto da terça-feira. Essa vida de blogueiro tem me deixado delirante.

Meus amigos, meu orgulho. Apresentando hoje, IARINHA


Já comentei da minha 'gordinha flex' (assim ela se autodenomina) no Fotoblog, mas dela não me canso de falar. Minha melhor e mais querida amiga, é a que mais me entende, porque ela me entende com o coração e não com a mente. Iarinha é incompreendida e dada por 'louca' (fico na dúvida se devo colocar as aspas) por muitos, porque ela não vive com a cabeça, ela vive com o coração. Para ela não tem tempo ruim: toda hora é hora. Só que é ela quem faz a sua própria hora, seu próprio momento. Como um cavalo selvagem, não se deixa domar. Completamente descontrolada, é a pessoa que eu conheço que mais tem histórias hilárias e inacreditáveis para contar (agora penso que um blog com as histórias dela seria um candidato a campeão de audiência).
Iarinha é pura paixão pela vida, pura paixão pela loucura, pura paixão pelo momento. As horas se perdem se tentam encontrá-la, porque ela não é desse mundo, desse tempo, desse caos.

(Nesta foto, um flagra de um dos milhões de sustos que já dei nela. Devo admitir que peguei pesado e soltei uma bombinha de São João nos pés da minha gordinha).

terça-feira, 9 de novembro de 2004

Vontades teimosas

Vontade de comer panetone e ganhar um presente de Natal depois de um cochilo vespertino em pleno fevereiro, vontade de estar numa praia de sol escaldante e o mês é junho, vontade de ser sexta feira, e ainda é segunda, vontade de sentir o calor do corpo do meu amor junto ao meu, mas a distância não deixa, vontade de ver um velho amigo que está em Londres, vontade de ver a carinha do bebê e o mês ainda é o quarto, vontade de ligar quando o telefone tá ocupado, vontade de comer o bolo que ainda está no forno, vontade de comer jaca dura em junho, vontade de sentar à mesa com a minha vó e perguntar como vão as coisas, vontade de bater um longo papo com Clarice, vontade de estar na Suíça, vontade de ver o filme que ainda não estreou, vontade de dormir cedo, vontade de sentir frio em janeiro, de ir à praia de pé quebrado, de comer chocolate na dieta, de dormir até tarde na segunda. Vontade de não parar de sonhar, vontade de viver num sonho, vontade de ver o futuro, vontade de mudar as coisas. Vontade teimosa essa.

Dando uma de colunista

  • Saiu a Veja Salvador. Das duas uma: ou aumentaram muito as opções de lazer do ano passado para cá, ou a edição tá lotada de anúncios. Só sei que a revista veio bem gordinha esse ano. Já, já vou abrir e conto pra vocês.
  • Segundo informa o XXXIV - Resistindo Bravamente, os americanos agora estão pondo o serviço secreto pra investigar até os blogs. Não se espante se o FBI tocar a sua campanhia às 2h da manhã por causa daquele comentariozinho maldoso que você fez ao Grande Buxa.
  • Saiu - e eu vi na Veja desta semana - uma coletânea em DVD que cobre a carreira de Marisa Monte de 1989 a 1996. Imperdível.
  • Assisti neste final de semana ao filme “Os esquecidos”. Esqueça o roteiro e concentre-se na habilidade do diretor em meter sustos e na belíssima atuação de Julianne Moore. Impagável.
  • E sexta que vem estréia Má Educação de Almodóvar. Neste filme ele ataca a Igreja Católica através de uma história que envolve abuso sexual de menores por padres. Estarei com a cara grudada na tela na primeira sessão.
  • Vale a pena dar uma espiadinha no Coisas Boas da Vida, da minha amiga Analy, principalmente se você curte os desenhos dos anos 80. Na semana que passou ela fez uma retrospectiva interessantíssima: He-man, She-ra, Caverna do Dragão, Smurfs e por aí vai. É só clicar.
  • O post de ontem sobre rotina deu muito o que falar. Muita gente concordou e muita gente discordou. É essa a intenção.

Meus amigos, meu orgulho. Apresentando hoje, HENRIQUE


Conheci Henrique na pilastra de uma boate, em 2002, quando eu morava em BH. Isso mesmo. Foi na pilastra de uma boate que esse mineiro me conquistou. Primeiro o sorriso, depois o olhar brilhante (que só os apaixonados com a vida têm), depois o andar de um bonequinho do PlayMobil, depois a amizade sincera, o otimismo, a alma pura. Henrique é o único dos amigos que eu tenho que não fala uma letra sequer a respeito de outra pessoa - falo aqui é de fofoca mesmo. Qualquer ser humano, na média, sempre fez um comentariozinho aqui e ali. Ele não. Henrique claramente já superou isso (vai ver que em uma dessas encarnações ele teve a língua cortada por excesso de fofoca e a lição lhe valeu), e tenho aprendido muito com ele. Agora, lhes aviso: tem dias em que ele está dando choque. Isso mesmo que você leu: tem dias que a energia que emana de seu corpo é tão forte que ele solta descargas elétricas. Mas agora ele já ta trabalhando isso. Está estudando Reiki e vai ser um terapeuta daqueles que a Companhia de Energia Elétrica vai querer ter sempre a postos para qualquer emergência.

segunda-feira, 8 de novembro de 2004

Robôs



Tenho um amigo que vai ao mesmo restaurante desde criança e sempre pede o mesmo prato. Isso lhe deixa seguro. "Esse prato não tem erro", pensa ele. Esse, pelo menos em termos de restaurantes, prefere o de sempre. Vi o absurdo e um dia tentei mostrar pra ele um prato novo; ele arriscou, pediu, gostou. Mas ficou nisso: no outro dia, automatizado como um robô, se surpreendeu ao ouvir a própria voz pedir o velho prato. O robô que lhe habita acabara de dar-lhe outra rasteira.

Você passa os seus finais de semana fazendo o quê? Você de repente se pegou dizendo que queria fazer algo diferente? Eu já. Com o tempo, a gente se acostuma com os mesmos roteiros e se priva de coisas que poderiam dar um toque especialíssimo aos nossos dias. É certo que eu adoro rotinas, elas me deixam seguro, tranqüilo, afinal de contas a familiaridade que a gente tem com certos lugares já é, pelo menos a principio, uma garantia. Mas não quero apenas garantias para a minha vida. Quero riscos. Quero arriscar um passeio de trem pelo subúrbio, uma visita a uma rua que nunca fui. Um mergulho no mar de Amaralina, ou um passeio de bicicleta pelas ruas do Caminho das Árvores. Quero ir à Ribeira e pedir, nem que seja somente uma vez, um sorvete que não seja de tapioca. Quero comer ensopado de tatu no domingo à noite e desautomatizar o pedido de pizza, quero dormir cedo no sábado e acordar antes do meio-dia no domingo. Quero pegar um ônibus para uma cidade que não conheço, dormir em uma posição diferente. Quero as novas sensações, apesar de não estar cansado das velhas. A alternância do novo e do antigo poderia ser excitante. Mas não: me acomodo no de sempre. Preciso da ajuda do Deus da Mudança. Preciso de um choque, preciso que me tirem daqui este robô. E por que em tantos momentos da minha vida eu me reviro e me embaralho e me refaço e atendo a chamados de outras vozes, não posso cair nas armadilhas dos velhos hábitos.

(...por sinal, neste final de semana eu dormi cedo no sábado, mas não resisti ao velho mergulho no Porto da Barra. Um dia troco de praia. Pelo menos por um dia.)

Meus amigos, meu orgulho - Hoje, apresentando VINIS


(Meus amigos, meu orgulho. Todo dia, ou quase todo dia, um amigo meu é a estrela. Se você conhece, diga se concorda com a descrição. Se não conhece, talvez um dia conheça, aí você já terá meio caminho andado...)

Vinis é o primeiro. Esse é o jeito que só eu chamo ele. Outros tentam imitar, sem sucesso. Essa alcunha é só minha e acabou. Conheci Vinis em outubro de 2001. Ele era um baiano morando no Rio e eu, um baiano visitando o Rio. No entanto éramos, no Rio, dois baianos que tinham morado na Cidade Baixa, em Salvador, e estudado na mesma escola, o São José. Resultado do encontro: afinidade imediata. E até hoje, agora com ele mais próximo do que nunca, morando em Salvador, somos grandes amigos. É um dos amigos que me agüentam nas piores horas com um sorriso no rosto. É um virginiano elétrico (meu pai até o apelidou de Foguetinho), cheio de intuições e tem um olho microscópico para detalhes. Um dos poucos amigos que tenho que viaja para a casa de praia de minha família sem mim - a maior prova de sua capacidade de se dar. Sua maior qualidade é a capacidade de vibrar imediatamente com quem lhe provoca afinidade. Ele vibra, você entra na vibração e em menos de dez minutos já sente que pode ter um amigo. Tem muito amor pra dar e tenho certeza que sua hora de encontrar um grande amor 'tá na beira', como ele adora dizer.

sábado, 6 de novembro de 2004

Super poderes



Hoje vou falar de Amor. Vou falar de Amor pela ótica do poder, da proteção. Vou falar de amor como uma arma. Não das armas que disparam contra o outro, mas arma que se rende ao outro e ao mesmo tempo se protege. Uma arma que não ataca, mas por si só dá abrigo. Uma arma que não lança contra, mas atrai para si e transforma o 'oponente' - aqui entre aspas porque para o Amor não há oponentes - pelo seu poder de transmutação.
Nos desenhos animados que envolvem personagens com super-poderes, sempre achei muito interessante a invencibilidade dos heróis. Que super-poderes são aqueles que dão aos heróis da Liga da Justiça, por exemplo, tanta invencibilidade? Quem nunca sonhou em ser um deles pelo menos um dia na vida? Pois então: podemos ser super-heróis. O Grande Poder está abundantemente disponível e facilmente accessível a todos nós. O Amor não é algo abstrato, impalpável. Amor é ação, é proatividade, é reação não-ofensiva, ou seja, aceitação. Quem ama de fato, sabe que não há nada do que se defender, porque não há nada para ser perdido. Nada se perde, há bastante de tudo. Quem entende isso, entende o que JC quis dizer ao sugerir que déssemos a outra face, quem entende isso sabe porque certas pessoas parecem inatingíveis na sua força, entende de onde vinha tanta energia em pessoas como Irmã Dulce, Chico Xavier, Madre Tereza, Gandhi. Quem entende isso sabe agora porque certas pessoas transmitem uma paz inexplicável. Quem captou este mistério agora entende aqueles momentos de felicidade e emoção inexplicáveis ou de alegrias-sem-razão-de-ser-aparente que nos invade em certos momentos da vida (porque todo mundo já experimentou, pelo menos uma vez na vida, esse Amor com letra maiúscula de que falo aqui). Quem não só sentiu, mas de fato experimentou nem que seja por alguns milésimos de segundo esse Amor, sabe o que é ter super-poderes. Já se sentiu inabalável, invencível, poderoso, mas acima de tudo extremamente humano. Esse é o paradoxo do Amor. Quanto mais invencíveis, mais humanos, mais humildes. E nesse paradoxo mora o segredo dessa arma poderosa. No estágio de evolução em que a maioria de nós estamos, o Amor e o Poder são tidos como incompatíveis. Para a grande maioria de nós, seres de visão ainda estreita, é muito difícil entender que o Amor abre mão do Poder para de fato possuí-lo. Porque alguém já disse um dia que amar "é um dar-se de graça" (...).
Os super-heróis que confundiram o Poder com o Amor, ou foram incapazes de viver no paradoxo, se tornaram vilões. E nós nos tornamos vilões de nós mesmos quando tentamos aprisionar, deter, limitar o Amor. Quem aprisiona, detem e limita o outro não está de fato amando o outro. Está, através do Medo, se protegendo do mundo, ao invés de, através do Amor, proteger o mundo. Isso é o que um super-herói de verdade faria.

Piadinha atrasada

Sei que a hora já passou, mas vi esse quadrinho na Newsweek e não resisti. Tinha de publicar.



sexta-feira, 5 de novembro de 2004

Silêncio, por favor



"Morrer é apenas virar a esquina e deixar de ser visto" (Fernando Pessoa)
Esta é minha homenagem a Alex, um cara com certeza muito especial, porque teve de virar a esquina mais cedo. Certamente, lá do outro lado estão precisando mais dele. Não o conhecia bem, mas freqüentávamos os mesmos lugares, tínhamos a mesma legião de amigos e conhecidos. Ratifico aqui a minha fé na vida, desejando a você, Alex, muita paz, tranqüilidade e coragem nessa sua transição. E, para nós, que ficamos, lembrar sempre que "de repente se morre". Portanto, a hora de dar a grande virada é agora. Estar aqui é um grande privilégio, um presente, e porque não abri-lo logo e agradecer sempre por esta dádiva?

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(Shhh... isso que vem será dito para você num sussurro; não quero quebrar a paz e o silêncio que emergem nesse dia)

... e por falar em transição, em vida e morte, hoje pensei muito na minha Espiritualidade. Nessas horas de dor, de choques (porque a gente sempre acha que jamais acontecerá com um dos nossos), é normal que as pessoas se voltem mais pra dentro. E vejam que falei voltar para dentro, como quem diz: silenciar-se. Espiritualidade para mim é isso: saber calar, saber estar só e ao mesmo tempo acompanhado pelo mundo inteiro. É estar interligado a tudo e a todos através de um elo de luz, que não faz perguntas nem cobra respostas. E eu tenho andado um tanto distante disso tudo. Já conheço esses caminhos, essas fases que passo, e tenho aprendido a respeitá-las mais. Não tenho mais me cobrado tanto e busco exercer a minha Espiritualidade no meu dia-a-dia mesmo. Minha mãe já não me manda mais rezar à noite; na verdade, hoje, até a idéia do que seja rezar mudou na minha cabeça - às vezes ouvir uma música que me faz bem ou ler uma poesia por si só já elevam o meu espírito e me põem em contato com o mais sutil. Estou afastado da Espiritualidade no sentido de que me anda faltando mais sistematicidade e disciplina nas minhas meditações, por exemplo. E, apesar de estar ciente e acreditar cegamente que a Espiritualidade nunca se afasta de mim, a verdade é que este meu afastamento torna os meus canais menos abertos, e por isso tenho me 'comunicado' menos com a minha Essência. Isso significa que, apesar de presente, a Espiritualidade tem tido menos acesso a mim. Escrever sobre isso aqui, dividir com vocês esse momento, é como estabelecer um compromisso. Já ouvi alguém dizer que o primeiro passo para resolver uma questão é admitir a sua existência - "aquilo a que você resiste, persiste" (Conversando com Deus). Pois então, amigos: admito na frente de todos vocês, que preciso me voltar mais para dentro, silenciar-me mais. E, diante dos fatos, nada melhor do que um dia desses, de acontecimentos tão graves e ponderosos, para parar diante da vida e apenas contemplar. (Hoje é um daqueles dias em que o mundo pede que o silêncio se faça). Namasté.

quinta-feira, 4 de novembro de 2004

O que é cada coisa aqui (ou de como se tenta mensurar uma nuvem)



O que é o Diário Evolutivo

Este é um Blog em transmutação. Nas páginas deste diário estão os passos de alguém que não pára no tempo. Eu não sou o que escrevi ontem, aquela idéia já foi transposta, ela nega a minha eternidade, aquilo foi um sopro no tempo, uma captação de um instante que passou. Nego-me a aceitar a verdade que tentam me impor: a de que devo responder pelo que um dia fiz, pelo que um dia disse, pelo que um dia eu fui. A minha responsabilidade é com o presente, essa matéria quente e úmida, palpável, emergente nos instantes que eu vivo. Não me venham cobrar posições, diálogos, esperanças. Não tenho memória. Reduzo-me a esta linha que te escrevo. Sou fugidio e arisco. Um cavalo selvagem sem rédeas, uma água-viva à deriva, um plâncton em mar aberto. Sou feito em pedaços, e dessa separação aparente teço os meus segredos. Sou uma aranha que espera o próximo espanador. Não tente costurar-me como quem faz uma colcha de retalhos. O resultado será inútil. Sou inútil na medida mesmo em que você tenta possuir-me por inteiro. Esses escritos evoluem junto comigo e por isso nada que eles dizem pode ser tomado como verdade absoluta, eles só existem no espaço-tempo criado por você. O diário que escrevo é relativo, absurdo, inconstante, impalpável, evolutivo.

Quem é Leo

Não sou o que você pensa que eu sou, essa é a primeira coisa que devo te avisar sobre mim. Eu sou o que eu penso que sou. Muitas vezes penso uma coisa e sou outra, mas isso por si só já expressa algo de mim - quem não comete desses enganos? Realizo-me no aqui e agora, no presente, e dele retiro forças. É querer demais de mim, geminiano e inconstante que sou, me ver preso numa definição em linhas virtuais. Não acredito em definições. Acredito em estatutos passageiros, relativos. Acredito no que estou sendo agora e não no que eu sou e muito menos no que você quer que eu seja. Diante disso, resta a você e a mim a idealização. Idealize-me, pois é isso que faço comigo mesmo. Junte tudo que conhece do mundo, tudo mesmo, sem piedades, junte a eles uma foto minha, o melhor e pior do que eu escrevo; se você conversa comigo, acrescente meu tom de voz, minhas palavras, ajunte, a depender do grau de idealização que planeja obter no resultado, uma pitada de preconceitos, gratidão, respeito, otimismo e ilusões, cubra de pensamentos infantis (serve o pensamento de qualquer criança), acrescente pétalas da minha flor favorita (tulipa), regue por três dias - use água da chuva, eu adoro a chuva - e observe pacientemente o que se forma. Depois me diga. O resultado é o que eu serei pra você: apenas uma variável, pois sua receita pra me conhecer é feita de instabilidades apenas. Mas não te engano: eu sou uma variável. De constante em mim, só a crença no Amor e na Vida.

Urnas americanas

... e Bush ganhou. Ganhou junto com ele a arrogância, e a democracia, e a vontade de um povo. Só nos resta agora respeitar essa vontade, aceitar e torcer para que o Grande Bush seja iluminado, e pense muitas vezes antes de fazer suas sandices. Hora de esquecer o passado em prol de um pensamento mais harmonioso. Quem acredita nas energias e no poder do pensamento, sabe que o papel de cada um de nós agora é o da ACEITAÇÃO. O que foi feito, foi feito. Vamos torcer pra tudo dar certo de agora em diante.

De volta às cem coisas


Não, não desisti dos meus sonhos. Parei no número 30, não foi? Pois é, lá vão mais cinco:

31. Ver surgir uma vacina possante para a AIDS e o câncer.
32. Ver os EUA se tornarem menos arrogantes.
33. Ter a oportunidade de rever episódios memoráveis da TV Pirata.
34. Entender o conflito no Oriente Médio.
35. Andar por um campo de tulipas coloridas na Holanda.

quarta-feira, 3 de novembro de 2004

Tacadas



Hoje tive um dia de pai. É que resolvi fazer um passeio a dois com meu sobrinho Ângelo (5 anos, na foto). Fomos ao cinema, depois jogar golfe no Aeroclube (e eu lá sabia que jogava-se golfe por aquelas bandas?) e depois inevitavelmente McDonald's (juro que tentei dissuadi-lo, principalmente depois de ter assistido Super Size Me, mas sem sucesso; ele queria a todo custo o bendito cachorrinho do McLanche Feliz). Bem, o passeio foi divertido, mas valeu mesmo pela reflexão que lhes conto agora: logo na saída de casa, meu amigo Vinis me alertou que eu seria olhado de forma diferente nos locais por estar acompanhado por uma criança. E fui mesmo. Para todo mundo eu era o pai dele, para todo mundo eu estava ali representando o papel que todos esperam que eu desempenhe. Eu, um homem de trinta anos. Não vou mentir que gosto de sentir-me legitimado (aliás quem não gosta?), mas a sensação é estranha, devo admitir também. As pessoas esperam coisas de você. Essa legitimização te põe numa 'zona de conforto' onde não há confrontações ou expectativas frustradas, simplesmente porque você segue o padrão. Isso de alguma forma agrada e desagrada, porque quando o oposto está em questão, o que ocorre, na maioria das vezes, são atos de hostilidade por você não estar seguindo esses padrões ditos normais.

Pois bem, estávamos nós já no último dos 16 benditos buracos de golfe onde Ângelo deveria acertar a bendita bola e ficamos sabendo através do instrutor que, acertando aquela última, teríamos direito a um bônus extra.

- Por que você não pede ao seu pai para jogar essa? - disparou o rapaz.

Aquilo soou tão bem aos meus ouvidos, que a vontade era mesmo de não falar nada e deixar que ele achasse que eu era de fato o que ele e todos esperavam e achavam que eu era, o pai de Ângelo.

- Ele não é meu pai não, é meu Dindo. - disse o menino, com sinceridade e orgulho, pondo-me imediatamente no meu lugar.

Não posso negar que estremeci ao ser chamado de pai. Não pela legitimação de que falo acima, mas pelo prazer mesmo gerado pelo som destas três letrinhas juntas. Bem, os nomes meus filhos já têm (vide a lista das 100 coisas, número 22). Alguma mamãe aí se candidata?
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Quase esqueço: antes de sair com me sobrinho, eu já estava sensibilizado com a leitura de Grávido, que me deixou pensando muito nas questões paternas.